Após 48 anos, Tupynambás e Tupi voltaram a se enfrentar em uma partida de Campeonato Mineiro. E a reportagem acompanhou os dois lados da arquibancada no Estádio Municipal Radialista Mário Helênio.
Torcida Tupi
Torcedores que foram assistir ao clássico Tu-Tu na noite desta quarta (23) enfrentaram filas, confusão e falta de ingressos. A situação foi flagrada pela reportagem na portaria do Dom Orione, local de entrada da torcida carijó. Vídeo feito pela estagiária da Tribuna, Roberta Heluey, mostra uma grande fila pouco antes das 20h. Por volta das 20h25, quase meia hora após o início da etapa inicial do jogo, a concentração de torcedores era grande. Neste momento, os ingressos naquele setor se esgotaram, provocando revolta entre os presentes. “Todo mundo saiu do serviço às sete horas e, quando chega, já não tem ingressos. É uma falta de respeito. Uma pouca vergonha”, afirmou um torcedor, que preferiu não se identificar.
Com o tumulto estabelecido na parte externa do Mário Helênio, a pressão dos torcedores surtiu efeito e os portões acabaram sendo abertos. Com isso, dezenas de torcedores adentraram o Municipal sem a devida revista e a conferência de ingressos. O vice-presidente de Futebol do Tupynambás, Cláudio Dias, confirmou a informação, mas disse que não sabe quem autorizou a entrada.
Estranheza
Uma sensação de estranheza tomava os carijós antes de a boa rolar no Mário Helênio. Acostumados a terem o estádio como casa, a perspectiva de acompanhar o jogo nas arquibancadas atrás de um dos gols do maior palco da cidade, os “visitantes” não escondiam o desconforto. “Muito triste. É estranho”, considerou o funcionário Vicente Emílio, 53 anos, que torcia por um grande jogo e apostava em um grande jogo. O sentimento era compartilhado por quase todos. “Tínhamos que estar no setor vermelho”, ponderou o aposentado Carlos Alberto Silva, 61, que, pela primeira vez acompanhava um clássico entre Tupi e Tupynambás ao lado de seu radinho de pilha.
Para o clássico, o Tupi montou um camarote vip no setor vermelho, oposto às cabines de rádio, para personalidades, políticos, patrocinadores e convidados em geral. Com isso, a torcida foi remanejada para o setor azul.
“É diferente. Estamos acostumados com a nossa casa. Mas, não será nada que vai mudar o comportamento da torcida. Vamos apoiar do mesmo jeito”, afirmou um jovem, enrolado à bandeira do Tupi. Diante da iminência do apito inicial, a própria reportagem se esqueceu de perguntar o nome do torcedor. Perdão, amigo. Porém, a profecia foi correta. Assim que a bola rolou, as arquibancadas do Tupi ecoaram, puxadas pelas organizadas. Cantos diversos animavam o local atrás do goleiro Villar. O silêncio veio momentos antes da cobrança de falta em que Geovani, aos 33 minutos,colocou no ângulo e abriu o placar para o Baeta. O silêncio, no entanto, foi sucedido por incentivo. “‘Vamo virar, Galô”, ecoou o lado alvinegro do Municipal.
Ânimo forte
A bola rolou no segundo tempo e, ainda que com o placar adverso, o ânimo não esmoreceu na arquibancada carijó. Puxado uma vez mais pelas organizadas, a torcida apoiava e tentava jogar junto. Aos 12, a expulsão de Lucas, do Baeta, elevou os gritos e a confiança. Uma vez mais, o “Vamo virar, Galô” era o canto que unia mais vozes.
A torcida reagia a cada tentativa do time dentro do campo. “Vai pra cima deles, Galô!” Vaias? Só nos momentos em que os atletas do Baeta tentavam ganhar tempo. No momento em que Ademilson, que fez história pelo Tupi, foi chamado para entrar em campo a torcida carijó levantou nas arquibancadas. Não para lembrar o eterno ídolo do título da Série D do Campeonato Brasileiro de 2011, mas para apoiar e, logo em seguida, lamentar grande chance perdida por Gabriel na pequena área do Baeta.
Mesmo com o Tupi mantendo a posse de bola, certo clima de tensão começou a percorrer a arquibancada carijó a partir do 30 minutos da etapa final. A torcida tentou, até o fim e foi o 12° jogador, mas os onze carijós em campo não corresponderam e a estada dos “visitantes” da noite no Municipal não foi das melhores com a derrota no Tu-Tu histórico.
