Que o ciclismo é um dos esportes mais praticados de Juiz de Fora e região, não é novidade. Assim como o crescimento da prática ao ar livre durante a pandemia, fato reforçado por comerciantes locais à Tribuna em matéria no ano passado e pela Associação Brasileira do Setor de Bicicletas, já em extensão ao âmbito nacional, que confirmou média de 34% de aumento nas vendas das bikes em comparação ao mesmo período de 2020. No entanto, as aventuras pelas trilhas da Zona da Mata demandam programação e cuidados para que não ocorram episódios como o vivenciado por um ciclista de 65 anos que se perdeu no alto da Serra do Cruz, entre os municípios de Olaria e Bom Jardim, durante um pedal, no domingo (27), e acabou encontrado com vida na quarta-feira (2).
Diante disto, a reportagem colheu relatos e conselhos de atletas e associações locais para os ciclistas, independentemente da experiência na modalidade, possam realizar suas atividades com mais segurança e diminuam os riscos de imprevistos e acidentes. Conforme os especialistas da Associação Juiz-forana de Ciclismo (AJFCiclismo), do grupo JF Cicloturismo, da União dos Ciclistas de Juiz de Fora e Região (Unicicli) e da multicampeã Roberta Stopa, atleta com passagem pela seleção brasileira, os cuidados devem partir em cada detalhe da programação, que deve ser esmiuçada em aspectos como a escolha da bike e de seus acessórios até a comunicação com pessoas próximas das regiões de destino à natural atenção aos pontos de referência de cada trajeto.
Conforme destaca a presidente da AJFCiclismo, Giovanna Rezende, ainda é comum exemplos como o de Marcus. “Já me perdi e também conheço amigos que passaram por isso. Mas foi em viagem de cicloturismo e por pouco tempo. Mas existem algumas medidas que tomamos como preventivas para evitar se perder de lugarejos ou pontos de apoio, ou até mesmo dos colegas de passeio”, contextualiza.
Idealizador do projeto JF Cicloturismo, Marcello Fernandes também já passou por uma situação similar. “Eu e mais uma ciclista, em um domingo à tarde, fomos a uma cachoeira na qual a rota conhecida por nós foi fechada pela proprietária de um sítio no local. Resolvemos nos aventurar e entrar em uma trilha desconhecida e de mata fechada, com muitos obstáculos e usada por amantes do motocross. Estava tudo indo bem quando percebemos que não chegávamos em lugar nenhum. O cansaço e a preocupação por estar entardecendo foram batendo. Mas conseguimos nos orientar e sair dali bem, juntos sem nos separar hora nenhuma. Depois, verificando o Strava (aplicativo), vimos que estávamos andando em circulos em meio à mata”, recorda.
A primeira recomendação é a de buscar companhia para os pedais, como destaca Marcello. “Imprevistos podem acontecer e é bom ter cautela. Sempre vá com outra pessoa ou em grupo. Desse modo, um pode ajudar o outro em caso de emergências. Além disso, é importante avisar pessoas próximas sobre o percurso que fará e o tempo que levará para isso”, reitera. A necessidade de comunicação é evidenciada também por Cida Oliveira, presidente da Unicicli. “Você sempre deve deixar avisado em casa ou para amigos quais as trilhas e regiões que pretende ir, principalmente quando se tratar de novas aventuras.” Giovanna diz, ainda, que a AJFCiclismo “sempre aconselha que o grupo que for sair para pedalar junto, nunca se separe. A menos que seja necessário chamar socorro.”
Pesquise informações sobre o local de destino
Ainda antes de voltar as atenções aos equipamentos e à bike, é importante buscar o maior número de informações que for possível sobre o trajeto completo e até mesmo características de terreno e da região. “Dê preferência em conhecer as trilhas e os percursos. Caso não saiba, procure pedalar com colegas que conheçam as áreas”, relata Cida.
“As pessoas precisam conhecer melhor a trilha que pretendem fazer. É importante para saber o que poderá encontrar pelo caminho e não ter surpresas desagradáveis. Procure estudar o tipo de terreno, qual é a distância a ser percorrida, a altimetria, o nível técnico do trajeto, e até mesmo a previsão climática para o dia. Assim estará preparado o suficiente para encarar o desafio”, destrincha Marcello, que além de ciclista, também é turismólogo e guia de turismo.
‘Não é uma dica, mas uma obrigação’
“Adquira equipamentos de proteção e tenha uma bike confortável e adequada. Não é apenas uma dica, é uma obrigação! Os equipamentos de segurança jamais devem ser deixados de lado. Acessórios devem ser de uso pessoal”, prioriza Marcello, em tema abordado de forma unânime pelos especialistas. “A bike precisa estar adequada e com a manutenção em dia”, reforça Cida.
