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Câmara deve voltar a discutir feriado no dia 20 de novembro

2Camara Municipal Leonardo Costa
Projeto de Lei foi apresentado à Câmara dos Vereadores na semana passada (Foto: Leonardo Costa)
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A Câmara Municipal de Juiz de Fora deve voltar a discutir a criação de um novo feriado municipal, a ser comemorado no dia 20 de novembro, em alusão ao aniversário da morte de Zumbi de Palmares. A sugestão da criação do feriado é o tema central de um projeto de lei apresentado pela vereadora Cida Oliveira (PT) na semana passada. Vale lembrar que, em novembro de 2015, a Câmara aprovou uma legislação praticamente idêntica, mas a instituição do feriado acabou declarada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), após análise de uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) proposta pela Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg).

Na justificativa apresentada junto ao projeto de lei, Cida Oliveira lembrou o imbróglio judicial que resultou na declaração de inconstitucionalidade da Lei municipal 13.242/2015. Na ocasião, a alegação da Fiemg foi de que o Município não poderia instituir o feriado porque isso usurparia competência privativa, além de extrapolar limites estabelecidos pela Lei Federal 9.093/95, que dispõe sobre a instituição de feriados. Segundo a vereadora, decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) indicou entendimento “completamente diferente da tese de inconstitucionalidade por vício de iniciativa da lei municipal”.

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ADPF 634

Nas discussões da Arguição de Descumprimento Fundamental (ADPF) 634, que avaliou a competência do município de São Paulo (SP) para instituir o dia 20 de novembro como feriado do Dia da Consciência Negra, o plenário do STF deliberou pela constitucionalidade da lei municipal que instituiu o feriado na capital paulista.

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A decisão foi confirmada no último dia 30 de novembro. Relatora da ADPF, a ministra Cármen Lúcia defendeu que o dia 20 de novembro é um símbolo de resistência cultural e de ação afirmativa contra o preconceito racial. No julgamento, também foi destacado o fato de que a data já é celebrada como feriado local em mais de cem cidades brasileiras nos estados de Amazonas, Amapá, Mato Grosso, Alagoas e Rio de Janeiro.

Oito ministros seguiram o voto da relatora: Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Rosa Weber, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux e Dias Toffoli, formando maioria de 9 a 2. Apenas os ministros André Mendonça e Nunes Marques apresentaram entendimento divergente, de que a criação de feriados interfere na dinâmica das cidades e em questões trabalhistas que, segundo a Constituição Federal, são de competência da União.

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“O objetivo da lei nunca foi reconhecer ou garantir direito aos trabalhadores, mas, através do feriado, homenagear um grande líder do movimento negro brasileiro, que pode também ser entendido como uma personalidade importantíssima para as religiões de matriz africana. Então, de maneira indireta, impacta em um dia de trabalho, mas o ponto é valorizar nossa cultura e exaltar um herói da nossa história”, reforça Cida Oliveira, ao defender a aprovação de seu projeto de lei.

Vereadora cita passado escravocrata da cidade

Ao propor a criação de um novo feriado municipal, a parlamentar ainda considera que “o dia 20 de novembro representa uma importante data, especialmente para 52% da população brasileira, que é representada por pretos e pardos”. “Em Juiz de Fora, onde há fortes raízes da cultura negra, tendo em vista nosso passado escravocrata e proletário, já contamos com o dia da consciência negra no calendário oficial, comemorado no mesmo dia 20 de novembro. Entretanto, em mais de mil cidades brasileiras, entre elas várias da Zona da Mata mineira, o dia 20 de novembro é considerado feriado municipal, justamente para rememorarmos a morte do principal líder negro Zumbi dos Palmares”, afirma Cida.

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A vereadora ainda alega que, de acordo com dados do Núcleo de Pesquisa em História Econômica e Demográfica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Juiz de Fora chegou a ter 62% de sua população composta por africanos escravizados. “Entre 1550 a 1850 recebemos cerca de 4,8 milhões de pessoas. É inegável que a construção de Juiz de Fora se deu com as mãos dos negros. É por isso que voltamos a esta Casa Legislativa requerer o reconhecimento do protagonismo histórico do povo negro na formação cultural desta cidade”, defende a autora do projeto.

Lei similar já havia sido aprovada em 2015, mas não chegou a vigorar

Em novembro de 2014, o deputado estadual Betão (PT), então vereador, apresentou na Câmara Municipal um projeto de lei que insituía o dia 20 de novembro como feriado municipal, em alusão ao aniversário da morte do líder negro Zumbi dos Palmares. O texto foi aprovado um ano depois, em novembro de 2015, em votação apertada, sendo 11 votos favoráveis e sete contrários no primeiro turno; e 9 a 7 no segundo turno.

Dos atuais 19 vereadores, seis participaram da polêmica votação em 2015. Três votaram a favor da instituição do feriado na ocasião: Dr. Antônio Aguiar (União Brasil), Nilton Militão (PSD) e Cido Reis (Rede), sendo que este último estava ausente da votação em segundo turno. Três votaram de forma contrária à proposta: Luiz Otávio Coelho (Pardal, União Brasil), Vagner de Oliveira (PSB) e Zé Márcio (Garotinho, PV).

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Após a votação final do projeto de lei, que aconteceu no dia 19 de novembro de 2015, Câmara e Prefeitura deram celeridade aos trâmites burocráticos para que a legislação fosse sancionada ainda no dia 20 de novembro de 2015, data da morte de Zumbi dos Palmares, o que acabou se consumando.

Em março de 2016, a Fiemg já deu entrada na ADI que acabou por derrubar o feriado. O julgamento da ação pelo TJMG aconteceu no dia 28 de setembro do mesmo ano. A decisão do Tribunal também não foi unânime. Relator da ação, o desembargador Evandro Lopes da Costa Teixeira se manifestou pela inconstitucionalidade da lei municipal. Por sua vez, o desembargador Alberto Vilas Boas abriu divergência, no que foi acompanhado por outros sete magistrados. No entanto, prevaleceu a tese do relator, por 15 votos a 8.

Discussão estadual

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Procurado pela Tribuna, o deputado estadual Betão relembrou a aprovação do projeto de lei em 2015. Para ele, os questionamentos à legislação se deram por conta do “racismo estrutural”. O petista lembra que, em 2019, apresentou um projeto de lei na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para tornar o 20 de novembro feriado estadual.

O texto ainda tramita pelas comissões da ALMG. “Se o mesmo for aprovado sabemos que, hoje, a maior parte do STF entende que o feriado da Consciência Negra pode ser instituído por outros entes da federação e aí teremos uma lei para todos os municípios mineiros. Rememorar a história dos líderes dos povos escravizados é criar atividades afirmativas para fortalecer a identidade entre os cidadãos”, afirma Betão.

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