Tornou-se rotina do poder avaliar os primeiros cem dias de mandato, como forma de aferir as decisões iniciais de uma gestão inaugurada no início do ano. Nesta segunda-feira, o presidente Lula, ao lado de sua equipe, anunciou as ações do Governo e destacou os projetos desenvolvidos nos três primeiros meses. Os veículos de comunicação, por seu turno, deram como missão aos seus analistas avaliar o que ocorreu. Pelas contas iniciais, o Governo cumpriu 1/3 das promessas de campanha, a maioria delas na instância social.
Fazer tais considerações exige, no entanto, que se leve em conta também os cenários. Uma semana após a posse, Brasília foi atacada por golpistas que invadiram as sedes dos três poderes, numa ação sem precedentes na história do país e que ainda terá desdobramentos com a punição dos culpados. Foi, no entanto, um alerta para a gestão em curso de que não haverá o céu de brigadeiro dos dois primeiros mandatos, quando Lula governou sem uma oposição consistente.
Isto, porém, é do jogo, uma vez que o contraditório é uma das partes importantes da democracia. A questão em pauta é saber como Governo vai lidar com tais antagonistas que, certamente, farão de tudo para barrar metas de campanha. Ainda neste primeiro semestre devem entrar em pauta duas matérias de extrema relevância: o teto de gastos e a reforma tributária. O Planalto ainda não tem maioria no Congresso para sua aprovação, o que vai exigir articulação para conseguir tais votos.
A questão central é como será obtida essa maioria. O presidente tem bom diálogo na instância política e gosta de tomar a frente das conversações, mas o profissionalismo de algumas legendas aponta para demandas que vão além de um simples papo. Como o presidencialismo de coalizão ainda é um dado real, serão necessárias conversas em torno de cargos ou emendas para se conseguir a maioria. Há até um grupo dissidente do Centrão que pode garantir os votos, mas ainda não apresentou a sua conta.
Os cem dias também foram marcados por uma queda de braço entre o presidente da República e o presidente do Banco Central. Nos dois primeiros mandatos, Lula tinha no vice-presidente José Alencar um porta-voz de sua indignação. Dia sim, dia não, o empresário detonava as taxas do BC. Agora é o próprio presidente quem sobe a temperatura num projeto que mesmo eivado de fundadas razões, não ajuda em nada ante a autonomia do Copom.
Lula também derrapou nas palavras, mas isso é o de menos quando a questão econômica continua sendo o Norte a ser alcançado.
Nos estados também há debate em torno dos cem primeiros dias, uma vez eu os governadores tomaram posse no primeiro dia do ano. O mineiro Romeu Zema, agora no segundo mandato, tem uma agenda pela frente que vai depender do respaldo da Assembleia. A privatização de ativos como a Cemig, Copasa e Codemig continua na pauta de prioridades mas, de novo, vai depender de respaldo da Assembleia.
Com as lições tiradas do primeiro mandato, o governador tem mudado o discurso com os deputados, mas ainda não conseguiu os votos necessários, sobretudo para o Plano de Recuperação Fiscal, outro gargalo herdado da primeira rodada de gestão e ainda emperrado na burocracia da Assembleia. Tudo indica, porém – até por questão estratégica -, que os tempos serão outros.