A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e autoridades da segurança pública do Rio de Janeiro fecham a semana em um jogo de empurra para definir a responsabilidade pelas cenas de violências registradas no Maracanã, na última terça-feira, quando as seleções do Brasil e da Argentina se enfrentaram pelas eliminatórias da Copa do Mundo de 2026. As imagens que percorreram o mundo são vergonhosas, mostrando crianças e mulheres em meio a um enfrentamento de torcedores que estavam, por mera irresponsabilidade, no mesmo espaço, a despeito da histórica rivalidade entre as duas torcidas.
A CBF diz que a responsabilidade é da Polícia Militar, por ter adotado um tom belicoso na resolução do conflito, enquanto os militares apontam a venda de ingressos para um território misto que só funcionaria à contento numa peça de ficção. De fato, foi nessa área que o clima pesou e os participantes foram para o confronto.
O conflito nas arquibancadas chegou a migrar para o gramado. Os vinte primeiros minutos da partida refletiram a tensão dos torcedores, com jogadas violentes atípicas até mesmo para um jogo entre duas seleções que dividem o protagonismo nas américas.
Desde a Copa do Mundo de 2014, sediada pelo Brasil, os estádios mudaram de perfil. Viraram Arenas multiuso, mas a principal mudança foi no perfil dos torcedores. Os segmentos mais simples, que ficavam, principalmente na geral, foram afastados dos estádios por conta do preço dos ingressos. A um simples movimentar das câmeras é possível verificar a ausência do “andar de baixo”, que agora, sem acesso, se espalha pelos bairros à frente dos aparelhos de televisão.
No entanto, um dado continuou relevante: o medo nas arquibancadas. A violência explicitada no Brasil e Argentina é cópia de outros eventos em decorrência da exacerbação dos ânimos. É fato que os estádios são mais seguros – daí a surpresa pelo conflito -, mas é possível ver no seu entorno focos de violência que vira e mexe terminam em enfrentamentos com resultados graves, até mesmo com mortes. Este ano foram registrados vários episódios, entre eles de uma torcedora atingida por uma garrafa atirada por um torcedor, após uma partida entre Palmeiras e Flamengo. Ela morreu momentos depois.
Fora dos estádios a violência continua sendo um dado real produzida por personagens que não distinguem adversário de inimigo e levam para as ruas ou para os estádios todas a sua cota de violência. O que se viu no Maracanã é parte desse processo.
O grave desse enredo, porém, é que no dia 4 de novembro, na decisão da Copa Libertadores da América, entre Fluminense e Boca Júnior, brasileiros e argentinos já haviam protagonizado um combate pelas ruas e praia de Copacabana. Tal fato deveria ter servido de alerta para o jogo das seleções. Como não houve aperfeiçoamentos, o que aconteceu não foi surpresa. Foi, sim, um conflito anunciado.