Uma mulher, de 54 anos, morreu na última quarta-feira (31) enquanto estava internada na Santa Casa de Lima Duarte, cidade distante cerca de 60 quilômetros de Juiz de Fora. Conforme decisão judicial, a qual a Tribuna teve acesso, ela esteve internada desde o dia 11 de julho no local, e aguardava transferência para outro estabelecimento hospitalar que tivesse condições de averiguar o quadro neurológico apresentado.
Segundo relatou uma amiga da família à Tribuna, a Santa Casa não teria a infraestrutura necessária para realizar o diagnóstico da paciente. Com isso, seu tratamento teria ficado prejudicado. A mulher não resistiu e morreu sem que os familiares soubessem a causa.
A Comarca de Lima Duarte, no dia 24 de julho, publicou a decisão deferindo, em tutela de urgência, a transferência da paciente pelo Município de Lima Duarte e o Estado de Minas Gerais para uma Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) neurológica em unidade hospitalar competente para “investigação e suporte em terapia intensiva, no prazo de 24 horas, sob pena de bloqueio e sequestro das verbas públicas”. Mesmo assim, a paciente permaneceu mais uma semana internada na Santa Casa, até que não resistiu e faleceu.
Prefeitura aponta falta de leitos
Enquanto a Justiça informa que a paciente deu entrada no dia 11, um relatório da Secretaria de Saúde da Prefeitura de Lima Duarte, enviado à reportagem, informa que a paciente deu entrada na unidade hospitalar dia 14 de julho, ocasião em que foi recomendada a transferência para unidade de terapia intensiva. O documento é assinado pelo atual secretário de Saúde, Raphael Nepomuceno.
A nota diz que o Município de Lima Duarte não dispõe de leito para tratamento intensivo em seu território e conta como apoio da macrorregião de Juiz de Fora, através da Superintendência Regional de Saúde de Juiz de Fora, e outros municípios através de seus hospitais.
“Sabe-se que Municípios do interior vêm enfrentando sérios problemas quanto à disponibilização de leitos hospitalares, inclusive no contexto da judicialização da saúde, tendo em vista que a competência para gerenciar as vagas é do Estado de Minas Gerais. No caso relatado, a dificuldade da vaga é ainda maior, pois se trata de leito de tratamento intensivo em neurologia, tal especialidade possui alta demanda e pouca oferta de profissionais/cirurgiões, e em que pesem todos os esforços empregados, a demanda não foi atendida”, afirma a pasta.
A Prefeitura afirma que a primeira solicitação de transferência para um leito de CTI neurológico se deu aproximadamente uma hora após a internação da paciente, porém sem êxito devido a inexistência de leitos em unidades públicas. Neste contexto, a transferência deve ocorrer para um hospital da rede privada.
O Município afirmou que buscou leitos na rede privada, porém não teve retorno por parte dos hospitais. “Foram empregadas todas as tentativas de transferência, seja pela via ordinária, através da Superintendência Regional de Saúde de Juiz de Fora, e extraordinária, através da internação particular, ressaltando, em todas as ocasiões de contato com os reguladores, a urgência do estado clínico e a necessidade de transferência imediata da paciente, mas sem sucesso até a data da ocorrência do óbito.” Por fim, a Secretaria de Saúde manifestou pesar pelo falecimento da paciente.
Em nota, a SES-MG informou que ocorreram diversas tentativas de busca pelo leito adequado à necessidade clínica da paciente, constando registradas diversas tentativas de transferência por parte da Central Estadual de Regulação Assistencial (CRRA) de Juiz de Fora.
“No dia 31 de julho, às 5:48, conseguiram a reserva de vaga para a transferência da paciente para o Hospital Santa Isabel, no município de Ubá. Mas, o óbito foi registrado no mesmo dia às 12:38 e a reserva do leito foi cancelada por parte do hospital de origem da paciente.”
40 negativas de transferência
Conforme a Santa Casa de Lima Duarte, em nota, a solicitação de transferência da paciente em questão foi negada 40 vezes por outros hospitais, situação que não mudou nem mesmo após a decisão judicial, que deu prazo de 24 horas para a transferência.
“Vale ressaltar que, a paciente realizou exames de imagem (raio-x, ultrassonografia, e tomografia) e todos eles sem alteração. O hospital (Santa Casa de Misericórdia de Lima Duarte) utilizou de todos os recursos que dispõe e tomou todas as providências desde o início, dando todo apoio a paciente e seus familiares”, disse a nota.
A médica responsável pela internação também enviou parecer à Tribuna de Minas. Conforme a profissional, ela orientou os membros da família que procurassem a Defensoria Pública assim que a ordem judicial não foi cumprida e que o último contato com os familiares se deu no dia 29 de julho, dois dias antes da morte da paciente.
“Venho ressaltar que a Santa Casa De Lima Duarte, através de sua equipe, não só colocou com rapidez a paciente no sistema de transferência (Susfácil) e o alimentou diariamente com a evolução da paciente, como foi neste nosocômio que a família foi orientada a entrar com demanda judicial e procurar a Defensoria Pública dada tamanha preocupação da equipe com a paciente em conclusão. Sabendo-se como funciona o sistema de saúde, a transferência não ocorreu não por culpa da Santa Casa De Lima Duarte, mas pelos hospitais de referência – não necessariamente em Juiz De Fora, pois isso depende da rede de assistência do SUS – que negaram dia após dia a transferência da mesma.”