A disputa por maiorias faz parte do processo político, mas o que se vê na Câmara dos Deputados é uma queda de braço atípica. Duas semanas depois de sofrer um revês para o seu poder de articulação, o deputado Arthur Lira (PP-AL) conseguiu formar o maior bloco partidário da Casa. Chama a atenção a presença de partidos de esquerda, como o PSDB e o PDT no pacote de 173 parlamentares e com a expectativa de filiar mais dois.
Lira, que está no segundo mandato como presidente da Câmara, viu seu poder ameaçado quando o Governo, em vez de capitalizar apoios, criou uma fenda no Centrão, separando a tríade PP, PL e Republicanos, que foi considerado o núcleo duro do primeiro mandato do parlamentar alagoano.
As consequências desse arranjo são imprevisíveis, pois não se sabe, sequer, como ele será mobilizado com tanta diversidade ideológica. O PDT, por exemplo, está no grupo, mas também é base do Governo Lula, tendo indicado, inclusive, seu presidente, Carlos Lupi, para um dos ministérios da atual gestão. Ademais, que tipo de causa será defendida? Os tucanos também são estranhos no ninho, embora o partido passe por uma crise de identidade tendo como primeiro desafio superar suas divergências internas.
São muitas as perguntas e poucas as respostas, pois ainda estão em jogo as demais representações. O PL de Valdemar Costa Neto deve ter uma atuação autônoma de oposição sistemática, com projetos focados nas eleições de 2024, mas também já projetando cenários para 2026. Uma das condicionantes, porém, deve ter um desfecho ainda neste primeiro semestre: o Ministério Público Eleitoral se manifestou a favor do pedido de inelegibilidade, por oito anos, do ex-presidente Jair Bolsonaro, por ver indícios de abuso de poder político no encontro com embaixadores, no ano passado, quando fez duras críticas às urnas.
Com Bolsonaro elegível, o PL tem uma estratégia. Se ficar fora das eleições o jogo muda, já que o partido terá que forjar uma candidatura de peso para substituir o ex-presidente. Com esse consumo de energia, terá, ainda, que negociar com o bloco de Lira, a nova força da Casa, que deverá ter uma postura pendular, agindo de acordo com interesses imediatos e outros de longo prazo.
Não há surpresa nessas articulações e nem qualquer recuo democrático. É do jogo e o que o presidente da Câmara quer é manter o seu poder sobre a pauta da Câmara Federal e negociar com o Governo em condições de igualdade. Num presidencialismo de coalizão, há uma mútua dependência, mas o Planalto depende mais da Câmara do que esta do Executivo.