Ícone do site Tribuna de Minas

Em live com Sargento Mello, Roberto Jefferson defende “pau na Guarda”

manifestacao guarda municipal
Guardas se reuniram em frente à Câmara em resposta contra as falas de Jefferson veiculadas pelo perfil do vereador Sargento Mello Casal (Foto: Assessoria da Guarda Municipal/Divulgação)
PUBLICIDADE

As discussões políticas de Juiz de Fora foram pautadas por manifestações de repúdio a uma live realizada e publicada no Instagram do vereador Sargento Mello Casal (PTB). No vídeo gravado na última sexta-feira (26), o presidente nacional do PTB, o ex-deputado federal Roberto Jefferson (PTB), defendeu a desobediência civil e a violência contra guardas municipais que atuarem pelo cumprimento de decretos municipais que determinam restrições de atividades de comércio e serviços como medida de enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. Ao longo desta segunda-feira, foram observados protestos de integrantes da Guarda Municipal de Juiz de Fora e manifestações diversas de vereadores locais. Organizações de todos o país cobraram que as incitações a agressões feita por Jefferson fossem apuradas.

Logo no início da tarde, integrantes da Guarda Municipal fizeram ato em frente à Câmara Municipal. No protesto, os guardas municipais destacaram a revolta com as falas de Jefferson veiculadas pelo perfil do vereador Sargento Mello Casal. Também foi pontuado o repúdio da corporação às falas do presidente nacional do PTB, classificada como “criminosa”. Durante a ação em frente à Câmara Municipal, Mello chegou a descer e bateu boca com os presentes e, aos berros, classificou a manifestação como “uma vergonha” e “uma falta de respeito”.

PUBLICIDADE

‘Dar um pau’

Em sua conversa com o vereador Sargento Mello Casal, Roberto Jefferson defendeu a criação de milícias em Juiz de Fora para agredir os integrantes da Guarda Municipal. “Está precisando criar umas milícias em Juiz de Fora para dar um pau na Guarda Municipal. Um pau para quebrar.” O ex-deputado defendeu ainda a queima de veículos da Guarda e que se faça uma emboscada contra a corporação. “Dá pau neles de cacete. Bate no joelho, no cotovelo, no ombro. Bata para quebrar a articulação, e eles não vão voltar mais.”

PUBLICIDADE

Em outro trecho, Roberto Jefferson defendeu execuções públicas e que a insubordinação popular se volte contra as famílias de guardas municipais. Neste ponto, voltou a defender agressões, sob a alegação de que tais corporações agem com violência no cumprimento de decretos municipais de restrição de atividades. Ao voltar a defender emboscada contra os guardas, chegou a incitar o uso de armas de fogo. “Tem que deixar uma turma também armada”, disse, antes de completar. “O resto dá para enfrentar no cacete e na faca.”

A reportagem fez contato com a Presidência do PTB, solicitando um posicionamento do ex-deputado presidente da legenda, mas até o fechamento desta edição não obteve retorno.

PUBLICIDADE

Compartilhamento na rede social

Além de transmitidas em uma live no perfil do vereador Sargento Mello Casal no Instagram, as falas incitando a violência foram compartilhadas pelo parlamentar juiz-forano em sua conta, no modo IGTV, com a legenda “bobjeff e Mello”.

No sábado, Mello usou o Instagram para comentar a polêmica em torno da live realizada com Roberto Jefferson, alegando que as falas foram tiradas de contexto. “Fizeram um corte nestas imagens”, alegou, apontando possíveis vieses políticos nos questionamentos O vereador fez críticas, em especial, a nota emitida pelo Sindicato dos Servidores Públicos de Juiz de Fora (Sinserpu), também politizando a questão.

PUBLICIDADE

Vereador diz ter sido pego de surpresa e pede desculpa por não ter defendido categoria (retranca)
Por meio de sua assessoria, o vereador Sargento Mello Casal atribuiu ao ex-deputado Roberto Jefferson a responsabilidade de suas falas, em especial, aquelas que pregam o suo de violência contra guardas municipais. “Cada cidadão é responsável por suas afirmações. Na live realizada na última sexta-feira, nenhuma palavra foi proferida por mim que denegrisse a imagem da guarda municipal. Falávamos sobre as consequências de ações relacionadas ao Covid no Brasil quando o Presidente do PTB, Roberto Jefferson, fez suas declarações com relação à guarda.”

