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30 anos do Tetra: juiz-foranos relembram clima da Copa e relação da torcida com a Seleção

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No dia 17 de julho de 1994, Seleção Brasileira conquistava pela quarta vez a Copa do Mundo (Foto: Agência Brasil)

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Há 30 anos, as ruas do Brasil paravam para comemorar a conquista do tetracampeonato da Copa do Mundo, realizada nos Estados Unidos. No dia 17 de julho de 1994, a Seleção Brasileira comandada pelo técnico Carlos Alberto Parreira encerrou um jejum de 24 anos sem títulos e reforçou a alcunha de “país do futebol” no cenário futebolístico global. Liderada por jogadores como Romário, Bebeto, Dunga e Taffarel, a Seleção venceu a Itália em uma emblemática disputa de pênaltis, com o erro decisivo de Roberto Baggio – após o empate em 0 a 0 no tempo normal -, para alvoroço e festejo dos torcedores, que também celebraram em Juiz de Fora.

No dia de comemoração das três décadas da conquista, a reportagem buscou em seus arquivos matérias da época para rememorar a desconfiança dos brasileiros com a Seleção antes da Copa. Além disso, o editor-geral da Tribuna, Paulo César Magella, que cobriu a Copa de 1994 pela Rádio Solar AM, e alguns jogadores do Manchester – união de Tupi, Tupynambás e Sport e único time de futebol de Juiz de Fora à época – relembram o contexto em que aquela competição ocorreu.

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No dia 17 de julho de 1994, Seleção Brasileira conquistava pela quarta vez a Copa do Mundo (Foto: Estadão Conteúdo)

Da desesperança à expectativa com a Seleção

Conforme conta o jornalista Paulo César Magella, os brasileiros não se encantavam com o ciclo da Seleção de 1994, e nem depositavam muita esperança, principalmente, devido aos insucessos nos mundiais de 1982, 1986 e 1990. “Somente na fase final das Eliminatórias, quando o Brasil fez dois jogos emblemáticos no Maracanã (vitórias contra Chile e Uruguai, em que Magella estava transmitindo do estádio), Bebeto e Romário mostraram para Zagallo e Parreira que eles eram os donos da camisa. Ali começamos a pensar que teríamos chance”.

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Ao encontro da visão do jornalista, estão os arquivos da Tribuna do dia anterior à estreia na Copa. Neles, é possível entender que os jogadores da Seleção estavam empenhados na possível conquista e a reação dos brasileiros, mesmo que não se sentissem tão pressionados.

“O clima e a tranquilidade que cerca a concentração brasileira no Hotel Villa Felice, em Los Gatos, contrasta com a ansiedade que domina os jogadores e a comissão técnica da Seleção às vésperas da partida de estreia na Copa do Mundo contra a Rússia. O sinal mais evidente da preocupação está nas reuniões diárias do grupo dos evangélicos, cada vez mais concorridas, e no interesse dos jogadores de assistir aos vídeos com jogos do adversário”, diz o periódico. Taffarel, por exemplo, voltava seu pensamento para Deus. “A gente encontra a paz no Senhor e suporta com mais naturalidade os momentos que antecedem essa partida”.

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"Aumenta a ansiedade da estreia", relata a Tribuna na véspera da Copa (Foto: Arquivo/TM)

Depois das vitórias contra a Rússia e Camarões, por 2 a 0 e 3 a 0, respectivamente, o Brasil empatou por 1 a 1 na última partida da fase de grupos e terminou a fase inicial em primeiro lugar da chave B, com sete pontos. Nas oitavas de final, triunfo por 1 a 0 contra os Estados Unidos. Nas quartas, a vitória por 3 a 2 contra a forte Holanda despertou ainda mais a ideia de que o título poderia vir.

“Foi quando pensamos que daria. Os jogadores estavam entrosados, Branco, Romário e Bebeto faziam grande Copa. O Márcio Santos, o Aldair, dois jogadores que as pessoas não levavam muita fé, também estavam muito bem”, relembra Paulo César.

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Já nas semis, o Brasil ganhou mais uma, contra a Suécia. A final foi com a tão badalada Itália de Roberto Baggio. “Foi um jogo imprevisível, com bola na trave, goleiro beijando ela por não entrar. E o Baggio batendo aquele pênalti para fora, uma lambança para eles e a glória para nós. Foi muito gratificante, porque estávamos em um jejum de 24 anos, desde 1970, sem vencer a Copa. Foi emblemático, era uma Seleção que o pessoal não tinha uma grande paixão. Muita gente diz que o Brasil não era a melhor equipe, até lembram mais de 1970 e 2002”, analisa o editor da Tribuna.

