Em entrevista à Rádio CBN Juiz de Fora nesta segunda-feira (8), os cientistas políticos Paulo Roberto Figueira Leal e Rubem Barboza avaliaram as eleições para deputados estaduais e federais, senadores, governadores e presidente, que ocorreram neste domingo (7).
Os resultados para o Governo de Minas Gerais, que apontaram o candidato Romeu Zema (Novo) em primeiro lugar, indo para o segundo turno com Antonio Anastasia (PSDB), surpreenderam, visto que, em boa parte da corrida eleitoral as pesquisas indicavam que Anastasia enfrentaria o candidato do PT, atual governador, Fernando Pimentel. Além disso, a primeira colocada nas pesquisas para o Senado, Dilma Rousseff (PT), terminou em quarto lugar, ficando de fora da disputa.
Para Paulo Roberto, as pesquisas ainda são um bom parâmetro para apontamento de um possível resultado. “A pesquisa Ibope de boca de urna dá um número absolutamente igual aos que as urnas revelaram. O que talvez sinalize que houve movimentos para o Governo de Minas e do Rio de última hora, que foram sendo capturados pelas tendências das pesquisas anteriores, mas cujo volume só foi percebido adiante. Eu acho que as pesquisas continuam sendo um instrumento importante de ver tendências, curvas.”
O cientista político aponta que há mais dificuldade de aferir com precisão os resultados para o Senado. “Sobretudo, sendo dois senadores, muitas escolhas foram feitas no dia. Historicamente, as pesquisas para o Senado têm índices de precisão bem menores do que as disputas para o majoritário.”
Rubem Barboza endossa a fala de Paulo, e avalia que as pesquisas mudaram após os debates. “Tivemos eleições extremamente voláteis em estados como Minas Gerais e Rio de Janeiro. A gente tem que ver até que ponto as pesquisas induzem ao voto útil, não levam a uma simplificação, uma restrição dos votos, porque as pessoas pensam ‘não vou perder meu voto’. Isto existe, é um preço que a gente tem que pagar para generalizar uma informação.”
Eleições presidenciais e apoios
Eu acho que estamos caminhando para uma eleição que não pacificará. Ao contrário. Qualquer resultado implicará em uma enorme dificuldade de sair desta crise política em que a gente vive
Paulo Roberto Figueira Leal, cientista político
Candidatos a governadores já sinalizaram apoio a candidatos que foram para o segundo turno da eleição presidencial. Zema indicou apoio a Jair Bolsonaro (PSL) antes mesmo do fim do primeiro turno, bem como o candidato Weitzel (PSC), primeiro classificado para o segundo turno do Governo do Rio de Janeiro, e João Dória (PSDB), em São Paulo. O candidato do PSOL à presidência, Guilherme Boulos, sinalizou seu apoio ao candidato Fernando Haddad (PT). Ciro Gomes, terceiro lugar na corrida presidencial, apesar de ter dito, em entrevista, que não apoiará Bolsonaro, não confirmou apoio ao candidato do PT, assim como Marina Silva (Rede), que afirmou ser oposição a qualquer um dos candidatos que vencer o pleito.
“Me parece que no caso do Ciro, independentemente do que aconteça em sua posição, o eleitor tende a migrar para o Haddad. Acho que há chance real de um acordo formal. Há um espaço de crescimento para o Haddad, mas que ainda é insuficiente para tirar uma diferença de 17 milhões de votos. Certamente, só com o apoio do Ciro, do Boulos, que foi vítima do voto útil já no primeiro turno, só com a parcela dos votos da Marina, e até mesmo uma parcela do voto do Alckmin, de uma fração, de fato, mais social-democrata, o Haddad não seria capaz de alcançar o Bolsonaro. Portanto, acho que o esforço da campanha do PT é de fazer acenos para além deste voto que, com alguma naturalidade, poderia migrar para ele”, afirma Leal.
O especialista aposta na vantagem de Jair Bolsonaro, já que, na história das eleições democráticas, não há casos de candidatos que tenham liderado a eleição no primeiro turno e perdido no segundo. “No colégio eleitoral do Sudeste, que tem os três maiores do país, os segundos turnos são constituídos exclusivamente por candidaturas que não apoiarão Haddad.” Barboza chama atenção que candidatos aos governos do Rio e de Minas Gerais “pegaram carona” com o presidenciável do PSL. “Agora o caminho natural deles é apoiar o Bolsonaro, mas eu não sei até que ponto isto vai ser eficaz do ponto de vista eleitoral. Eu acho que o Haddad tem problemas, mas também vejo dificuldades de crescimento do Bolsonaro. Todos os dois têm que procurar um movimento ao centro.”