Torcida Baeta
Enganam-se aqueles que, porventura, pensavam que gerações foram afastadas do Tupynambás. Dentre os que deram o tom da Torcida Jovem Baeta, crianças, adolescentes, adultos e idosos. Homens e mulheres. “O lê lê, o lá lá, o Baeta vem aí e o bicho vai pegar!”, cantavam. O setor verde, destinado à torcida rubra, foi preenchido em sua maioria. Ocuparam-no torcedores do Tupynambás e, também, curiosos que certamente assistiam ao clássico juiz-foranos pela primeira vez nesta quarta-feira (23).
O retorno do Baeta à elite do futebol mineiro levou ao Municipal torcedores desacostumados a prestigiar o futebol local. “Nunca tive tanto contato com o Tupynambás. Moro praticamente ao lado do clube, mas nunca tive relação. Mas, quando o meu pai convidou para vir, topei”, conta Laura Oliveira, 18 anos, devidamente trajada com a veste quadriculada utilizada pelos jogadores em campo. Foi o Tu-Tu apenas o segundo jogo da jovem no Municipal. Antes, assistira ao Botafogo, clube de coração. O pai, a quem se referiu, é Júlio César Marciano, 62. “Desde pequeno eu tenho uma relação com o Baeta. Joguei no clube nas categorias juvenil e júnior, na década de 1970, além de ter sido sócio”, relata Júlio César. “Depois, o futebol acabou e tive que partir. Alguns jogadores, inclusive eu, foram transferidos para o Tupi, mas não gostei. Voltei para o amador.” Uma vez Baeta, difícil ser Carijó.
Impaciente com alguns erros do Lucas Hipólito, a torcida do Tupynambás se impressionou com a imposição de Halisson. Houve quem o associasse a Dedé, do Cruzeiro, e, inclusive, a André Bahia, ex-Botafogo. “Dedé é bom pra caraca”, soltou um, se referindo, na verdade, a Halisson. “Dedé é muita categoria.” Aos 33 minutos, a torcida explodiu. Em falta frontal na entrada da área, Geovani, em finalização precisa, deixou o arqueiro adversário, Ricardo Vilar, imóvel. Baeta à frente. Houve quem perdesse o gol a postos para gravá-lo.
Contente ficou Joaquim Emiliano, 89, a poucos dias de completar 90. Laninho – apelido gravado em sua camiseta da Torcida Jovem Baeta – espera assistir a mais clássicos, uma vez que Tupi e Tupynambás não se enfrentaram, profissionalmente, nos últimos 48 anos. “Durante a ausência do Tupynambás do futebol profissional eu torcia pelo Tupi. Não pelo Tupi, mas pelo futebol de Juiz de Fora. O Tupi estava representando a cidade”, explica. “Se ganhava bem, se perdia, amém. Hoje, torço para o Baeta mesmo”, brinca.
De família também herdou a paixão Cláudia Castilho, 30. A primeira partida do Tupynambás na primeira divisão a que assiste é logo o Tu-Tu. “O meu pai foi vice-presidente do clube por muito tempo e a minha avó, que hoje já não está mais aqui, era apaixonada pelo Baeta. Fiquei emocionada ao chegar na arquibancada e ver que o Baeta ainda tem muitos torcedores”, diz. O pai é o tímido Rogério Esteves e, a avó, Dona Iolanda. “É uma paixão que não tem explicação”, resume. Assim como Laura, Cláudia é, também, do Poço Rico; passou os 90 minutos no meio da Torcida Jovem Baeta, da qual é integrante. A organizada só não gostou da expulsão de Hipólito, aos 13 do segundo tempo.
A torcida rubra voltou a se animar quando Felipe Surian gritou Ademilson, em aquecimento, para aumentar o drama do setor azul, onde localizava-se os torcedores do Tupi; o ídolo carijó teve o nome entoado pelos fãs do Baeta aos 25 minutos da segunda etapa. Apesar de não marcar, o maior artilheiro da história do Mário Helênio teve tempo de dar chapéu em Marcus Vinícius. Como se não bastasse, o nove do Tupi ainda foi mandado embora mais cedo, aos 44, depois de carrinho impedindo contra-ataque. No retorno do clássico juiz-forano à elite, o Baeta deixou para trás o Tupi. 1 a 0 no marcador.