A publicação conta com artigo de 23 pesquisadores das principais universidades do país (USP, UFRJ, UniRio, UERJ, UFPR e UFMG) e aborda tendências eleitorais, evolução de votos, financiamento de campanhas, horário eleitoral e papel da imprensa. Os textos foram organizados pelos cientistas políticos Argelina Cheibub Figueiredo e Felipe Borba. Por WhatsApp, Borba deu a seguinte entrevista à Agência Brasil.
Agência Brasil – As eleições e campanhas que tivemos desde a redemocratização pós-regime militar são muito diferentes daquelas do passado?
Felipe Borba – Naquele primeiro momento, o voto, o presidente, era eleito com maioria simples dos votos. Juscelino (Kubitscheck) foi eleito com 35% dos votos, o que naquele momento gerou uma crise de legitimidade. A partir de 1989, ano da eleição de Fernando Collor, já é exigida a maioria absoluta dos votos. Caso o candidato não alcance (ao menos, a metade mais um), disputa o 2º turno. A segunda diferença é a expansão do eleitorado. Incluímos os analfabetos como eleitores. Isso ampliou bastante o eleitorado, tornando a dinâmica bastante diferente daquele momento anterior. Por fim, antigamente, havia três partidos grandes – o PTB, o PSD e a UDN – esses dois últimos tinham mais capilaridade. Quando ocorre a intervenção já no governo militar (após o golpe de abril de 1964), o PTB começava a se expandir para o interior. No período após a redemocratização, há uma capilarização maior, a política é nacional e mais fragmentada do que naquele momento.
– Que impacto teve a adoção do voto eletrônico?
– O voto eletrônico teve efeito muito forte sobre o percentual de votos brancos e nulos, que diminuíram. A queda aconteceu drasticamente na virada da eleição de 1998 para a eleição de 2002. Em 1998, o voto eletrônico ainda não havia sido adotado universalmente, mas em 2002, sim.
– Como avalia as mudanças na legislação eleitoral?
– A mudança na legislação eleitoral para este ano é problemática em alguns pontos. Primeiro, diminuiu muito o período de campanha. E diminuiu muito também a quantidade de minutos da campanha eleitoral no rádio e na televisão. Ao mesmo tempo, ela alterou a regra de distribuição do horário de propaganda entre os candidatos. Até 2014, vigorava a regra na qual até um terço da propaganda era distribuída igualmente entre os candidatos e dois terços proporcionais aos partidos e coligações na Câmara dos Deputados. Na verdade, o que essa legislação proporcionou foi uma cartelização: poucos partidos conseguem ter tempo de televisão. Nessa campanha, teremos (Geraldo) Alckmin (PSDB), o candidato do PT e o candidato do MDB, (Henrique) Meirelles com tempo para poder falar, enquanto os demais candidatos terão pouquíssimos segundos. Cria uma desigualdade muito grande entre os candidatos. Do ponto de vista da democracia é ruim porque impede a discussão do país. Como candidatos com cinco, sete, doze segundos vão se apresentar para o eleitorado e mostrar suas propostas? Do ponto de vista eleitoral, (a nova legislação) dificultou muito a competitividade dos pequenos partidos e, do ponto de vista da democracia, dificultou muito a discussão de políticas públicas.
– Teremos de fato o fim da hegemonia da televisão?
– Ainda é muito cedo para dizer que veremos o fim da hegemonia da televisão. A capilaridade da televisão ainda é muito grande. Há pesquisas que mostram que 95% dos brasileiros assistem televisão e boa parte assiste diariamente. A televisão ainda é a principal fonte de informação e de entretenimento. Mas ela começa sim a sofrer competição das redes sociais e das mídias sociais. Até porque, como dissemos, a propaganda na televisão diminuiu. As mídias sociais podem ser uma forma de contrabalancear essa falta de espaço na televisão. O que reforça o peso da televisão é que, em geral, as campanhas eletrônicas tendem a circular dentro de uma mesma bolha. Entre pessoas parecidas, entre pessoas iguais. Não rompem barreiras sociais como a televisão, que entra na casa da pessoa durante o intervalo do programa que está assistindo, e ela acaba vendo a propaganda de um candidato que não estava disposta a ver inicialmente. Com a mídia social, como os grupos de WhatsApp, há mais a tendência de reforçar do que alterar as predisposições.
– A eleição que ocorrerá em outubro de 2018 será muito diferente das estudadas por vocês nos últimos 25 anos?
– Elas são semelhantes em muitos sentidos porque dois partidos polarizaram a disputa. Com exceção da primeira eleição, que tivemos Fernando Collor presidente, de 1994 até 2014, PT e PSDB disputaram a hegemonia política. O que pode ter de novo é que essa polarização pode, enfim, ser enterrada ou, pelo menos sufocada momentaneamente. Existe muita incerteza neste pleito. Até agora, o (Geraldo) Alckmin não conseguiu decolar como candidato; é possível que esse nicho da centro-direita seja ocupado pelo (Jair) Bolsonaro (PSL). Ao mesmo tempo, existe uma incerteza muito grande se o PT estará no 2º turno – dada a condição política do ex-presidente Lula e transferência ou não de votos para o (Fernando) Haddad (vice de Lula). A expectativa ainda é que PT e PSDB possam se enfrentar no 2º turno, pela capilaridade que os dois partidos têm, pela estrutura, pelos recursos de campanha, tempo de televisão e militância política.