Rebeca Andrade, da ginástica, Bia Souza, do judô, Rayssa Leal e Augusto Akio, do skate, e o futebol feminino, além de outras modalidades, trouxeram orgulho para os brasileiros nas Olimpíadas de Paris. Seja nas apresentações ou na hora de subir no pódio, não faltaram vibrações e comemorações. Entretanto, mesmo poucos dias após o fim da maior competição esportiva do mundo, o assunto já aparece menos em roda de conversas ou nas redes sociais.
Para entender se as medalhas nesses esportes trouxeram maior procura pela prática dos esportes em Juiz de Fora, a Tribuna conversou com três locais que oferecem as modalidades. Eles foram unânimes em dizer que, por enquanto, a procura não aumentou, apesar da importância das Olimpíadas para a ampliação do cenário. No entanto, apontam que mais crianças têm se interessado mais pelas modalidades e visto, nos atletas brasileiros, pessoas em quem se espelhar.
Nesse sentido, os professores relataram sobre quais são as principais dificuldades para fortalecer o vínculo da nova geração com o mundo esportivo e como atuam na tentativa de aproximar as crianças dos esportes.
Skate
No projeto social chamado Instituto Amargen, localizado no Bairro Dom Bosco, o skate é praticado por 23 alunos. Conforme conta a fundadora e diretora, Lívia Sant’anna, muitas crianças gostam do esporte, apesar das dificuldades. “Existe um grande interesse, e com mais recursos e espaço, poderíamos atender ainda mais jovens. Muitas vezes, as pessoas não procuram o projeto por falta de conhecimento ou devido à percepção de que o skate é perigoso e inacessível. Em Juiz de Fora, existem algumas pistas e locais de prática, mas nem sempre estão em condições ideais, como a do Dom Bosco. O acesso a equipamentos básicos também pode ser uma barreira para muitos. Oferecemos um espaço e materiais seguros e de qualidade em que essas crianças e jovens possam praticar de forma segura e orientada. O tênis, muitas vezes, precisamos ofertar, e contamos com a ajuda e a sensibilidade do pessoal da New Stone, que sempre contribui e torna possível”.
Apesar do engajamento nas redes sociais e pela torcida pelos brasileiros em Paris, até o momento, as Olimpíadas não fizeram com que mais pessoas buscassem o esporte no Amargen. Apesar disso, Lívia acredita que pode haver impacto positivo. “Mas acredito que a visibilidade que o esporte ganhou pode atrair novos praticantes e possíveis patrocinadores para os atletas. Isso pode se traduzir em mais oportunidades para expandir o projeto e alcançar ainda mais jovens. Foi extremamente motivador para os alunos verem as performances olímpicas, agora eles querem se dedicar mais na modalidade.”
Lívia destaca ainda que o projeto proporciona outras oportunidades, para além do esporte. “Aqui, trabalhamos com pessoas de comunidades em situação de vulnerabilidade, proporcionando aulas e treinos semanais. O projeto é caracterizado por um ambiente de respeito e parceria, onde os alunos não apenas aprendem a andar de skate, mas também desenvolvem habilidades sociais, autoconfiança e resiliência”, reforça Lívia.
Para alavancar o cenário na cidade, a diretora atenta para o investimento em pistas mais adequadas e campanhas de conscientização. “Além disso, o poder público e parcerias com empresas locais seriam fundamentais para viabilizar mais projetos sociais e garantir que o skate se torne acessível para todos, independentemente da situação econômica”.
Ginástica artística
Também no Instituto Amargen, a ginástica pode ser praticada pelos alunos. Atualmente, são 28, sem mais vagas disponíveis, devido à dificuldade de recursos e espaço. “Em Juiz de Fora, ainda é uma modalidade em desenvolvimento. Embora existam iniciativas e clubes que promovem a prática, o acesso ainda é muito limitado para crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social. Nosso instituto tem trabalhado para preencher essa lacuna, proporcionando oportunidades para que esses jovens possam experimentar e se desenvolver na ginástica artística, e isso está sendo possível em uma parceria com o Centro de Ginástica”, explica Lívia.
