Na última temporada, dividindo o carro com Alex Seid, sua dupla, o piloto juiz-forano Marcelo Henriques (Mais1 Café / Pecan Baru / D4U Law Group), 39 anos, foi campeão da categoria PROAM da GT Sprint Race, um dos eventos mais importantes do automobilismo no Brasil. O título na categoria intermediária da competição nacional não apenas coroou o destaque da dupla, como carimbou a ida para a disputa PRO, a de mais elevado nível do campeonato, que envolve pilotos de elite, cada vez mais próximos da Stock Car, maior e mais popular certame sobre quatro rodas do país.
Ao todo, a GT Sprint Race é dividida em três competições. A mais competitiva é a nacional, em que, na temporada passada, Marcelo e Alex contabilizaram 221 pontos contra 219 do mineiro Weldes Campos, vice. “Foi um título bem especial pra mim. A última corrida foi a mais tensa da minha vida. Se eu perdia uma posição, não era campeão, pela diferença apertada de pontos. Mas acabamos terminando em primeiro ao final de seis corridas”, conta Marcelo à Tribuna. Além do nacional, ainda há o torneio das corridas especiais – três na temporada – e o overall, que une as duas competições, na qual Marcelo ficou com a prata.
Uma outra característica importante valoriza os resultados do juiz-forano. “Na GT, uma equipe controla todos os carros. Então todos os pilotos que competem a temporada têm à disposição o mesmo carro, com o desempenho definido no braço, sem a diferença de equipamentos”, explica.
Financeiramente, no entanto, os desafios são extensos e justificam o fato de Marcelo e Alex dividirem o mesmo carro, o que, apesar da sintonia e da capacidade da dupla, desgasta mais o veículo em relação aos concorrentes que pilotam solo. “Cada um tem que correr atrás dos seus patrocinadores. Essa divisão para compor o carro é estritamente econômica”, relata.
Com o título, os dois já têm a cabeça totalmente voltada à temporada 2021 na categoria PRO, a principal da GT, com estreia em 14 de março, na largada da primeira etapa do ano no campeonato, no Autódromo Velocitta, em Mogi Guaçu (SP).
“A GT é um dos principais campeonatos do automobilismo brasileiro. Dá acesso à Stock Car, passa por autódromos de todo o Brasil. E agora o buraco fica um pouco mais embaixo, porque é ainda mais difícil dividir o carro e competir de igual pra igual com os PRO, já que eles têm seus próprios carros. Não sei o que pode acontecer, mas vou me dedicar 100% para evoluir como piloto, deixar ligada a chavinha do aprendizado e, na medida do possível, bater de frente quando der. Essa experiência vai me fazer melhorar, certamente, e espero trazer bons resultados”, projeta Marcelo.
Ao todo, a dupla vai disputar seis etapas do campeonato nacional com provas em locais como Curitiba (PR), Cascavel (PR) e em Interlagos (SP), em temporada programada para ser encerrada em 5 de dezembro.
‘A pandemia afetou bastante’
Como em todo o mundo, seja no esporte ou fora das competições, a pandemia também prejudicou o automobilismo brasileiro, o que deve continuar, ao menos, até que toda a população seja imunizada contra o coronavírus. E o prejuízo global naturalmente não deixou de impactar a disputa da Sprint Race na categoria PROAM, como explicou Marcelo, que também vê a retomada das provas em 2021 de forma otimista.
“A pandemia afetou bastante e tende a seguir prejudicando um pouco nesse início de temporada, mas estou otimista de que tudo vai normalizar em breve”, inicia o juiz-forano. “O que mais faz diferença é a ausência do público nos autódromos. Você sente a energia e vê que muitos torcem por você. Essa galera faz a diferença. Por outro lado, você faz seu ritual concentrado. Mas comercialmente também é complicado, não gera aquelas ações dos patrocinadores com o público. Faz muita falta. Mas, com as coisas melhorando, vamos conseguir iniciativas bem bacanas.”
‘Joguei tudo pro alto atrás do meu sonho’
Nascido em São Paulo, Marcelo Henriques se diz e se considera verdadeiramente juiz-forano. “Vim para JF ainda bebezinho e só voltei pra São Paulo quando adulto. Minha família era de Santa Paula (Zona Leste da cidade)”, conta o piloto, que deixou sua casa atrás do sonho, ainda que de forma tardia.
“Fui para São Paulo só com 23 anos correr kart. Nessa época era bem complicado correr em JF. E é um esporte supercaro, meus pais não tinham condições de me ajudar a começar. Por isso só iniciei adulto em kart amador. Mas vi que era competitivo, apesar de não ter começado novinho, e tentei algo maior, disputando campeonatos do mais alto nível de kart do Brasil. Fui mesmo sem saber se conseguiria pagar minhas contas. Joguei tudo pro alto atrás do meu sonho”, recorda.