Para Leal, a vitória de qualquer um dos dois candidatos não será capaz de colocar um fim à crise política no país. “Eu acho que estamos caminhando para uma eleição que não pacificará. Ao contrário. Qualquer resultado implicará em uma enorme dificuldade de sair desta crise política em que a gente vive.”
Debates, redes sociais e fake news
O segundo turno das eleições para governadores e presidente ocorrerá no dia 28 de outubro. Os especialistas acreditam que os candidatos devem deixar seus projetos mais claros. “No segundo turno, Bolsonaro vai ter que costurar suas propostas com muito mais clareza do que fez até agora. Uma das coisas que mais me chamou a atenção nessas eleições foi o protagonismo das redes sociais, principalmente no caso do Bolsonaro. O Facebook e, fundamentalmente, o WhatsApp, no qual a mensagem chega fragmentada para os eleitores e circulam dessa maneira. Cada um viu o Bolsonaro que quis, e ele não teve que se expor, mostrar coerência. Por outro lado, o Haddad vai ter que mostrar competência para materializar o discurso dele agora. Ele quer unir os democratas, vai ter que mostrar autonomia para fugir de uma ala mais radical do PT e poder fazer um discurso coerente, efetivo, sobre esta possibilidade de união”, apontou Barboza.
Leal destaca que, para Haddad, mostrar autonomia é delicado, visto que quando Lula ainda era candidato, seu percentual de intenção de voto (de Haddad) era pequeno. “Chegar a quase 30% dos votos válidos não é por conta só do Haddad, é indiscutível a centralidade do Lula e do PT. No imaginário da esquerda, produzir um movimento ao centro, como modo possível de ganhar essa eleição, tem que ser feito com cuidado para não perder a capacidade de ser um vocalizador da fração que não é inexpressiva do eleitorado.”
Ainda sobre as redes sociais, Leal afirma que o momento de transição das tecnologias pode causar impactos profundos. “Só não é possível falar que o velho morreu. Talvez o velho conviva com o novo em combinações que, certamente, não são as que estavam em 2014, estão em cenário de transição. Um exemplo pró-Bolsonaro: ele vai ter tempo de TV, aonde ele tem seu pior desempenho hoje, entre os mais pobres, que dependem mais da TV do que os mais ricos, que têm uma variedade informativa maior. Portanto, a TV continua sendo uma peça do jogo que não pode ser desconsiderada, mesmo que não tenha a hegemonia que teve outrora.”
A discussão acerca das fakes news, as notícias falsas, também foi lembrada no debate na Rádio CBN Juiz de Fora. “Fake news são um problema e, especialmente a TV, rádio e os jornais, são aqueles que mais combatem fake news. Você não tem jeito de combater isso dentro da própria rede. O WhatsApp é fechado, não tem como saber quem mandou a fake news. As formas usuais vão coexistir, como nos Estados Unidos e na Europa. Você tem as redes, mas você tem o peso do jornalismo, que vai continuar”, disse Barboza.
O cientista político levanta outro ponto importante nestas eleições: a questão de gênero e o lugar de fala da mulher. “Não pode mais sair da nossa pauta, e não vai sair.” Para ele, estes assuntos contrastam com a candidatura da extrema direita. “Seja do ponto de vista político, seja do ponto de vista dos costumes e da economia, é um país dividido. Nós temos o país hoje com opções distintas, e como depois você faz um discurso de unidade, ou, pelo menos unidade mínima, para este sistema funcionar?”.
Partidos precisarão se reinventar
Se o PT quisesse, de fato, que a esquerda tivesse uma chance maior, teria feito uma aliança com o Ciro no primeiro turno
Rubem Barboza, cientista político
Leal aponta que partidos que compunham majoritariamente a Câmara dos Deputados perderam muitas cadeiras nesta eleição. “O PMDB perdeu 31 deputados (federais), o PSDB perdeu 25, o PT perdeu 14, ou seja, os grandes perdedores desta eleição, do ponto de vista congressual, são exatamente os partidos que estruturaram o sistema político brasileiro do anos 1990 para cá. Há um movimento antisistêmico, liderado pelo Bolsonaro, que muda um pouco das peças do tabuleiro. Se você pegar de 1989 para cá, o Collor era um outsider, mas ganhou apoio de uma parte do sistema partidário consolidado e, desde os anos 1990, PSDB, PMDB e PT estruturaram a dinâmica da política brasileira. Será, em alguma medida, um cenário diferente quando você olhar para as bancadas congressuais e ver que 30 partidos conseguiram eleger deputados. Um nível de pulverização que nunca aconteceu.”
