A nova política econômica do Governo federal promete enxugar as despesas da máquina pública, o que já provoca o temor de que haja redução nos repasses para as instituições federais de ensino. Na semana que vem, o reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Júlio Chebli, participa de um encontro de reitores para discutir de que maneira o momento econômico nacional pode impactar no cotidiano das universidades. O encontro será promovido pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) nos próximos dias 4 e 5, em Brasília. Com nova realidade, Chebli admite a possibilidade de uma reconfiguração do ordenamento administrativo, o que pode resultar em uma redução do processo de expansão física visto na UFJF nos últimos anos.
“A Andifes levou ao ministro (da Educação, Cid Gomes) um documento ressaltando a importância da manutenção dos investimentos nas universidades e dos compromissos anteriormente assumidos pelo Ministério (da Educação, MEC). Já temos conhecimento de que serão necessários alguns ajustes, mas esperamos manter em um patamar bastante aceitável os investimentos na pesquisa e graduação, assim como as obras que estão em andamento ou em fase inicial”, afirmou Chebli ontem, em entrevista à rádio CBN Juiz de Fora. “Se houver um cenário de maior arrocho, teremos que cortar onde der. Obviamente, não vamos mexer em pontos fundamentais, mas sempre há onde cortar. Isso pode frear um pouco a expansão.” No último dia 8, a edição de um decreto presidencial cortou R$ 1,9 bilhão das receitas disponíveis para os ministérios. O Ministério da Educação foi o mais afetado, com uma restrição extra de aproximadamente R$ 597,5 milhões.
Para Chebli, entretanto, a possibilidade de cortes não deve afetar o funcionamento administrativo da UFJF, mas pode comprometer a expansão física por qual passa a instituição desde a adesão ao Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni ), aprovada em 2007. “Tudo vai depender do compromisso do Governo. Em termos administrativos, o impacto é mínimo. Hoje, a maior dificuldade das universidades são os recursos necessários para manter os profissionais terceirizados e os investimentos em bolsas. Temos um contingente muito grande de terceirizados que não é o ideal. O ideal é que sejam realizados mais concursos para substituir esses terceirizados. Mas infelizmente há cargos que já estão extintos na carreira federal. Mas isso não acontece só na UFJF, mas em todas as universidades do país.”
Sem empenhos
O reitor destacou a necessidade de recursos para conclusão de obras em andamento na UFJF. “As obras do Hospital Universitário são fundamentais. Assim como a ampliação de unidades acadêmicas, como Serviço Social e Administração e Direito. O próprio Jardim Botânico é uma obra que pode trazer muita coisa para a cidade. O campus de Governador Valadares é um compromisso com a região. São obras fundamentais e compromissos assumidos pelo Governo e pelo MEC anteriormente. Então, a gente espera que isso seja mantido.”
De acordo com a assessoria da UFJF, para algumas das obras citadas pelo reitor ainda falta o empenho de boa parte dos recursos. São os casos das intervenções do Jardim Botânico, que teve valor citado de R$ 36 milhões – deste, R$ 18 milhões já foram pagos – e da construção do campus em Governador Valadares, licitada a R$ 141 milhões – deste, apenas R$ 40 milhões foram pagos. Os valores são referentes a novembro do ano passado e obtidos junto à Pró-reitoria de Planejamento, Orçamento e Gestão.
Em nota encaminhada à Tribuna, a assessoria do Ministério da Educação não confirmou se compromissos assumidos no mandato anterior serão mantidos. De acordo com o MEC, as medidas anunciadas por meio do Decreto nº 8.389, de 7 de janeiro de 2015 preservam as dotações orçamentárias do Ministério da Educação previstas no Anexo III da Lei 13.080/2015, que mantém investimento em pontos considerados fundamentais como os destinados à alimentação escolar e a manutenção do fundo para educação básica e valorização dos educadores, o Fundeb. O texto afirma ainda que o ministério está avaliando o impacto do referido decreto nas demais despesas de custeio.
Atrasos afetam bolsistas
Recentemente, alunos do Programa de Pós-Graduação da UFJF receberam com atraso o pagamento das bolsas, que são repassadas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão ligado ao MEC. Em dezembro, a Tribuna mostrou a situação vivida por bolsistas de monitoria dos cursos de mestrado e doutorado da UFJF, que não teriam recebido o auxílio no mês em questão. À época, a universidade esclareceu que a Capes é a responsável por efetuar o pagamento e que deveria ter repassado cerca de R$ 350 mil à instituição. Porém, a Pró-reitoria de Pós-Graduação decidiu pagar os estudantes com recursos próprios. Neste mês, outros estudantes tornaram a relatar problemas no pagamento de benefícios, que foram pagos com atraso.
Segundo o diretor de Políticas Institucionais da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), Leonardo Azevedo, o atraso pela Capes em janeiro foi uma situação global, presente em praticamente todas as universidade públicas do país, devido à não aprovação do orçamento do Governo federal. “O que mais nos preocupa é que a maioria dos pesquisadores tem nas bolsas sua principal fonte de subsistência, uma vez que a dedicação aos programas de mestrado e doutorado precisa ser exclusiva, e eles não podem acumular outras atividades com vínculo empregatício. Temos receio de que volte a atrasar”, destacou.
Cotistas
“A UFJF tem cerca de 50% de suas vagas destinadas, de alguma maneira, a cotistas. Boa parte destes estudantes depende de bolsas estudantis, que têm cunho mais social. O Governo nunca deu integralmente a verba necessária, a universidade sempre teve que tirar recursos de outro local para cobrir esses investimentos. Vamos trabalhar para buscar verba extra para manutenção dos benefícios”, afirma Júlio Chebli. De acordo com a assessoria da UFJF, em 2014, foram pagos R$ 16,2 milhões em bolsas de apoio estudantil sem distinção de cotas, distribuídas entre as modalidades moradia, manutenção e creche. “Foram atendidos 3.819 estudantes. Os recursos foram obtidos por meio de repasse direto do Governo federal e de captação da própria Administração Superior da UFJF.”
Professores temem queda na qualidade
Vice-presidente da Associação dos Professores de Ensino Superior de Juiz de Fora (Apes), Agostinho Beghelli teme que uma possível redução de recursos para as universidade federais impacte diretamente na qualidade do ensino promovido por essas instituições. Para ele, a excelência da educação já foi impactada negativamente pelo processo de expansão física patrocinado pelo Reuni, visível na UFJF. “De certa forma, já esperávamos que qualquer problema na economia traria reflexos para as obras em andamento nas universidades. Com o Reuni, as universidades viveram uma expansão muito grande, porém, sem planejamento. Essa obras não se resumem no dinheiro aplicado nas estruturas físicas. É preciso também investimentos contínuos em manutenção e no efetivo de professores e servidores, por exemplo. Isso aumenta todo o orçamento. A qualidade foi deixada de lado, e todo o investimento feito até aqui pode ser comprometido.”