Ícone do site Tribuna de Minas

Gol tirado por massagista do Aparecidense contra o Tupi completa 10 anos

esquerdinha1 principal by leo costa editada

Massagista, que estava posicionado ao lado da baliza, impediu gol da classificação do Galo (Foto: Leonardo Costa/Arquivo TM)

esquerdinha1-by-leo-costa
<
>
(Foto: Leonardo Costa)
PUBLICIDADE

“Tenho até hoje na memória. O Silvio (zagueiro) pega a bola no meio-campo, lança na área, e o Wesley (ponta) divide com o zagueiro da Aparecidense. A bola sobra para o Ademilson, próximo ao gol. Quando ele chuta, o massagista entra e tira. Eu, próximo, vou para o rebote e chuto, e o massagista tira de novo. Vou tentar dividir e ele consegue afastar. Todo mundo se olhou, ninguém entendeu nada. Pulei a placa e todos fomos atrás dele”. É assim que Henrique, ex-lateral do Tupi, recorda-se de um dos momentos mais marcantes da história do futebol juiz-forano – e um dos maiores curiosos do esporte brasileiro. 

Em um sábado, no dia 7 de setembro de 2013, há exatos dez anos, Tupi e Aparecidense se enfrentavam pelas oitavas de final da Série D do Campeonato Brasileiro, no Estádio Municipal Radialista Mário Helênio. No primeiro jogo, na casa do time goiano, empate em 1 a 1. Já em Juiz de Fora, a partida estava 2 a 2, resultado que classificava a Aparecidense para as quartas pelo critério de gols fora de casa. 

PUBLICIDADE

Mas, aos 44 minutos do segundo tempo, Ademilson, um dos maiores ídolos da história carijó, se aproveitou de uma bola sobrada na área e finalizou, vencendo o goleiro adversário. Entretanto, o que ninguém esperava aconteceu: o massagista da Aparecidense, Romildo Fonseca da Silva, o “Esquerdinha”, entrou em campo e impediu que a bola entrasse. Como se não bastasse, no rebote, Henrique, como conta, chutou mais duas vezes, e o massagista tirou o gol nas duas tentativas.

PUBLICIDADE

Logo em seguida, Esquerdinha pegou as garrafas de água que carregava e correu em direção ao vestiário. Os jogadores do Tupi foram atrás dele, tentando acertá-lo com pontapés e empurrões, mas sem sucesso. O jogo recomeçou após 20 minutos de paralisação – enquanto o massagista se escondia, de acordo com relatos, dentro de um caixote. Conforme Ademilson conta à Tribuna dez anos após o acontecimento, o Tupi precisou retornar à partida, já que era a única opção plausível. “O juiz nos falou que se não voltássemos para o campo, a vitória seria deles. Mas não tivemos a mesma pegada, todo mundo estava chateado com a situação. Os diretores ficaram revoltados”, relembra. 

Na oportunidade, o Alvinegro de Santa Terezinha foi escalado com Victor Souza, Henrique, Silvio, Rafael e Fabricio (Magnum); Maicon, Nubio Flávio e Genalvo (Wesley); Adriano (Dwann), Michel e Ademilson. O comandante foi o auxiliar técnico Júlio Cirico, já que o treinador, Felipe Surian, estava suspenso.

PUBLICIDADE

Ao final do duelo, o resultado de 2 a 2 daria a classificação à Aparecidense. Mas, segundo Henrique, os jogadores sabiam que, posteriormente, o Tupi seria declarado vencedor do jogo e, consequentemente, garantiria o avanço para as quartas de final. “No vestiário, a gente até ria, porque sabíamos que indo para o Tribunal sairíamos classificados. Recebemos vários telefones, passou até no Fantástico”, recorda o lateral. 

O preparador físico à época, Luis Augusto Alvim, reforça a confiança que dominava o pós-jogo. “O jogo ficou um bom tempo parado, com gente chorando. Queríamos que já desse o gol dentro de campo, mas o árbitro explicou para a gente a regra e o jogo seguiu. Ao final, acreditávamos na Justiça, ainda mais que o lance rodou o Brasil e o mundo inteiro”, diz o preparador.

PUBLICIDADE

Para ajudar no caso, três dias depois, em 10 de setembro, o Tupi anunciou que o então advogado do Fluminense, Mário Bittencourt, representaria o Carijó no tribunal. Já no dia 16, o caso foi julgado pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), e a Aparecidense foi excluída da competição. O massagista foi punido com suspensão de 24 jogos, além de uma multa de R$ 500, levando em conta o artigo 205 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD): “impedir o prosseguimento de partida, prova ou equivalente que estiver disputando, por insuficiência numérica intencional de seus atletas ou por qualquer outra forma”. O árbitro do confronto, Arílson Bispo da Anunciação, foi absolvido.

No entanto, a Procuradoria do STJD, em nome de Paulo Schimitt, entendeu que a Aparecidense devia ser julgada por outro artigo. No dia 26 de setembro, o STJD acatou o pedido de Schimitt e o clube goiano foi incluído no artigo 243-A (atuar, de forma contrária à ética desportiva, com o fim de influenciar o resultado de partida, prova ou equivalente). A multa e a suspensão de Esquerdinha se mantiveram.