Responsáveis por uma polarização nas eleições presidenciais que já dura mais de 20 anos, PSDB e PT devem passar por mudanças profundas nos próximos anos. “Acho que o PT tem uma sobrevida como líder da oposição mesmo que perca. O PSDB vai ter uma discussão existencial nos próximos dias. A posição que indicarem, implicará em rupturas internas. Lideranças importantes já declararam voto no Bolsonaro, mas algumas lideranças históricas teriam resistência a isso, devido ao que representa o projeto democrata e um apoio ao que Bolsonaro indica ser”, opina Leal.
Barboza acha que o PT também precisará se reinventar. “Se o PT quisesse, de fato, que a esquerda tivesse uma chance maior, teria feito uma aliança com o Ciro Gomes no primeiro turno. Acho que tem uma série de partidos de esquerda que não quer mais ficar debaixo das asas do PT, porque é mortal. Tem que tomar a posição ‘Eu não sou o dono da esquerda’, ou vai desaparecer igual ao PSDB. O MDB também está com problemas. Eles vão ter que se reinventar.”
O partido do presidenciável Jair Bolsonaro, que possuía um único representante na Câmara, cresceu, elegeu 52 deputados e se tornou a segunda maior bancada da Câmara, atrás apenas do PT, com 56 parlamentares. Em 2014, a bancada eleita possuía 69 representantes do partido. Trinta partidos elegeram representantes para a Câmara nesse domingo, e 22 legendas terão representantes no Senado.
O cenário em Juiz de Fora
Alguns políticos com cadeiras na Assembleia e na Câmara, eleitos majoritariamente por Juiz de Fora, não conseguiram se reeleger desta vez. Ficaram de fora da Assembleia Isauro Calais (MDB) e Antônio Jorge (PPS) que tentavam a reeleição, além de Bruno Siqueira (PMDB), que deixou a Prefeitura de Juiz de Fora para tentar uma vaga como parlamentar em Belo Horizonte. Já Marcus Pestana (PSDB) deixará a Câmara dos Deputados em Brasília no ano que vem, caso não assuma como suplente.
Em contrapartida, Betão (PT) e Sheila Oliveira (PSL) conseguiram se eleger para assumir cargos na Assembleia Legislativa. Noraldino Júnior (PSC) mantém a cadeira. Na Câmara dos Deputados, Júlio Delgado (PSB) e Margarida Salomão (PT) foram reeleitos para mais uma legislatura. As novidades são o atual vereador Charlles Evangelista (PSL) e o atual deputado estadual Lafayette Andrada (PRB).
“O que mais me surpreendeu não foi o Bruno (Siqueira) não se eleger, foi ter a votação baixa que teve (26.515 votos). Para alguém que ocupou por duas vezes a Prefeitura de uma cidade como Juiz de Fora e já foi deputado estadual, a votação numérica, quantitativamente, é muito inferior ao que se imaginava que se poderia ter”, pondera Leal. Barboza atribui a baixa votação do candidato ao fato de ele ter deixado a Prefeitura.
Os especialistas também comentaram sobre dois candidatos de um mesmo partido disputando uma vaga, caso de Isauro Calais e Bruno Siqueira, saindo pelo MDB. “Você tem uma disputa muito grande entre lideranças, e é difícil fazer alianças. O PT fez uma articulação para impedir que outro saísse (candidato). Eu acho que os partidos deveriam ter feito isso. Mas o que a pessoa faz? Sai do partido. Se não tiver essa capacidade de diálogo, vão sempre patinar com um número muito menor de deputados federais e estaduais que potencialmente poderiam ter”, acredita Barboza.
Os possíveis reflexos na Prefeitura de Juiz de Fora também foram comentados. “Em que circunstâncias os prefeitos tentarão a reeleição? 2019 pode ser um momento de forte contração fiscal, ou recusa de repasses aos municípios em volumes razoáveis, o que compromete planos de reeleição. Tem uma série de variáveis”, avalia Leal. Já Barboza aponta que medidas do novo Governo do Estado podem beneficiar uma possível candidatura de reeleição nas prefeituras.
A nova configuração na Câmara de vereadores da cidade também foi pauta do debate. Com a eleição de Roberto Cupolilo, o Betão, Juraci Scheffer retorna à Câmara. No lugar da vereadora Sheila Oliveira, volta a assumir a cadeira Nilton Militão. E no lugar de Charlles Evangelista, eleito para a Câmara dos Deputados, assume Wagner do Sindicato, pela primeira vez no mandato.