Cerca de três meses após o início da quarentena, a boa notícia para uma das principais esperanças do país no ciclo olímpico: a seleção brasileira de boxe pode voltar a se reunir no próximo mês para treinar em uma base em Portugal. A situação ainda não é certa, mas a expectativa já alegra a campeã Beatriz Ferreira que anseia em retomar os treinamentos com o uniforme verde e amarelo. Desde a segunda quinzena de março, a atleta está em sua casa em Juiz de Fora, onde mantém a rotina de treinos com o pai, Raimundo Oliveira, o popular Sergipe. Na época, a baiana radicada em JF havia acabado de retornar da base na Colômbia, quando recebeu a notícia de que o centro de treinamento em São Paulo fora fechado, e os atletas mandados para casa.
“Era o melhor a se fazer, íamos nos arriscar muito se ficássemos em São Paulo. Até então eu estava acreditando que seria apenas uma semana ou 20 dias no máximo, de repente se passou um mês e precisei comprar equipamentos para continuar treinando, pois deixei tudo lá”, conta a pugilista que estava de malas prontas para disputar o torneio Pré-Olímpico, na Argentina, para conquistar uma vaga na Olimpíada de Tóquio – agora adiada para o ano que vem. Mas, assim como os Jogos, a competição também foi suspensa. “A América ainda não tem participantes definidos, talvez alguns já tenham garantido a vaga no boxe (em outros continentes)”, explica.
Buscando ver as coisas com um pouco de otimismo, Sergipe crê que o período que a filha ganhou sirva para que ela amadureça na modalidade e, assim, aumente suas chances de concretizar o sonho de levar uma medalha nos Jogos. Depois de ter sido campeã mundial e pan-americana, essa é a única vitória que falta em seu currículo. “A Bia estava muito embalada nas competições, lutando direto e se destacando com um ritmo bom. A pandemia atrapalhou um pouco, mas o trabalho continua aqui em casa. O importante é que ela está com a cabeça boa”, destaca o pai e técnico.
A dupla treina duas a três vezes por dia na intenção de manter o padrão dos treinos da seleção, apesar das dificuldades. “A seleção manda um treinamento direcionado para a parte física e fazemos aqui. O treino técnico não está tão leve, mas ela perde na musculação, por não termos os aparelhos. Também faz falta as pessoas para treinar combate”, comenta Sergipe.
Bia aproveita a atenção especial para aprimorar seu boxe na manopla e fazer correções, além, é claro, de matar a saudade do pai. “Já faz um tempo que a gente não conseguia treinar juntos. Quando eu vinha, era meu período de descanso. Mas agora até o estou incentivando a treinar, e ele está ficando afiado”, ela ri.
Treino e companheirismo
A gratidão toma Bia ao pensar no pai, que também dá força à atleta em meio ao momento vivido por todos. “Ainda bem que tenho meu pai. Ele compreende todas as dificuldades e o que estou sentindo melhor do que alguém que não é do esporte. Essa quarentena não foi tão fácil, tivemos que nos manter com a cabeça no lugar. Até porque venho há quatro anos treinando para os Jogos e eles foram adiados. Meu pai conversou comigo, me aconselhou e foi mais fácil conseguir pensar no que estava acontecendo. Não adiantava ter raiva, era necessário adiar a Olimpíada”, desabafa.
Em pequenos passos, de volta à normalidade
Agora, a expectativa da atleta está no embarque para Portugal, onde pode ficar entre 35 a 45 dias treinando. “Até a situação aqui melhorar, pois teoricamente lá está bem melhor que no Brasil. O Comitê Olímpico decidiu levar atletas de algumas modalidades para continuar o treino, até porque, se tudo der certo, ano que vem é olímpico e não podemos parar. Tudo está meio incerto ainda, pois conseguir sair do Brasil durante a pandemia é muito difícil”, destaca.
Enquanto isso, os atletas devem continuar se cuidando para evitar a contaminação pelo coronavírus. Se tudo der certo, Bia e os colegas devem retornar a São Paulo, onde farão exames e ficarão mais um tempo em isolamento, antes de viajar ao exterior.
“Independente de tudo isso que aconteceu, acho que todos os seres humanos tiram uma lição, aprendendo a dar mais valor ao que estamos passando. Estudamos sobre a gripe espanhola, mas pensávamos que com a tecnologia de hoje isso não iria ocorrer. Mas tudo pode acontecer de uma hora para a outra, não existe tecnologia que impeça, só existe o poder de Deus. Temos que ter fé de que tudo isso vai melhorar, nos cuidar e proteger o outro”, afirma.