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‘Precisamos colocar a cara a tapa’: mulheres relatam dificuldades no futebol local

Mulheres no futebol de JF foto arquivo pessoal
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“Falavam que lugar de mulher não era dentro de campo, mas sim na cozinha”. Essa é apenas uma das frases que a atleta de futebol juiz-forana Laylla da Silva, de 21 anos, precisou ouvir durante sua trajetória no esporte mais popular do planeta. “Quando começo a trabalhar em novos lugares, ainda há um julgamento inicial por eu ser mulher”, revela a treinadora Karina Pazzi, 26, também de Juiz de Fora. Apesar dos avanços nos últimos anos, como a obrigatoriedade dos clubes da Série A do Campeonato Brasileiro masculino terem uma equipe feminina, e os da Série B, C e D necessitarem de estruturar o futebol das mulheres até 2027, o preconceito continua latente, também no esporte local. No Dia Internacional da Mulher, nesta quarta-feira (8), a Tribuna entrevistou as duas mulheres com trajetórias de persistência e resiliência na modalidade em JF, as quais atentam acerca da necessidade da presença feminina no ambiente futebolístico e do fim dos julgamentos.

Julgamento de outros pais

Laylla da Silva, moradora do Bairro Santa Cecília, Zona Sul, iniciou no futebol com apenas sete anos com apoio da mãe, que também já praticou o esporte. Durante a infância, seu tio passava horas na busca de lhe ensinar a dar os primeiros toques e chutes na bola. Aos poucos, começou a se apaixonar no futebol, até que decidiu se matricular na equipe do São Bernardo, onde chegava mais cedo para treinar com meninos, antes da atividade feminina. Na mesma tônica, passou também pelo Esporte Clube Benfica, e só foi jogar exclusivamente com mulheres no Alphabiquense. “Quando eu era mais nova, escutava pessoas dizendo como a minha mãe poderia ter a coragem de deixar eu jogar bola no meio de vários meninos. Passei por episódios de preconceito, ainda mais por ser mulher com cabelo curto. Falavam que lugar de mulher não era dentro de campo, mas sim na cozinha”, revela.

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Laylla, segunda da esquerda para a direita: ‘Cada dia mais eu treino, trabalho e estudo’ (Foto: Arquivo pessoal)

Apesar de dizer que sempre foi respeitada pelos companheiros de equipe e treinadores, Laylla entende que não haveria a necessidade de ter que treinar com homens se houvesse mais visibilidade para as meninas da cidade. “Não temos apoio e nem recursos. Em Juiz De Fora temos muitas atletas boas, que sonham em serem grandes jogadoras. Mas falta um olhar sem preconceito para se enxergar que o futebol também pode ser praticado pelas mulheres. Não deveria ser por pura questão de se ganhar um título importante”, opina a atacante.

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Além de equipes juiz-foranas, Laylla, que também atua como volante, já disputou o Campeonato Paranaense feminino pelo Foz do Iguaçu. Na oportunidade, pôde jogar contra clubes reconhecidos no cenário nacional, como Athletico-PR e Coritiba. No momento, ela treina com os garotos do Bonsucesso, de Juiz de Fora. “O que eu tenho feito para conquistar meu sonho de ser profissional é lutar e acreditar que um dia eu consigo. Cada dia mais eu treino, trabalho e estudo. Nós, mulheres que amam o futebol, lutamos todos os dias para ter visibilidade”, afirma.

Perguntada sobre qual recado daria para outras garotas juiz-foranas que também querem seguir carreira esportiva, Layla aconselha que “continuem na luta, pois acredito que sonhos podem se realizar quando você se esforça. Tudo que é feito com amor, com vontade e disciplina, terá resultados. Nunca desistam ou abaixem a cabeça por conta de comentários desnecessários da sociedade”.

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‘Precisamos mostrar o que sabemos’

Karina Pazzi considera que fez parte da última geração que começou a amar o futebol jogando nas ruas. Ela conta que, ainda quando criança, pedia bolas de presente ao invés de boneca e roupas, como suas amigas. Quando tinha dez, foi treinar pela primeira vez, na escolinha do Tupi. Disputou Jogos Escolares e Copa Prefeitura Bahamas pelo seu colégio, o Central, até ser chamada para ir ao Patrus, onde conheceu uma das mulheres que se tornaram inspiração na futura profissão, também apaixonada pelo esporte.”Ainda na escola eu já pensava em fazer educação física por causa da minha professora, a Ana Lúcia, que me ajudou a jogar os Jogos Escolares de Minas Gerais (JEMG) e a Copa Bahamas”.

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Logo após finalizar o Ensino Médio, a jovem ingressou na Faculdade de Educação Física da UFJF. Em 2018, começou a fazer estágio no projeto de futebol feminino do local. “Lá, deu o estalo de que eu queria mesmo ser treinadora e ajudar as meninas nessa modalidade que sou apaixonada. Comecei a estudar, ir atrás do conhecimento, fiquei até me formar”, conta. Ao mesmo tempo, Karina comandava a Atlética da Faculdade de Comunicação, sua primeira experiência com pessoas adultas.

Após se formar na faculdade, a treinadora se transferiu para o Sport Club, onde no momento é responsável pelas categorias sub-7 e sub-9 no futsal e é auxiliar no sub-15 e sub-17 no campo, ambos no masculino. “São esportes que ainda não são ditos femininos. Ainda existe preconceito, quando começo a trabalhar em novos lugares, continua ocorrendo um julgamento inicial por eu ser mulher. Mas depois consigo ganhar os pais e os alunos. O preconceito sempre vem do adulto, a criança não tem. Você mostrando que sabe o que está fazendo, por exemplo, ao dizer a fase de desenvolvimento do filho ou filha para os pais, vai criando um laço e eles começam a ter confiança”, explica.

Pelo preconceito, Karina afirma precisar provar a capacidade em cada início de trabalho (Foto: Arquivo pessoal)

Também treinadora do futebol feminino da Atlética da Faefid e do masculino de Ciências Exatas, Karina entende que o conhecimento é o maior aliado contra os julgamentos. “Onde estou, tanto com pequenos quanto com os grandes, confiam no que estou fazendo. Busco ser uma treinadora diferente, porque a prática do futebol ajuda, mas o mais relevante é se capacitar para desenvolver um bom trabalho”, compreende. Entretanto, ela reconhece que precisou provar o seu valor. “As mulheres do futebol precisam mostrar que sabem o que estão fazendo, enquanto o homem, não. Eles podem entrar no futebol, e só depois vão ser questionados sobre o que estão fazendo. É cultural, está enraizado, mas precisar mudar. Mulher pode dar um treino bom ou ruim, assim como o homem. Não devemos olhar o gênero, mas a capacidade dele se desenvolver com aquela modalidade, categoria e atletas”, acredita.

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Para que outras mulheres possam fazer parte do futebol, Karina vê a necessidade de enfrentamento. “Se existe uma mulher que está lá dentro, vai se plantando sementes. Todas que querem trabalhar com o futsal e o futebol, precisam colocar a cara a tapa. Aos poucos, vamos mudando a visão, por isso nunca podemos deixar de correr atrás, se é um sonho, o que queremos para a vida, precisamos nos capacitar. Se existe um objetivo, não podemos deixar pessoas de fora atrapalharem. Sempre será mais complicado para as mulheres, mas lá na frente vamos ver o quanto evoluímos. Se fazemos com paixão e amor, tudo dá certo”.

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