Entre os equipamentos necessários e citados pelos representantes da JF Cicloturismo e da Unicicli, e por Giovanna, da AJFCiclismo, estão o capacete, óculos escuros próprios da prática da modalidade, luvas para absorver impactos e vibrações, sapatos que resistam aos possíveis tombos e roupas com itens reflexivos e luzes sinalizadoras nas partes dianteira e traseira da bike. “Todos esses equipamentos são essenciais, pois a sua segurança vem em primeiro lugar e assim estará mais protegido”, garante Marcello.
“Leve sempre pequenas ferramentas e aprenda a fazer reparos básicos na bike, como colar câmaras de ar e emendar a corrente”, pontua Cida, em ideia reforçada por Marcello. “Acessórios úteis são indispensáveis, mesmo que não precise utilizá-los. Alguns exemplos são ferramentas como chave allen, chave de corrente e um kit para fazer consertos. Leve o celular carregado, caso você precise entrar em contato com alguém ou utilizar o GPS.”
Alimentação e hidratação
“Se for passeio longo, levar farol, água e alimentos – principalmente barras de proteínas -, sempre a mais”, lembra Giovanna. Este é outro ponto pacífico: a necessidade de uma alimentação leve, mas que permita o desenvolvimento do pedal ao longo de todo o trajeto com a reposição das energias. “A alimentação e a hidratação são pontos importantes antes, durante e depois. Pedalar consome bastante energia, por isso é importante repor as calorias gastas com barras de proteínas, chocolate, carboidratos e, claro, muita água. Bebidas isotônicas também são boas opções para manter a reposição de sais minerais. Mas a água é a principal e não deve faltar. Observe também se na rota há estabelecimentos para realizar paradas. Depois da trilha, continue se hidratando e se alimentando bem para que tenha uma boa recuperação”, recomenda Marcello.
Dentro deste tema, Cida alerta também para a adequação das atividades às capacidades atléticas de cada um. “Respeite seus limites e condições físicas. Essas dicas podem orientar um iniciante como ou um colega que pedala por mais tempo.”
Nas trilhas
Durante o pedal, os ciclistas também devem se atentar a alguns pontos para evitar se perderem ou até mesmo se distanciarem dos amigos, como explica Giovanna. “Procure sempre visualizar pontos de referências. Se porventura se separar das pessoas, esses pontos serão importantes para sua referência de localização; em bifurcações e ou estando em dúvida do caminho a seguir, sempre busque informações com moradores locais. E nunca siga em dúvida por muitos quilômetros, distante de pontos de informações.”
Stopa recomenda trilhas conhecidas, companhia e GPS
Atleta profissional e especialista em modalidades como mountain bike, Roberta Stopa conhece como poucos o esporte e as trilhas da região. À Tribuna, a especialista, que já representou a seleção brasileira e foi bronze no Pan-Americano de cross country olímpico em 2011, 2012 e 2014, entre suas conquistas internacionais, conta priorizar, até hoje, espaços já conhecidos. “Nunca me perdi porque sempre fui em trilhas que já tinha conhecimento, já demarcadas. Mas já ouvi relatos de alguns atletas terem se perdido, mas que conseguiram retornar pelo mesmo caminho, com trilhas marcadas. Mas não é algo comum em nosso mundo. Como profissionais, sempre usamos e usufruímos de trilhas já estipuladas para os treinos”, conta.
Neste sentido caminham também as dicas da atleta. “Aconselho sempre andarem nesses lugares conhecidos e demarcados, além, é claro, de estarem acompanhados por mais ciclistas ou aparelhos GPS, que temos muitos e de fácil acesso hoje, tanto para quem está na trilha quanto para quem está em casa”, relata. “No caso do ciclista que se perdeu na última semana foi diferente porque ele estava desbravando trilhas novas em um percurso que não existe e que ele queria inovar para seus passeios”, complementa.
Ainda segundo Stopa, não faltam opções, atualmente, para que os ciclistas se cerquem ao máximo dos cuidados nas atividades. “Hoje temos muitas ferramentas para que possamos pedalar com segurança.”
Como Marcello destacou, “na prática de esportes como o ciclismo é necessário tomar cuidados para reduzir alguns riscos. Por isso, por mais que você tenha medo, é preciso encará-lo para viver boas experiências. A segurança é um aspecto fundamental e as dicas de como fazer uma trilha de bike são de extrema importância para ficar longe dos perigos.”