O prefeito Antônio Almas (PSDB) vetou parcialmente o projeto de lei denominado “Infância sem pornografia”, aprovado em abril deste ano, em votação marcada por polêmicas e enfrentamentos no plenário do Legislativo entre grupos de pensamentos distintos. Assim, a legislação foi promulgada nesta terça-feira (22) com a supressão de dois artigos, rejeitados pelo Poder Executivo. Um dos vetos diz respeito ao artigo 2º da proposição do vereador José Fiorilo (PTC), que diz que cabe à família “criar e educar seus filhos, crianças e adolescentes”. Aos olhos da Procuradoria-geral do Município, tal artigo tem viés inconstitucional e apresenta vício de iniciativa “por pretender interferir nas diretrizes e bases nacionais da educação, atuando diretamente sobre componentes curriculares e impondo sanções penais em caso de descumprimento da norma, invadindo, portanto, matéria cuja competência para legislar é exclusiva da União”.
Ainda de acordo com as razões apresentadas pelo Poder Executivo, o veto ao artigo 2º também se justifica pelo fato de que a redação, ao definir que cabe à família e responsáveis a incumbência de educar seus filhos nos termos de suas convicções religiosas e éticas, inviabiliza a aplicação da equidade no ensino básico e fundamental. “Não há como estabelecer critérios universais na grade curricular no sistema de ensino, posto que cada aluno deverá ter adaptado o currículo às ideologias de seus pais e responsáveis, fato que acaba por desconstruir a própria ideia do sistema de ensino existente no país”, afirma a justificativa apresentada pelo Executivo. Neste sentido, a Prefeitura cita ainda veto assinado pelo prefeito de Ribeirão Preto, Duarte Nogueira (PSDB), a artigo de legislação similar aprovado pela Câmara da município do interior paulista.
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O Executivo ainda ressaltou que o veto da Prefeitura de Ribeirão Preto ao artigo foi derrubado pela Câmara do interior, que sancionou o texto à revelia do entendimento jurídico apresentado pelo Poder Executivo. Tal decisão motivou uma ação direta de inconstitucionalidade por parte do Município. Na ocasião, decisão do Poder Judiciário reforçou o entendimento da Prefeitura de Ribeirão Preto – ora citado pela Prefeitura de Juiz de Fora – e também constatou o vício de inconstitucionalidade na proposição e declarou a inconstitucionalidade da Lei nº 14.10/2017.
Competência da União
O prefeito Antônio Almas também vetou o artigo 5º do texto validado pela Câmara de Juiz de Fora. Tal trecho define que a violação ao disposto na legislação em questão implica em penalidade previstas pela lei federal que define o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Sobre tal ponto em questão, o Município também apontou aspectos de inconstitucionalidade. As razões do veto ainda questionam “quais penalidades impõe o ECA aos infratores do crime de pornografia infantil?”
“Ao prever o cometimento de crimes para os casos de prática de pornografia infantil, o ECA legislou sobre matéria penal, exclusiva da União, razão porque o projeto de lei substitutivo ao projeto nº 01/2017 ao fazer remissão às sanções previstas no ECA, claramente dispôs sobre matéria criminal, infringindo o artigo 22, inciso I, da Constituição Federal, usurpando competência privativa da União para legislar sobre o tema, devendo, pois, ser reconhecida sua inconstitucionalidade integral”, afirma a justificativa do Poder Executivo.
Agora, cabe à Câmara a debater o veto parcial à redação que originou a nova legislação municipal, mantendo ou não a decisão assinada pelo prefeito. As negativas ainda podem ser derrubadas pelo plenário do Poder Legislativo. Neste caso, o texto originalmente aprovado seria publicado na íntegra pelo Palácio Barbosa Lima.
Em vigência, regra traz compilação de leis federais
A despeito dos artigos vetados, o restante do projeto foi sancionado e promulgado pela Prefeitura e já está em vigor na forma da lei municipal 13.706 de 21 de maio de 2018. Entre as disposições mantidas estão aquelas que definem que os serviços públicos e os eventos apoiados pelo Poder Público Municipal devem respeitar as leis federais que proíbem a divulgação ou acesso de crianças e adolescentes a material contendo pornografia infantil; e a que rege que, ao contratar serviços ou adquirir produtos de qualquer natureza, bem como apoiar eventos ou espetáculos ou programas de rádio, televisão ou redes sociais, a Administração Direta ou Indireta do Município fará constar cláusula obrigatória de respeito ao disposto nesta lei pelo contratado, apoiado ou beneficiado.
Desde o início de sua tramitação, a legislação em questão foi atacada por setores ligados à educação e defendida por grupo de pautas mais conservadoras. Na prática, o texto aprovado na forma de substitutivo e vetado parcialmente pelo Executivo resulta em uma compilação de regras e legislações já vigentes e cita artigos constitucionais, do Código Civil, da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos e de outros decretos e leis ordinárias federais. Ao longo da tramitação, representantes dos educadores consideraram a proposição como inócua por se tratar de temas já abarcados por legislações federais, que, de certa forma, assediaria servidores municipais ao valer-se do apelo da associação das palavras “pornografia” e “infância” para colocar o funcionalismo público juiz-forano sob constante suspeição.