Mesmo que o número de interessados não tenha aumentado após as Olimpíadas, o efeito da competição é observado no dia a dia. “O sucesso na ginástica foi uma enorme fonte de inspiração e representatividade para nossos alunos. Tem sido um assunto bastante comentado entre os alunos desde o retorno das férias. A representatividade em ver outro semelhante, negro, de projeto social, foi mágico e estimulador. Muitos expressaram o desejo de um dia representar o país em competições, e esse sonho tem alimentado o compromisso e a dedicação deles nos treinos”.
No intuito de aumentar a prática na cidade, Lívia entende que seria fundamental investir em mais espaços adequados, capacitar novos profissionais, aumentar a divulgação e o acesso ao esporte nas escolas e comunidades. “A ginástica artística no Brasil tem crescido significativamente nos últimos anos, especialmente com os resultados expressivos de atletas brasileiros em competições internacionais. Contudo, ainda enfrentamos desafios em termos de acesso e desenvolvimento de talentos em todo o território nacional, especialmente em regiões menos favorecidas. O apoio à base, com projetos sociais e escolas, é crucial para continuar expandindo esse crescimento e descobrir novos talentos”.
Judô
O projeto social “Dojô Pousada Mendonça”, do Bairro Granjas Bethânia, atende cerca de 50 crianças na iniciação esportiva e mais 11 com o fator esportivo – com participações em campeonatos estaduais, por exemplo. Conforme um dos membros da fundação, Gileanes Rodrigues, o cenário no município é positivo. “Nos últimos anos, tomou novas proporções, com significância esportiva e educativa. Iniciamos um processo a partir do nosso projeto indo para as escolas municipais. Assim, muitos que não tinham acesso à atividade tomaram por gosto. Hoje, o judô vem colhendo os frutos da boa ventura de senseis mais antigos e também dos novos, que estão multiplicando a atividade”.
Em contrapartida ao grande número de participantes do judô na cidade, está a estagnação do interesse, mesmo sendo o esporte que mais trouxe medalhas olímpicas para o Brasil. “Não tivemos procuras expressivas, mas esperamos que esse sucesso rompa barreiras e fomente a prática. Estamos sempre atentos, absorvendo as novas regras. Os heróis estão na televisão, mas os sonhos começam na atitude de projetos e criação de oportunidades”, salienta Gileanes.
Da mesma maneira que em outros esportes, o apoio público é o segredo para que mais crianças deixem as ruas para viver de esportes. “O judô é sempre procurado pela filosofia e construção da mentalidade na forma de viver, com honra e glórias para a vida, além de ser uma prática saudável de atividade física. Falta incentivo dos órgãos públicos e reais oportunidades de fomentar a prática na cidade. Poderiam ampliar a modalidade nas escolas públicas e aumentar os profissionais qualificados para a condução da atividade”.
Futebol feminino
Na escolinha do PSG Academy, no Bairro Aeroporto, o futebol feminino é ofertado. De acordo com a treinadora Carol Castro, a modalidade cresce a cada dia. “Há mais possibilidades para nós, mulheres, com os investimentos. Ainda que seja muito pouco comparado ao futebol masculino, acredito que a tendência é que cresça cada dia mais. Até porque, dia a dia, mais e mais meninas vêm se interessando em fazer parte desse esporte, e em Juiz de Fora, não é diferente. Cresci tendo que jogar em turmas mistas com meninos, e hoje, posso ser treinadora de turmas exclusivamente femininas. Isso faz brilhar os olhos e ressalta a evolução. É um acompanhamento do que acontece a passos curtos no nosso país, mas acredito que vamos ocupar lugares enormes ainda”, projeta.
Técnica das categorias sub-11, sub-13, sub-15 e sub-17 femininas, Carol vê que, em breve, as Olimpíadas resultarão em uma procura ainda maior pelo esporte. “Com o Brasil chegando novamente à final da Olimpíada, depois de 16 anos, a nova geração se inspira novamente, criando novas ídolas, assim como Marta, Cristiane e Formiga eram para mim quando mais nova. Quanto mais mulheres estão no esporte, mais outras querem estar. E esse ciclo vai aumentando”.
O que ainda falta de forma geral em Juiz de Fora, segundo a professora, são mais lugares com turmas só de mulheres. “Os pais e responsáveis ainda sentem uma certa restrição em colocar as meninas junto aos meninos para jogar. Quando encontram equipes exclusivas femininas, sentem segurança para tal prática”, pontua.