O modelo de freios e contrapesos, desenvolvido por Montesquieu, é uma conquista da democracia, pois permite a independência dos poderes e, ao mesmo tempo, lhes confere o poder de fiscalização permanente para evitar abusos de qualquer lado. Nem sempre é assim, é fato: há momentos em que o Executivo, por ser o responsável pela gestão, vai além dos limites, ou o Legislativo, a quem cabe fazer leis e fiscalizar, considera que tudo deve ser feito à base do toma lá, dá cá. Recentemente, o Brasil também inaugurou a assertividade do Judiciário, que passou a exercer funções típicas dos demais poderes, dando aos juízes – e por extensão ao Ministério Público – um poder que foi além do necessário.
A despeito de tais distorções, ainda é a melhor alternativa, devendo, é fato, passar por discussões permanentes, como ora acontece diante do enfrentamento entre os poderes, muitas vezes desnecessário. Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, subiram o tom num embate que até hoje não teve justificativa, uma vez que ambos têm as mesmas posições perante a importância da reforma da Previdência.
O presidente destacava que não iria ceder à velha política, pela qual tudo funciona à base do balcão, mas Maia não entrou nessa seara. O impasse se deu mais pela forma do que pelo fato. O Governo não quer negociar, embora seja necessário em qualquer democracia, por considerar que os partidos agem voltados para o próprio umbigo, ignorando um projeto de país. Pode até ser, pois o uso do cachimbo faz a boca torta, e as lideranças têm agido assim desde o estabelecimento da Nova República. Mas o fato é que não se chegou, sequer, a verificar o que os partidos estão querendo.
A própria base do presidente reclama não ser ouvida em nada, o que já é um problema, pois a questão dos cargos não foi colocada à mesa. Trata-se, nesse caso, de um simples gesto de boa vontade com os parlamentares que apoiam o Governo.
Na última terça-feira, um novo impasse foi criado com a relutância do ministro da Economia, Paulo Guedes, em comparecer à Comissão de Constituição e Justiça para falar sobre seu projeto, por considerar que seria massacrado pela oposição. Ora, deveria ter se articulado para garantir uma maioria, o que, aliás, deve ocorrer na semana que vem.
Fugir ao embate num momento crítico como esse é o pior dos mundos, pois sem a reforma da Previdência tudo tende a se agravar. Daí conversar com o Congresso é uma necessidade, até mesmo para convencer os adversários de que não há outra alternativa.