Ante à incitação à violência feita por Jefferson, Mello se disse surpreso, conforme nota encaminhada por sua assessoria. “Afirmei na live que ‘aqui em Juiz de Fora a Guarda e a PM eles estão tranquilos’. Peço desculpas por não ter feito uma defesa incisiva, ainda durante a live porque fui pego de surpresa com as declarações de Roberto Jefferson.

Minhas ações e conduta durante toda minha vida profissional na Polícia Militar e na vida pública enquanto vereador sempre foram da promoção da ordem e respeito às legislações, e em favor da valorização dos profissionais e entidades da segurança pública. E continuarei a fazê-lo.”

PUBLICIDADE

Questionamentos à manifestação

O vereador ainda comentou a manifestação realizada pela Guarda Municipal e questionou a legalidade do ato. “Toda manifestação é legítima, desde que cumpra a legislação vigente. O próprio Estatuto da Guarda Municipal não permite a utilização de fardamento, equipamentos e veículos para quaisquer atos que não o efetivo cumprimento do seu dever. Tão pouco esta instituição ser usada como instrumento político para atingir este vereador. Desta feita, os fatos serão encaminhados às autoridade competentes”, disse.

Manifestação diante dos ataques

À Tribuna, o comandante da Guarda Municipal, Leandro Lisboa, explicou que, em relação ao ocorrido na escadaria da Câmara Municipal, o que aconteceu era uma chamada pré-turno. Segundo ele, a ação ocorre ao fim de um turno e início de outro, ou seja, é o momento em que as equipes se reúnem, e um superior hierárquico passa instruções, configurando um procedimento habitual. A diferença é que foi realizá-la fora da sede, nas escadarias da câmara. “Não era uma manifestação política. Ninguém estava em nome de nenhum partido. Era uma manifestação da corporação, diante dos ataques sofridos”, ressaltou.

Sinserpu e Associação vão cobrar apuração do fato

A nota do Sinserpu foi divulgada no sábado, quando a entidade também expressou repúdio ao que classificou de “posições criminosas expressas em recente vídeo com um ‘diálogo’ entre o vereador Sargento Mello Casal e o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson”. “O vereador, ouve, rindo, Roberto Jefferson, depois de ofender a prefeita Margarida Salomão (PT) e instituições juiz-foranas, incitar a população a crimes de violência e morte. Falar, entre outras coisas, em ‘surrar guardas municipais’, ‘montar uma milícia para dar um pau nos guardas municipais’, ‘dar pauladas nos joelhos, cotovelos, no ombro, para quebrar’, além de orientar a população a ‘atear fogo nas viaturas’. Isso, além de divulgar pensamentos doentios, é crime”, diz. O sindicato diz que irá cobrar da Câmara que “aja com rigor e apure a conduta desse parlamentar.

PUBLICIDADE

No mesmo tom, a Associação dos Guardas Municipais de Juiz de Fora também repudiou as falas de Roberto Jefferson. “Os Guardas Municipais foram atacados por um discurso de ódio antidemocrático e criminoso, com claro incentivo à violência contra esses agentes da segurança pública, conclamando grupos armados para agredir e matar os profissionais e seus respectivos familiares. O silêncio do Vereador Mello Casal causou estranheza e perplexidade”, considerou a nota. A associação afirmou que tomará “as medidas judiciais cabíveis”. “Cobraremos um posicionamento oficial da Administração Municipal e da Câmara dos Vereadores, bem como comunicaremos tal fato ao Ministério Público de Minas Gerais”.

A Federação Nacional de Sindicatos de Guardas Municipais (Fenaguardas) também manifestou seu repúdio às falas de Roberto Jefferson na live com o vereador Sargento Mello Casal. “Ao sugerir e incitar agressões e a prática de tortura contra os Guardas Civis Municipais que estão fiscalizando as medidas de prevenção ao Covid-19 nos municípios, este cidadão desprezível, além de desconsiderar os seres humanos, trabalhadores da GCM, que ali estão arriscando suas vidas desempenhando suas funções, ainda pratica um desserviço para a sociedade brasileira em pleno ápice da pandemia da Covid-19, confundindo a população e a colocando contra os agentes públicos que estão fazendo cumprir a legislação vigente”, diz a Fenaguarda.