Nesta época, Marcelo já possuía um trabalho que lhe dava um mínimo de segurança financeira para permanecer na capital paulista. “Aos 23 anos eu já trabalhava com a produção de legendas de filmes, tudo de home office, o que me deu essa liberdade.”
O sucesso não demorou a vir. Ao menos parece ter chegado antes mesmo da autopercepção de que tinha talento para o esporte. “No primeiro ano fui campeão paulista. Além de amar tudo, finalmente caiu a ficha de que eu corria o risco de ser bom”, brinca. “Passei mais alguns anos no Paulista, aprendi bastante e, depois, fiquei estagnado por não ter grana pra carro. Joguei tudo pro alto de novo e fui para os Estados Unidos”, relata, tendo ido disputar o Campeonato de Legends Cars, na Flórida. “Fiz meia temporada de carros lá, mas fraturei o pulso e perdi a chance do campeonato, ficando sem sentido seguir fora do meu país. Voltei, parei um pouco de competir até uma oportunidade na Fórmula Inter que enxerguei. As portas passaram a abrir. Ganhei o primeiro ano, o segundo e tive a chance de ir pra Sprint em categoria nacional.”
Marcelo seguiu evoluindo e transformando seu suor em títulos, como em 2017 e 2018, no Campeonato Paulista da Fórmula Inter. “Tudo que conquistei foi na base de muito trabalho, sorte e das vitórias que consegui, porque sabemos que é um esporte caro e muitas pessoas talentosíssimas acabam ficando para trás por conta disso”, avalia.
Stock Car: ‘Se surgir, vou agarrar com unhas e dentes’
Marcelo segue movido pela paixão em acelerar, mas também com o desejo de um dia poder disputar a principal competição do país, a Stock Car. “É o auge do automobilismo nacional. Claro que uma oportunidade em um carro bom seria muito interessante de tentar trazer mais esse título pra Juiz de Fora, mas esbarramos no lado dos patrocinadores. Isso que me impede de ir pra lá. Mas é uma das pretensões que tenho”, admite.
Ainda assim, o piloto local exalta o momento vivido em um evento que, assim como o juiz-forano, não para de crescer. “De quatro anos pra cá, a GT Sprint Race se tornou uma grande estrela no universo do automobilismo brasileiro. Está em uma tendência de alta e pode, daqui a poucos anos, ser tão importante quanto a Stock, que tem os pilotos do mais alto nível, mas que, às vezes, correm com a gente. O Thiago Camilo, por exemplo, estava correndo com a gente no ano passado, o que dá uma vontade a mais de permanecer. Mas estou muito, muito feliz e, se surgir uma oportunidade na Stock, vou agarrar com unhas e dentes, como sempre fiz.”
‘Correr em casa seria um marco na minha vida’
Novidade em 2020 pelas corridas especiais da GT Sprint Race, a sétima etapa do campeonato overall da próxima temporada será disputada no Autódromo Potenza, localizado em Lima Duarte, a cerca de 40 quilômetros de Juiz de Fora. A possibilidade de correr “em casa” leva uma motivação mais que especial ao piloto juiz-forano.
“Faz muita diferença. Sair das asas da família e correr fora foi minha carreira, mas quando existe a chance de ter os familiares no autódromo, te dá uma sensação de ser mais rápido. Estou bem empolgado, fechamos pra correr seis corridas nacionais, a de JF está entre as especiais, mas estou atrás de orçamento pra conseguir disputar ela também”, conta. “Seria um marco na minha vida. É como se encerrasse um ciclo iniciado lá atrás, cheio de sonhos na cabeça, percorrendo um longo caminho de muitas alegrias, e agora voltar para casa fazendo o que amo, me sentindo realizado e com família e amigos por perto. Vai ser difícil conter a ansiedade.”
Além da proximidade com os familiares, Marcelo também quer desfrutar da nova estrutura na Zona da Mata, muito elogiada pelo piloto. “Quando estavam em obras, nem tinham as zebras, conversei com o proprietário porque achei maravilhoso de cara. Depois vi a obra acabada com tudo muito bem feito, segurança pra ser homologado paras as principais categorias do Brasil. E é um lugar lindo também, com uma paisagem que você não acha em outros autódromos. Tem tudo para ser um dos principais do país. É meio que uma arena, o público consegue ver a pista inteira em alguns pontos. Só vi coisas positivas. Dá vontade de voltar e ficar de vez!”, exalta.