Diz-se com uma certa frequência no mundo político que a imunidade não é um instrumento para cometer ilícitos, e sim uma proteção por conta das responsabilidades do cargo. Sem ela, qualquer instância pode acionar a Justiça, quando muitas decisões, como lembrou o ex-presidente Fernando Henrique, ao depor na defesa de Paulo Okamoto, assessor do ex-presidente Lula, não chegam a ser discutidas com a liderança. “Um presidente não sabe de tudo”, observou.
Sob esse aspecto há sentido, mas é preciso levar em conta que a isonomia estabelece que todos são iguais perante a lei, o que, aliás, vale mais para o discurso do que para a prática, já que quem tem meios costuma levar vantagem em ações judiciais. A antiga lei de imunidade decidia que os políticos com mandato só podiam ser processados se houvesse autorização da Casa. Essa prerrogativa ainda vale em algumas situações, como a de governadores que estão sob o olhar da Justiça, mas que argumentam que a ação não pode prosperar sem autorização das assembleias. Em Minas, o governador Fernando Pimentel vive tal experiência com uma ação correndo no Superior Tribunal de Justiça. Ele usou tal argumento em sua defesa. A interpretação está nas mãos do Supremo Tribunal Federal.
O debate sobre a imunidade é recorrente, sobretudo após a nomeação do ex-presidente Lula para o ministério da então presidente Dilma, glosada pela Justiça sob o argumento de a nomeação ter sido única e exclusivamente para dar-lhe o foro especial, perdido após deixar a Presidência. Esta semana, o ministro Celso Mello, decano do STF, acolheu recurso do Governo e garantiu a posse do ministro Moreira Franco na pasta de Governo, a despeito da semelhança com o caso Lula. O ministro disse que indicações não garantem imunidade, acentuando que não há paralisação de ações. Como Lula recorreu ao próprio STF, é melhor conferir o voto de Mello em plenário.
Moreira Franco, como alguns outros membros do primeiro escalão – e até mesmo o presidente Michel Temer -, foi citado nas delações premiadas, embora não se saiba plenamente em que circunstância. Como há possibilidade de se quebrar o sigilo das informações prestadas pelos executivos das construtoras, haverá margem para ver até que ponto vai a prerrogativa de estar imune.