No mesmo dia em que o Brasil era eliminado da Copa do Mundo, um grupo de deputados ingressou com um pedido de habeas corpus no plantão do Tribunal Regional Federal (TRF), em Porto Alegre, em favor do ex-presidente Lula, ora preso em Curitiba desde abril deste ano.
O desembargador Rogério Favreto, no domingo, mandou soltar o ex-presidente sob o argumento do surgimento de fatos novos, referindo-se à sua pré-candidatura à Presidência da República. Ante o protesto do juiz Sérgio Moro, o desembargador João Pedro Gebran, relator da Lava Jato, manteve a prisão. Horas depois, Favreto voltou à carga e, de novo, mandou soltar o paciente. O impasse só foi superado no final da noite, quando o presidente do TRF-4, Eduardo Thompson Flores, entrou no circuito e manteve a decisão do tribunal.
A guerra de decisões expôs a face oculta da ocupação de postos nas instâncias de poder. Favreto foi militante do Partido dos Trabalhadores por 20 anos, não é juiz de carreira e foi indicado pela ex-presidente Dilma Rousseff. Em princípio, nada de mais, pois todo cidadão tem direito à filiação partidária, e sua indicação atendeu plenamente ao que está previsto em lei. Mas sua sentença foi mais de militante do que de magistrado, pois o fato novo por ele acolhido está nos jornais desde sempre. O Partido dos Trabalhadores vai inscrever a candidatura de Lula no momento certo, se vai ser acolhida é outra coisa.
A decisão de Favreto, a despeito da perplexidade que causou dentro e fora do mundo jurídico, não é a primeira sob esse viés. As cortes superiores, a começar pelo Supremo Tribunal Federal, têm politizado suas decisões, ao mesmo tempo em que a política tem sido judicializada. Os embates permanentes entre os ministros do STF são emblemáticos e, por consequência, pedagógicos às avessas, isto é, têm incentivado às demais instâncias ir além dos autos, formando interpretações desconectadas dos fatos, mas suficientes para condenar ou absolver personagens de notória expressão.
Há cerca de duas semanas, o ministro Dias Toffoli, que vai presidir o Supremo a partir de setembro, libertou o ex-ministro José Dirceu, de quem já foi assessor. A decisão monocrática é uma entre outras tantas que têm marcado as ações na Corte superior. Seu colega Gilmar Mendes também tem usado a caneta para colocar na rua personagens claramente envolvidos em ações pouco republicanas, sob o argumento de inconsistência de provas ou excesso de prazos.
Por conta disso, o que ocorreu no TRF-4 não chega a surpreender, podendo se replicar por outras instâncias em razão do cenário político que marca as instituições. Há muito tempo, as decisões, especialmente das instâncias superiores, têm ido além dos autos.