Assim como a associação dos Guardas Municipais de Juiz de Fora, a entidade nacional disse ainda que procurará todos os meios cabíveis, “inclusive junto ao Poder Judiciário, buscando a devida responsabilização do ex-deputado”. A Fenaguarda ainda mobilizou sua base contra tais manifestações que, aos olhos da federação, “visam atacar e colocar em risco a imagem e a integridade física dos mais de cem mil profissionais em todo país”.

Mesa da Câmara repudia o que chama de ‘práticas típicas de regimes totalitários’

A Mesa Diretora da Câmara Municipal também se manifestou sobre a situação envolvendo o vereador Sargento Mello Casal. A Casa repudiou as falas proferidas pelo presidente nacional do PTB. “Recebemos com perplexidade e indignação o estímulo à cultura do ódio, o fomento a práticas típicas de regimes totalitários e o ataque às instituições locais e ao funcionalismo público”, diz a nota emitida pelo Poder Legislativo. O texto destaca o trabalho realizado pela Guarda Municipal , que, aos olhos do Legislativo, “sempre atuou com brilhantismo dentro de suas prerrogativas legais”.

“Agora, durante o delicado período pandêmico, a GMJF permanece desenvolvendo uma importante função, ao lado dos fiscais de posturas, na linha de frente de ações de fiscalização do cumprimento das normas que visam a garantir a saúde de cidadãs e cidadãos. Ações essas fruto direto dos esforços não só do Executivo, mas também de cada cidadã e cidadão que se propõe a levantar a cada dia e seguir a jornada de batalhar pelo bem-estar coletivo neste momento de pandemia”, diz a nota.

A Câmara defende ainda seu posicionamento institucional em defesa dos servidores públicos. “Tanto os que atuam na linha de frente – exercendo suas atividades presencialmente em razão da imprescindibilidade destas – quanto aqueles que atualmente laboram remotamente merecem respeito. Contemporaneamente temos presenciado tentativas de vilanização do funcionalismo público, razão pela qual não podemos nos furtar de manifestarmo-nos na salvaguarda desta categoria que, atuando no atendimento das demandas populacionais, se caracteriza como o alicerce da construção de uma sociedade”, afirma o Legislativo.

Vereadores reagem às declarações durante sessão

A live também pautou a reunião ordinária da Câmara com a maioria dos vereadores tecendo críticas ao teor da conversa mantida entre o parlamentar juiz-forano e o presidente nacional do PTB. O primeiro a abordar o tema foi exatamente Mello, que, diante dos colegas de legislatura, disse não concordar com as afirmações de Jefferson.

Sobre as falas de teor violento de Roberto Jefferson, Mello disse que não pediria desculpas pelas falas dos outros. “A mim, cabe pedir desculpas por não ser incisivo na defesa deles (dos guardas municipais). Eu também fui pego de surpresa”, disse, ao justificar o fato de não ter feito um contraponto ao ex-deputado, quando Jefferson propôs, por exemplo, a criação de milícias em Juiz de Fora. “Realmente, eu acho que eu vacilei. Eu errei. Foi um momento de surpresa quando ele falou a palavra miliciano. Apesar de vereador, eu sou humano.”

Segunda a usar da palavra para tratar do tema, a vereadora Cida Oliveira (PT) considerou que a conversa entre Mello e Jefferson foi “um filme de horrores”. “Roberto Jefferson tem que responder por suas ações e eventuais atos de violência que ocorra por conta delas”, disse. A parlamentar comentou ainda que o ex-deputado difamou servidores e professores municipais e fez declarações homofóbicas. “Referiu-se a governantes como gays enrustidos”, pontuou. A parlamentar ainda afirmou que o vereador Sargento Mello Casal assistiu a tudo rindo e “sem manifestar contrariedade”.

Já a vereadora Tallia Sobral (PSOL) disse ter assistido a live na íntegra. “Não conseguia conceber a possibilidade de que aquelas coisas estavam sendo ditas”, destacando falas como a sugestão da criação de milícias, de agressões e da perseguição às famílias de guardas municipais. Tallia ainda ressaltou ataques feitos por Jefferson a servidores públicos no âmbito municipal e federal e mostrou preocupação com possíveis reflexos da incitação à violência.

