Menos de 24 horas após ter recebido voz de prisão da Polícia Militar (PM) e ser conduzido à delegacia na madrugada de ontem, o vereador Wanderson Castelar (PT) disse, durante reunião ordinária no Palácio Barbosa Lima, ser vítima de perseguição e intimidação feita por um grupo de pessoas ligadas ao deputado estadual Noraldino Júnior (PSC). O imbróglio envolvendo os dois parlamentares começou na noite de segunda-feira, após sessão do Legislativo, quando Noraldino afirmou ter sido vítima de ameaça de morte feita pelo petista. Por outro lado, Castelar garante que também foi intimidado pelo deputado. Após o desentendimento, a direção da Casa acionou a PM, que deu voz de prisão ao vereador em seu gabinete. Depois de seis horas, Castelar foi levado à delegacia em um veículo oficial da Câmara. Ainda na madrugada, a juíza Roberta de Araújo Carvalho Maciel concedeu um habeas corpus deferindo um salvo conduto, garantindo ao parlamentar municipal o direito de se dirigir à delegacia por seus próprios meios.
Castelar se disse vítima de uma arbitrariedade – a qual considera orquestrada por Noraldino – , afirmando que teve sua imunidade parlamentar violada. “Apesar de considerar que a PM ignorou minha imunidade parlamentar, não posso culpar os policiais, pois o deputado Noraldino exerceu uma influência absurda sobre o comando da PM em Juiz de Fora e em Belo Horizonte.” Em seu discurso, Castelar afirmou que preferia ter evitado todo o desentendimento que acabou se tornando caso de polícia. “Quero me desculpar com toda a cidade. Preferia não estar aqui ontem. Teria evitado uma situação constrangedora, mas é humanamente impossível resistir a este tipo de provocações.
A rixa entre os dois parlamentares ficou mais evidente durante a realização da eleição da atual Mesa Diretora da Câmara, em dezembro do ano passado, quando o Rodrigo Mattos (PSDB) foi eleito presidente do Legislativo. Na ocasião, Castelar foi tachado de “traidor” por José Emanuel (PSC) – então suplente de Noraldino, que, eleito deputado, vivia as últimas semanas de seu mandato na Câmara. Emanuel voltou sua artilharia verbal para o petista por considerar que ele teria rompido um acordo prévio de apoio à chapa derrotada ao abster-se da votação. A chapa era formada por Ana Rossignoli (PDT), Noraldino, Chico Evangelista (PROS), José Fiorilo (PDT) e André Mariano (PMDB). Coincidência ou não, Ana, Chico e José Emanuel estão entre as testemunhas que endossam, no registro de eventos de defesa social (Reds) feito pela PM, a versão de que Noraldino teria sido ameaçado.
O petista ainda considerou ontem, no plenário, que pessoas ligadas a Noraldino – entre eles, José Emanuel – têm, sistematicamente, atuado contra seus posicionamentos pessoais e parlamentares. Para justificar o argumento, citou movimentações que teriam sido feitas pela direção municipal do PSC, pedindo a cassação de seu mandato por ter chamado Noraldino de “trapaceiro”, e pelo próprio deputado estadual, que teria questionado junto ao Ministério Público (MP) o trabalho do petista na Comissão de Saúde. Mais uma vez citado por Castelar, José Emanuel minimizou o desentendimento durante a eleição da Mesa Diretora. “Já me desculpei da bancada. Não existem regras para suplentes. Me manifestei como um cidadão comum.” O petista chegou a afirmar já ter sido ameaçado de morte por Emanuel na legislatura passada. Novamente, o parlamentar do PSC desconsiderou as acusações e, dessa vez, evitou polêmicas. “Não entro mais nessa.”
Inquérito
De acordo com o boletim da ocorrência, o único vereador a reforçar a versão de Castelar – de que Noraldino o “chamou para a briga” em uma sala anexa ao plenário – foi seu companheiro de partido Roberto Cupolillo (Betão, PT). Apesar do depoimento de Betão, o Reds traz Castelar como autor e o deputado como vítima. A ocorrência relata uma segunda vítima: um homem de 57 anos, irmão de José Emanuel, que também afirma ter sido ameaçado pelo petista. Após o vereador ser ouvido e liberado, o caso foi encaminhado para investigação na 1ª Delegacia. O inquérito ficará a cargo do titular Eduardo de Azevedo Moura.