Com isso, o Tupi foi declarado vitorioso e se classificou para as quartas da Série D. “Quando soubemos que tínhamos ganhado, foi o sentimento de dever cumprido. Ficamos muito felizes, a alegria voltou aos treinos, tínhamos um foco e uma união muito grande”, fala Ademilson. Já o preparador físico reforça que “não podíamos ser eliminados dessa forma, seria a maior injustiça do futebol”. 

PUBLICIDADE

Classificado, o clube enfrentou o Mixto-MT na fase seguinte, quando empatou por 1 a 1 fora de casa e venceu por 3 a 2 em Juiz de Fora, garantindo o acesso para a Série C. Nas semis, já com a cabeça na Terceira Divisão nacional, o Carijó foi eliminado pelo Juventude após perder por 4 a 0 no Sul e por 1 a 0 no Estádio Municipal.

“Eu dizia a mim mesmo o que era aquilo, como que podia ter acontecido”, diz Henrique.

Jogadores reconstituem lance após dez anos

Alguns dias antes de completar dez anos do jogo em que o massagista entrou em campo, a Tribuna reuniu, na segunda-feira (4), o lateral Henrique e o preparador físico Luis Augusto no Estádio Municipal, e os posicionou no mesmo local em que cada um estava na hora do acontecimento.

“Estava ajudando no aquecimento dos atletas, atrás do outro gol. Na hora, não entendi muito bem. De longe, só vi aquela confusão, um tumulto, um bate rebate e a bola não entrando, e, de repente, todo mundo correndo para o vestiário dos caras. Só saí correndo também, dei um tiro, e, quando chego, os jogadores já estavam atropelando, dando pontapés”, rememora o preparador. “Eles estavam com sangue quente, nosso grupo era muito vibrante, queria sempre o resultado. Passei para eles que não adiantava tentar bater, que a polícia resolveria. Foi a forma de acalmá-los”, menciona Luís.

PUBLICIDADE

Henrique, além de descrever o lance, lembra que Ademilson foi um dos maiores incentivadores para, após o lance, o time continuar aguerrido. “Ele falou para continuarmos, que iríamos fazer o gol nos minutos que faltavam. Mas, em cada lance, voltava a cena na cabeça. Eu dizia a mim mesmo o que era aquilo, como que podia ter acontecido”. 

Por não estar em Juiz de Fora, Ademilson contou por telefone como viu o fato. “Quando a bola sobrou para mim, eu chutei tirando do goleiro e já sai para o abraço, comemorando com os torcedores. Estava indo direto para o banco, mas vi os companheiros passando direto. Não entendi o que aconteceu, aí olhei para trás. Vi o massagista tirando o gol do Henrique e pegando as garrafinhas dele para correr. Todos partimos para cima, deu um tumulto danado, mas graças a Deus ninguém conseguiu pegar ele e não aconteceu nada pior. Mas, no momento, não tinha como ter outra atitude, valia classificação e envolvia o trabalho de um ano todo”, justifica o ídolo Carijó.

“Foi uma atitude infeliz, mas tem a emoção”, afirma Luis Augusto.

Caso se tornou folclórico

Ademilson, Henrique e Luís concordam que o jogo, antes mesmo de acontecer, já tinha uma atmosfera diferente. “Tínhamos condições totais de passar pela Aparecidense, estávamos muito confiantes e contando com o apoio da torcida”, relata o atacante. O lateral diz que todos estavam se ajudando, e que “os torcedores estavam fervorosos, ajudando bastante”. Olhando pelo lado de fora, o preparador entende que “havia muita tensão devido à importância de subir naquele ano”, mas que a confiança estava alta pela intensa união do grupo.

Dessa forma, atualmente, o assunto é visto com leveza, já que o Tupi avançou de fase após o julgamento no STJD. “É um dos momentos mais inesquecíveis meus no clube”, afirma Henrique, que não encontrou o massagista após o ocorrido. Ademilson define que na hora do lance, a situação foi complicada, mas que “ganhou moral” com o intenso compartilhamento. “Quem não me conhecia, passou a conhecer. O pessoal fala disso até hoje. É só risada”, garante. 

Ao contrário dos jogadores, Luís Augusto encontrou Esquerdinha em Goiânia (GO) uma vez. “Cumprimentei ele numa boa. Foi uma atitude infeliz, mas tem a emoção. Ele era um cara criado no clube, foi questão de momento, apesar de ser da forma errada. Acredito que ele tenha se arrependido porque manchou a imagem dele e do clube”, enxerga. “Hoje, vejo a história de forma engraçada. Até sacaneamos o Henrique, perguntando como ele perdeu o gol com o massagista sentado e ainda não conseguiu pegar o Esquerdinha na velocidade. Marcou muito a gente e o clube, nunca vamos esquecer dessa história”, frisa o preparador.

Sair da versão mobile