Futebol local era marcado por fusão de times

Em Juiz de Fora, no ano de 1994, Tupi, Sport e Tupynambás se uniram e formaram o Manchester, que, na primeira temporada, conquistou o acesso para a elite mineira. Roninho, autor do primeiro gol oficial da história do clube, hoje com 53 anos, tinha admiração por Raí, porque jogou no São Paulo nos juniores em 1989 e conheceu o jogador pessoalmente.

“A competição foi emocionante do começo ao fim, mas o jogo da final, especialmente nos pênaltis, ficou marcado para sempre na minha memória. Foi muito importante, mesmo porque dois anos depois saí do Brasil para jogar. Futebolisticamente falando, aonde eu chegava a conquista do título era motivo de conversa, nos respeitavam muito por isso. Estava na memória de todos e persistiu por muito tempo”, elogia. “Lembro das ruas pintadas de verde e amarelo, cheias de bandeirinhas por todos os bairros e no Centro da cidade. Era basicamente aquela esperança que tínhamos de sermos campeões novamente depois de muitos anos”, fala o atacante.

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Já o meio-campista Merica rememora que o acesso conquistado pelo Manchester aconteceu antes da Copa. “Ficou tudo maravilhoso, era só alegria em Juiz de Fora. Com os jogadores, o papo era se o Romário ia decidir. O que mais me marcou foi o gol de falta de Branco (contra a Holanda). Para falar a verdade, gostei mais de ter subido com o Manchester, mas ver o Brasil campeão também foi maravilhoso”.

Também meio-campista, Waltencir Cândido fala que, apesar da torcida, enxergava um pouco de desconfiança dos juiz-foranos. “A Seleção sempre foi motivo de questionamento sobre o jogar bonito. Mas via ruas, praças, casas e bares enfeitados. Nós, jogadores, sempre conversávamos sobre a Seleção, acreditando que independentemente das mais diversas opiniões, desejávamos o tetra para o nosso país. Lembro da união que a Seleção tinha, todos sabiam do seu valor e se doavam ao extremo para que Romário e Bebeto fossem os protagonistas aos olhos do povo. Como nasci em 1971, só tinha visto os títulos de 58, 62 e 70 nos documentários. A comemoração foi intensa, digna de uma conquista mundial”.

Waltencir, à época no Tupi, com Bebeto, um dos craques do Tetra (Foto: Arquivo pessoal)

“Romários”

Grande craque da Copa de 1994, Romário conquistou o coração dos brasileiros. Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na década de 70, apenas 2.095 pessoas foram registradas com esse nome. Já na década de 90, com a conquista do tetra, o número aumentou mais de 18 vezes: 39.740 “Romários” foram registrados. Em 2000, o número voltou a diminuir para 3601.

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Em Juiz de Fora, uma história curiosa foi registrada pela Tribuna de Minas: um casal decidiu batizar os filhos com os nomes dos atacantes campeões mundiais. “Na madrugada que antecedeu à conquista do tetracampeonato mundial de futebol, Bebeto e Romário foram homenageados na Maternidade Therezinha de Jesus. A doméstica Juraci Teodoro de Andrade aumentou de quatro para seis os seus filhos com o marido José Adair de Souza, motorista desempregado. Eles moram na rua Vieira Pena, 585, no Mundo Novo”, conta o periódico.

Atual momento da Seleção

Para Paulo César Magella, a atual desesperança dos torcedores na Seleção Brasileira é reflexo de uma cultura do país. “Aqui, o segundo colocado é o primeiro dos últimos. Um país que tem cinco títulos mundiais, tem a cultura de vencer. Quando a Seleção tropeça, já ficamos com pé atrás, desanimamos. Em 58, fomos desacreditados, em 2014, também. O brasileiro está acostumado, depois de 70, a ser o rei do futebol. Mas tínhamos uma geração de Pelé, Garrincha, Gerson, Tostão. Acostumamos com isso, com vários ganhando bola de ouro depois, com Ronaldo, Rivaldo, Kaká. Hoje, não temos isso, no máximo o Vinicius Júnior. Isso reflete no nosso inconsciente coletivo, ficamos refluídos com a Copa”, pondera.

Outro ponto que, na visão do editor, é crucial para a descrença é a falta de aproximação entre torcedores e jogadores. “Conhecemos pouco deles, muitos estão na Europa. Em 1994, vários jogavam no Brasil, e em 2002, muitos também já tinham jogado. Hoje, eles saem cedo e você não tem a menor ideia de onde começou a carreira. Há distanciamento físico. Mas somos um polo gerador de grandes jogadores. Temos que nos atualizar, ficamos presos ao passado. As seleções se reinventam, um exemplo é a Argentina, que agora ganhou Copa do Mundo e Copa América”.

*Sob supervisão do editor Gabriel Silva

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