“Às vezes deixo de fazer por mim, para fazer pelos outros”, resume a corredora Débora Cristina, de 54 anos. A atleta se destaca pelo talento na modalidade, com mais de 40 medalhas conquistadas, mas é reconhecida, principalmente, por sua generosidade em compartilhar conhecimento e paixão com outras esportistas. Através de suas aulas gratuitas, nas quais dedica parte de seu tempo para ensinar e motivar, a estudante de educação física se torna inspiração para muitas mulheres que desejam melhorar seu condicionamento físico e aprimorar suas habilidades na corrida.
Por sua história no esporte e por ajudar diversas mulheres, Débora Cristina é a terceira personagem da série “Qual é o seu Corre” em 2024. A cada prova que integra o Ranking de Corridas de Rua de Juiz de Fora, uma história de vida é contada, rodeada pela paixão à modalidade, bem como os esforços necessários para conciliar o esporte com outros afazeres do cotidiano. A corredora, inclusive, será uma das 1.800 atletas presentes na 7ª Corrida do Laboratório Cortês Villela, que acontece neste domingo (26), a partir das 8h, com largada na Via São Pedro.
Da bronquite aos 51 km
Natural de Cataguases, Débora conta que teve uma infância sofrida, porque tinha bronquite asmática. A doença fazia com que ela não conseguisse respirar direito. Aos 18 anos, quando decidiu começar a correr, ela passou a ter uma nova vida. “O esporte me trouxe a capacidade de respirar bem novamente. Foram vários desafios, diversas vezes que eu tinha vontade de parar de correr por não sustentar o meu próprio corpo. Mas não desisti, tudo isso me fez continuar, ter mais vontade, até me tornar uma atleta”.
Nessa época, a corredora, natural de Cataguases, morava em Manaus, devido ao trabalho de seu marido, militar. Em 2005, aos 35 anos, ela veio para Juiz de Fora, e, desde então, a modalidade ganhou ainda mais espaço em sua rotina. “O início foi muito difícil, mas, depois, com o passar do tempo, com dedicação, apoio e treinamento, subi aos pódios na cidade. Em 2015, fiquei entre as nove melhores na Corrida da Fogueira, que é muito competitiva. No Ranking de Corridas, já subi ao pódio várias vezes”, vibra a atleta.
Com 35 anos, Débora fez sua primeira maratona, de 42 quilômetros, em Curitiba. “Consegui em três horas e 55 minutos, um bom tempo. Depois que terminei, liguei de um orelhão para meu esposo. Ele tinha falado para eu não ir, por conta da preparação, que precisa ser intensa. Mas gosto de me desafiar. Disse para ele: ‘cheguei, estou bem. Sou maratonista, com muito orgulho e muito amor'”, comemora.
Já quando ia completar 51 anos, a mineira decidiu que comemoraria esse aniversário correndo. “A meta foi percorrer um quilômetro para cada ano completado. Chamei minhas amigas corredoras e na mesma hora elas toparam e me passaram segurança. Nesse dia, corremos 51 quilômetros, sendo que essas meninas nunca tinham corrido nem 21 quilômetros”, relata. “Nos reunimos 3h, em Santa Cruz, fizemos uma linda oração, e em cerca de 30 pessoas, chegamos a Lima Duarte. Foi um feito, lindo ver que conseguimos fazer algo assim”, fala Débora, ostentando um largo sorriso.
Com todos esses triunfos, ela costuma dizer para os conhecidos que “o tênis é o melhor remédio”, pois ajuda em todos os aspectos. “Os problemas acabam, o esporte não deixa você se sentir só, ninguém se isola, sempre está fazendo algo com alguém. Ajuda na ansiedade, é a maior estrutura”, reforça.
“Sou admirada por algo bom”
Durante cinco anos, Débora teve um grupo voluntário de corrida, em que liderou, ao todo, 128 mulheres. “Tinha uma com 115 quilos, que falava que não conseguia correr. Mas eu dizia que conseguiria, era só se dedicar, ter um sorriso no rosto e companheirismo, porque era de graça. Ela emagreceu e foi evoluindo. Nunca digo não para as alunas, mostro o caminho das pedras. Esses são os meus maiores prêmios, fazer com que as pessoas corram”.
Hoje, a corredora estuda educação física para aprimorar seus conhecimentos. A maratonista radicada em Juiz de Fora também dá aulas de crossfit. “Encontro três vezes na semana as atletas que encontram comigo, e duas delas já sobem no pódio. De mera atleta iniciante, hoje me tornei treinadora. Percebo que ajudo as pessoas a superarem os problemas dela, faço amizades e sou admirada por algo bom”, comenta a fundadora do grupo “Motivação”.
O trajeto comandado pela professora começa no Colégio Militar e vai até parte do Rio Paraibuna, totalizando de dez a 12 quilômetros. Além do fortalecimento no crossfit, Débora faz planilhas para as atletas, além de alertar para a importância da alimentação e suplementação. “O principal é a dedicação. Ninguém chega a lugar nenhum sem sacrifício. Por isso, a disciplina é muito importante, mesmo que se torna um prazer. Você muda a educação, a postura e o bem-estar”, enxerga.
“O maior prêmio é ganhar um abraço no final”
Débora acredita que uma situação em específico ilustra sua relação caridosa com as corridas. “Teve uma disputa em Juiz de Fora que faltou água, estava um calor enorme, e uma atleta ficou mal e desesperada. Peguei gelo, coloquei na mão dela e falei ‘chupa esse gelo, se não você não vai conseguir chegar, vai desmaiar, bota na boca.’ Reencontrei ela um ano depois, conversamos sobre corrida e ouvi dela ‘eu nunca vou esquecer o que uma moça fez para mim na corrida’. Eu perguntei o que, e ela disse o acontecimento. Falei que essa moça era eu, nos abraçamos, foi a coisa mais linda”, se orgulha.
Dessa forma, a professora de educação física entende que sua missão na vida é “abrir mão para os outros”, porque se sente bem se doando. “O maior prêmio é ganhar um abraço no final, marcar a vida da pessoa por ela conseguir algo que queria. Correr e ajudar são as minhas paixões. Espero estar inserida nesse meio até 80 anos, porque sem isso, me sinto um passarinho com as asas quebradas”, define.