A vereadora Laiz Perrut (PT) criticou ainda a postura do colega de legislatura, Sargento Mello, durante a live. “As falas mais graves foram ditas pelo ex-deputado conhecido por crimes de corrupção, Roberto Jefferson. No entanto, quando você não coloca sua posição, sendo um ente público, você está se coadunando com aquelas palavras. Em várias vezes, o vereador ri, concorda com a cabeça. Várias coisas muito graves, afirmou. A vereadora lembrou que o ex-deputado atacou a comunidade acadêmica da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Por meio de nota, a UFJF repudiou o conteúdo da live.

“Realizar manifestações caluniosas, agressivas ou imprecisas, não mantém qualquer relação com o exercício da liberdade de expressão. Esta é um elemento fundamental da democracia, serve à garantia da diversidade e do respeito à diferença. Mas também, em sua defesa, as instituições e os atores sociais não podem tolerar que triunfem aqueles que operam contra a própria democracia, propondo a violência ou o desrespeito à diversidade, inerente a toda sociedade complexa, porque isso seria a própria destruição da democracia”, diz a instituição.

A vereadora pontuou ainda que Roberto Jefferson também fez ataques pessoais à prefeita Margarida Salomão (PT). “Temos também a questão da pandemia que é uma deseducação, como a questão do uso de máscara e do uso do ‘kit Covid’.” A reportagem ainda questionou a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) sobre um posicionamento da Administração sobre as falas do ex-deputado durante a live com Mello, mas a atual Administração preferiu não comentar.

Ainda se manifestaram contrários ao conteúdo da nota os vereadores Antônio Aguiar (DEM), Nilton Militão (PSD), José Mário (Garotinho, PV), Marlon Siqueira (PP), Luiz Otávio Fernandes Coelho (Pardal, PSL), Katia Franco Protetora (PSC) e André Luiz (Republicanos). Presidente da Comissão de Ética e do Decoro Parlamentar, Bejani Júnior (Podemos) optou por não comentar a situação, alegando que irá estudar os fatos com os demais parlamentares que formam o colegiado.

Presidente da Câmara, Juraci Scheffer (PT) usou da palavra “como vereador e não como chefe do Poder Legislativo”. Juraci fez um discurso duro e não poupou críticas a Jefferson. “É uma fala eivada de vários crimes. Certamente será acionado na Justiça e responsabilizado.” Ele lembrou que o PTB, presidido nacionalmente pelo ex-deputado, integrou a Administração municipal nas últimas gestões com a presença de Ricardo Francisco, irmão de Roberto Jefferson, nos primeiros escalões do Município, com passagens pelos governos de Aberto Bejani, Custódio Mattos, Bruno Siqueira e Antônio Almas.

O histórico político de Roberto Jefferson é conturbado. Deputado por seis mandatos, sendo cassado em 2005, ele foi delator no esquema de corrupção conhecido como Mensalão e acabou condenado a sete anos e 14 dias de prisão.

Notas de repúdio

Na abertura da reunião ordinária da Câmara, foram lidas 22 correspondências de entidades que representam guardas municipais e civis e outras classes polícias e de agentes de segurança de todo o país. As entidades pedem à Câmara a apuração dos fatos relatados e a adoção de medidas cabíveis contra a conduta do vereador.

Em destaque, foi lida nota assinada por entidades sindicais locais, como o Sinserpu, o Sindicato dos Professores (Sinpro), o Sindicato dos Médicos, o Sindicato dos Odontólogos, o braço local do Sindicato Únicos dos Trabalhadores em Educação (Sind-UTE), da Associação dos Professores de Ensino Superior (Apes) e do Diretório Central dos Estudantes (DCE). Sobre a live, as organizações consideraram que o vídeo apresentou discurso homofóbico, difamatório e discriminatório.

Charlles e Júlio Delgado repudiam fala de ex-deputado

Os deputados federais Charlles Evangelista (PSL e Júlio Delgado (PSB) também se manifestaram por meio de nota encaminhada à reportagem e repudiaram a fala do ex-deputado Roberto Jefferson em relação à Guarda Municipal de Juiz de Fora. “Somos contra qualquer tipo de incitação ao ódio, crime e violência, apoiamos a atuação da Guarda Municipal dentro da lei e somos totalmente contra qualquer tipo de milícia”, disseram os parlamentares.

Sair da versão mobile