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O poder da Câmara

editorial
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Em ato solene, à frente da sua residência oficial em Brasília, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, finalmente anunciou o nome de sua preferência para presidir a instituição a partir do ano que vem. O indicado é o deputado Hugo Motta (Republicanos), que vem de uma família com histórico político na Paraíba é e visto como um político com trânsito em todos os partidos. Antes da proclamação, já conversou com o presidente Lula e com o ex-presidente Jair Bolsonaro. De ambos ouviu boas notícias.
Mota sabe da importância do cargo, mas precisa, a partir de agora, correr atrás dos votos. As regras da Casa estabelecem que, para ser eleito em 1º turno, um candidato precisa ter maioria absoluta dos votos (metade mais um), desde que 257 deputados tenham votado. Se isso não ocorrer, haverá um 2º turno entre os dois mais votados, e o eleito será o que reunir mais votos.
Não é, pois, uma tarefa fácil, sobretudo quando não há unanimidade. Pelo menos outros dois candidatos têm a mesma pretensão, mesmo sabendo da força de Arthur Lira, que pretende se manter no topo da cadeia de poder após encerrar o seu mandato na presidência. O dirigente da Câmara, além de tudo, é o terceiro na linha de sucessão, estando logo atrás do vice-presidente da República.
Mas, enquanto a sucessão é uma expectativa de poder, o comando da Câmara é um dado real. Além de dirigir a instituição, tem o poder de agenda e, sobretudo, de encaminhamento de emendas, o que faz do titular uma das mais poderosas figuras da República. Lira usou muito bem essas prerrogativas.
A Presidência da República usa o surrado discurso de não interferência em outro poder, mas, desde a redemocratização, o Palácio do Planalto tem especial atenção para o ocupante do cargo, que pode ser um importante aliado ou um adversário de grande poder de decisão. A ex-presidente da República, Dilma Rousseff, teve no presidente da Câmara, Eduardo Cunha, um de seus algozes, a despeito de tê-lo apoiado quando disputou o cargo.
Na sua volta para o terceiro mandato, Lula mantém uma relação de altos e baixos com Lira, porque sabe da importância de ter um presidente aliado. Lira, conhecedor dos meandros do poder, soube usar do posto para alavancar projetos que lhe eram afeitos. Na gestão Bolsonaro fez o mesmo jogo e teve nas emendas parlamentares e no orçamento as suas principais vitórias. Tais verbas foram essenciais na reeleição de centenas de prefeitos pelo país afora.
O Governo, no entanto, sabe que não pode interferir abertamente nas negociações ou ter um candidato in pectore sob o risco de problemas. No seu primeiro mandato, o presidente Lula sentiu de perto os danos da ingerência quando o candidato de sua preferência à presidência, Luiz Eduardo Greenhalgh, do PT, foi para a sessão do dia 14 de fevereiro de 2005. Sua vitória era pule de dez. No entanto, o deputado Severino Cavalcanti, filiado ao PP (Partido Progressista), ganhou força entre parlamentares de menor expressão e membros do chamado “baixo clero” e venceu a eleição. Lula, certamente, aprendeu a lição e deve apostar no cavalo vencedor. Mota é o favorito, mas, no silêncio do voto secreto, como lembrava Tancredo Neves, é grande a tentação pela traição.

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