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O “Grande Irmão”

editorial
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Os serviços de inteligência são estratégicos para dar aos governos o suporte necessário para a tomada de decisão, mas é fundamental que este processo seja executado dentro de regras claras fundamentadas em princípios éticos e democráticos, sob o risco de se tornarem, ao contrário do propósito inicial, uma ferramenta de controle. Há necessárias implicações jurídicas, para que os limites não sejam superados, pois, quando isso ocorre, todos estão sujeitos a passar ao papel de espionado como num cenário orwelliano do “Grande Irmão”.

Por esses e outros aspectos, é fundamental, de fato, uma ampla investigação sobre a ação de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) que cruzaram a linha e fizeram em pelo menos 1.800 vezes o uso ilegal das ferramentas de inteligência, monitorando políticos, jornalistas e adversários do Governo Bolsonaro.

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Como revelou a jornalista Bela Megale, de “O Globo”, a Polícia Federal constatou que os agentes que operaram o sistema aproveitaram da vulnerabilidade criada pela empresa israelense Cognyte, desenvolvedora do FirstMile, na rede de telefonia, para rastrear alvos irregularmente, ao invés de denunciá-la.

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Como nos filmes de ficção, a Agência se deu ao direito de vigiar sem dar qualquer satisfação aos demais organismos de Estado quando a lei, ao contrário disso, estabelece que é preciso uma ordem judicial ou acompanhamento do Ministério Público para invadir o espaço privado. Como bem destacou a Transparência Internacional e lideranças como o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco, trata-se de algo de extrema gravidade.

A despeito das normas estabelecidas pela Lei de Proteção de Dados, estes são usados indiscriminadamente em vários espaços bastando acompanhar a rotina da população, diariamente surpreendida por ligações apresentando algum tipo de vantagem e demonstrando ter posse dos dados pessoais. No entanto, os agentes da Abin foram além disso, pois invadiram a privacidade de personagens que, de alguma forma, causavam incômodo nas instâncias de poder, monitorando seus celulares e acompanhando suas rotinas.

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No andar das investigações foram constatadas mazelas de todos os níveis: a empresa Cognyte tinha acesso aos dados de qualquer pessoa monitorada pelo FirstMile, o que, por si só, já é extremamente grave. Os desenvolvedores, ainda de acordo com o Globo, sabiam dos riscos da ferramenta. No contrato com a Agência Brasileira está explicito que ela não poderia espionar cidadãos israelenses e nem americanos.

Cinco servidores já foram identificados pela Polícia Federal e afastados de seus postos, mas a investigação não pode ficar restritas ao pessoal de campo. O fio da meada deve ser puxado, a fim de se saber a extensão do dano e de onde surgiram as ordens para invadir o espaço privado sem uma autorização judicial. O programa foi adquirido sob o argumento inicial de combater o crime organizado – o que não aconteceu de fato – tendo-se optado pelo uso antidemocrático e afastado da necessária legalidade.

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