Noraldino cobra punição de vereador
Em uma postagem no Facebook, Noraldino afirmou que espera que o petista seja responsabilizado “na Justiça Comum e que o Conselho de Ética da Câmara não faça vista grossa diante de um indivíduo que se sente no direito de agredir pessoas que contrariam suas posições ou a posição do PT, se escondendo atrás de um mandato”. O deputado promete ainda fazer uma representação junto à PM e ao Ministério Público questionando a condução de Castelar à delegacia em um carro oficial do Legislativo e não em uma viatura policial.
Por outro lado, Castelar também promete questionar a atuação da PM, que, segundo ele, agiu “ao arrepio da lei e da Constituição Federal, que assegura imunidade a parlamentares em todos os níveis”. Além disso, pretende levar denúncia à Assembleia Legislativa, pedindo a abertura de processo por quebra de decoro contra o deputado. “Além da conduta inadequada, o deputado deve explicar e provar porque estava em Juiz de Fora, quando devia estar na Assembleia, trabalhando pelo povo que paga seu salário.” Ainda na segunda-feira, Noraldino afirmou que estava na cidade para tratar de um cálculo renal e que teria atestado médico. Salientou ainda que sua presença na Câmara foi para buscar orientação médica junto ao vereador Antônio Aguiar (PMDB).
Preocupação
Sem entrar no mérito sobre quem teria razão ou não, o vereador Betão se mostrou, durante reunião na Câmara ontem, preocupado com a maneira como o caso foi conduzido e acredita que houve exageros. “Havia aproximadamente oito viaturas em frente à Câmara. Ocuparam o quarto andar e mantiveram o vereador refém por mais de quatro horas em seu gabinete. A PM ocupar o prédio por uma contenda política é inaceitável.” Presidente da Comissão da Direitos Humanos do Legislativo, o petista pretende recorrer à comissão similar da ALMG, para denunciar o que classifica como abuso e violação dos direitos humanos e parlamentares.
Outro a falar sobre a polêmica foi Julio Gasparette (PMDB). Primeiro, o peemedebista se dirigiu a Castelar e pediu calma ao colega de Legislatura, de forma a evitar novos bate-bocas. “Vossa excelência já não é mais criança. Tem que se acalmar ou os problemas continuarão. O que aconteceu ontem prejudica os 19 vereadores.” Depois, Gasparette chegou a sugerir que Noraldino só visite a Câmara em situações que forem extremamente necessárias. “O vereador e o deputado não podem se ver que já se beliscam. Essas visitas têm trazido problemas.” A sugestão, entretanto, foi rechaçada pela bancada do PSC e descartada pelo presidente da Casa, Rodrigo Mattos. O tucano pediu que os pares superassem o ocorrido. “Além do deputado e do vereador, todos nós também perdemos de alguma forma.
Fiorilo deixa Comissão de Ética
Após o desentendimento entre Castelar e o Noraldino ainda na segunda-feira, alguns vereadores defenderam que a postura do petista fosse analisada pela Comissão de Ética e do Decoro Parlamentar. Contudo, durante as discussões na sessão plenária de ontem, ninguém defendeu abertamente uma apuração do caso. O vereador José Fiorilo (PDT), que estava no comando da comissão, protocolou ontem, junto ao expediente da Casa, sua renúncia à presidência.
Fiorilo, entretanto, afirma que não vê relação direta entre o ocorrido na segunda-feira e sua decisão. “Já estava decidido a deixar a função quando se encerraram as discussões do caso do João do Joaninho (ex-vereador do DEM que renunciou ao mandato em julho, após ter seu nome envolvido em suspeitas de crime ambiental). Inclusive, já havia adiantado a decisão a alguns pares.”
O reposicionamento dos postos da comissão já está definido. Integrante do grupo, Nilton Militão dever ser nomeado para a presidência e José Laerte (PSDB) deve herdar uma cadeira entre os titulares. Em entrevista à rádio CBN Juiz de Fora, Militão afirmou que a comissão ainda não foi acionada. “A comissão pode atuar somente após denúncia formalizada, que pode ser feita por qualquer cidadão ou pelo próprio deputado.”