O novo entrevero entre o presidente da Câmara Federal, deputado Arthur Lira, e o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, é a prova material do jogo de interesses que perpassa as relações de poder. Na quinta-feira, ao ser questionado sobre o resultado da votação que manteve a prisão do deputado Chiquinho Brazão – suspeito de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes -, o parlamentar não se esquivou e apontou o dedo para o ministro, a quem classificou de desafeto e incompetente.
No dia seguinte, o presidente Lula foi pelo caminho inverso ao manifestar apoio ao seu ministro. “O Padilha vai bater recorde, é o ministro que está durando muito tempo no cargo e vai continuar pela competência dele”. Em vez de bombeiro, o presidente colocou mais lenha na fogueira sabedor das dificuldades recentes do deputado que tenta fazer o sucessor, mas vê a fila de pretendente aumentar a cada dia.
O jogo político não é uma ciência exata, no qual dois mais dois são quatro. Os políticos costumam ter um vocabulário próprio, pelo qual dizem exatamente o contrário do que pensam sempre voltados para o ato seguinte. Lira e Padilha vêm defendendo agendas distintas não por questões pessoais, como insinua o parlamentar, mas pelos bastidores envolvendo os interesses do Centrão. Titular das relações institucionais, Padilha tem contato direto com as lideranças, mas nem sempre pode dizer sim aos interesses de seus interlocutores.
A questão é que Lira não é um político qualquer. Ele preside a Câmara e, por enquanto, mantém o controle com mão de ferro estando disposto a fazer o sucessor. Para tanto, sobe a conta com o Planalto, a fim de se cacifar com os pares, o que não é tarefa fácil, sobretudo quando do outro lado está, não Padilha, mas Lula, que também gosta de articulação.
O grave desse enredo é que esse jogo de força não produz resultados para a população. Ao contrário, ele atrasa pautas importantes que deveriam ter prioridade nos debates da Câmara Federal. Lira se irritou com a manutenção da prisão de Brazão não porque gostasse dele, mas por ter o interesse de seus eleitores do Centrão e da direta contrariados. São eleitores importantes para fazer o sucessor.
Seu candidato preferido, deputado Elmar Nascimento, liderou com ele a movimentação pela soltura de Brazão como plataforma de campanha. Ambos entendem que a Constituição veda a prisão de um parlamentar sem flagrante, o que não entendido da mesma forma pelo Supremo Tribunal Federal, outra ponta de atrito do presidente da Câmara que frequentemente está na ordem do dia.
Haverá desdobramentos, pois o deputado não é de levar desaforo para casa, sobretudo quando percebe que a derrota mostrou uma fragilidade que até então não tinha sido registrada em seu mandato. Por isso, é hora dos “bombeiros”, já que, a despeito de ter vencido no primeiro round, o governo sabe que há muito mais em jogo, e Lira é importante nesse processo.