Consideradas a última instância em processos de investigação, as comissões parlamentares de inquérito começaram a cair no descrédito quando seus resultados passaram por uma fase errante, cujo objetivo era engavetar fatos nitidamente ilícitos, fruto, principalmente, do corporativismo que impedia sua chegada a bom termo. Uma das últimas foi a CPI do Cachoeira, que avaliou as relações pouco republicanas entre o bicheiro e parlamentares, tendo, porém, um fim melancólico, quando as investigações se aproximaram de setores importantes. Foi para o arquivo por ação de deputados e senadores, escudeiros desse jogo de interesses.
No caso da Câmara Municipal, importantes comissões tiveram resultados positivos, e agora chegou a vez das brigas de gangues. Elas motivaram a vereadora e delegada Sheila Oliveira a pedir a instalação de uma CPI, com respaldo da expressiva maioria da Câmara, tendo como exceção, paradoxalmente, o representante da Comissão de Segurança, o petista Wanderson Castelar. Ele argumenta não ver sentido nesse tipo de ação e apresentou sua preocupação com a segurança dos colegas, pois iriam agir numa área de extremo perigo. O argumento tem sentido, mas tudo vai depender de como a comissão vai atuar. O viés investigativo cabe às instâncias policiais – das quais Sheila faz parte -, mas há outras frentes que precisam entrar em pauta sem, necessariamente, levar os vereadores a contato direto com as gangues. A política pública de segurança não passa apenas pela repressão, o que dá margem para a CPI, por exemplo, avaliar a implementação de políticas públicas que são necessárias para amenizar ambientes de forte fragilidade social.
União, Estado e Município têm obrigações próprias que precisam ser implantadas, a fim de promover, sobretudo, a ascensão social. Crianças que crescem em ambientes instáveis são vítimas de um modelo que se reverbera em personagens que se sentem apartados da própria sociedade, criando uma cidade partida. As gangues têm sua genesis nesses locais, pois acabam sendo a forma encontrada para a criação de uma identidade própria, capaz de unir o grupo “contra os outros” e marcar posição ante a iminência de ação de outras galeras na conquista do território.