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Cemig atrasa fornecimento e dá prejuízo a clientes

ivan queiroz proprietario de um predio em fase de conclusao adiou campanha de lancamento olavo prazeres16 09 15

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Ivan Queiroz, proprietário de um prédio em fase de conclusão, adiou campanha de lançamento (OLAVO PRAZERES/16-09-15)
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Ivan Queiroz, proprietário de um prédio em fase de conclusão, adiou campanha de lançamento (OLAVO PRAZERES/16-09-15)

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Priscila teve que montar espaço de beleza em outra área por falta de energia em sala do shopping (LEONARDO COSTA/15-09-15)

A demora e o descumprimento contratual para o fornecimento de energia pela Cemig têm deixado muitos empreendimentos de Juiz de Fora às escuras. Sem luz, prédios ‘fantasmas’ chamam atenção no cenário da cidade, um problema que coloca em xeque a capacidade de atendimento da companhia. Mesmo quando há a participação financeira do consumidor, quando a maior parte do custo das obras necessárias para a implantação ou ampliação de nova rede é financiada pelo empreendedor, o cliente amarga de seis meses a um ano de espera pela ligação definitiva de energia. Há casos em que a contrapartida de quase R$ 600 mil foi paga à companhia, e a obra necessária para o atendimento não foi entregue. Alguns consumidores somam prejuízos superiores a R$ 1 milhão e, pior, se veem desamparados pela legislação que regula o setor.

De acordo com a resolução normativa mais recente da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que passará a vigorar em 2016, só há prazo máximo para a conclusão das obras de atendimento – previsto em 120 dias no total – quando tratar-se de rede de distribuição aérea de tensão primária com dimensão de até um quilômetro. Fora isso, a distribuidora pode realizar a execução de acordo com o “seu cronograma”, restando ao cliente aceitar e esperar. Pior: o descumprimento dos prazos regulamentares, quando existem, tem punição branda para as companhias que se veem obrigadas apenas a “calcular crédito ao consumidor em sua fatura de energia elétrica”. Na última quinta-feira, a concessionária admitiu acumular cerca de 33 mil obras com prazos de execução vencidos, o que representa 65% do total solicitado no estado até o final de 2014.

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O empresário Marco Antônio Scapim Cunha, um dos proprietários do novo shopping de rua localizado no Bairro Paineiras, conta ter dado entrada no projeto elétrico na Cemig em outubro do ano passado. Diante da necessidade de modificação na rede de distribuição de energia, a concessionária apresentou um orçamento de R$ 788.500. Deste montante, R$ 565.821 ficaram a cargo do empreendedor, a título de participação financeira do cliente. O prazo de execução previsto foi de 180 dias. Passados 218 dias, o shopping continua às escuras.

O dono da empresa responsável pelas locações no shopping, Anderson Silveira Soares, contabiliza prejuízo superior a R$ 1 milhão. “Nós estávamos com o empreendimento todo viabilizado, com a maior parte das lojas, salas e estacionamento alugada por pessoas que correram para garantir o ponto. No entanto, a morosidade da luz resultou em vários distratos. Estou há 27 anos no ramo imobiliário, e é primeira vez que vejo uma situação tão grave como essa”, revela.

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Travessia de rede

Segundo a Cemig, a obra do shopping ainda depende de aprovação pela MRS do processo de travessia da rede de energia elétrica sobre a linha férrea, que se encontra em andamento. A concessionária diz que o cliente ainda precisa acabar de construir a câmara subterrânea para instalação, pela Cemig, de dois transformadores de 500kVA, “indispensáveis para o início do fornecimento de energia no empreendimento.” O proprietário do empreendimento contesta a informação e confirma que o espaço para a instalação dos transformadores nos moldes exigidos pela Cemig já está pronto. Scapim também ratifica o fato de já ter quitado todas as parcelas estabelecidas pela concessionária a título de participação financeira do cliente.

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Campanha para prédio de 12 andares é adiada

A insegurança quanto ao cumprimento de datas pela Cemig levou o empresário Ivan Assunção Queiroz a adiar a campanha de lançamento do prédio de 12 andares em fase de conclusão na Avenida Itamar Franco. O prazo para o fornecimento de energia – 240 dias no total – vence no dia 20 de outubro, mas por receio de atraso no calendário da concessionária o construtor prefere não anunciar a venda dos 18 apartamentos.

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Para viabilizar a construção do prédio, o empresário precisou pedir energia emprestada do edifício ao lado do seu e passou a arcar com a conta de luz do vizinho. “É um absurdo, porque a gente gera emprego, faz um investimento grande, paga todos os impostos para, no final, ter que ficar implorando luz. Isso nos leva a pensar que, para fazer novos investimentos na cidade, teremos que verificar primeiro se a Cemig tem capacidade de atendê-los”, desabafa Ivan. O sócio dele, Eduardo Ribeiro Ferreira, concorda. “Tudo isso é muito preocupante, pois como lançar novos projetos correndo o risco de não ter carga para o empreendimento pronto? Quem vai se responsabilizar por isso?”, questiona.

O sócio da Larivoir Engenharia Igor Fonseca Larivoir afirmou que a Cemig levou mais de 300 dias para fazer a ligação de energia no novo empreendimento, o prédio Rossi 360, localizado ao lado do Independência Shopping. O prazo de quase um ano estipulado pela concessionária foi o mais extenso já exigido entre as cerca de quatro mil unidades entregues na cidade pelo grupo. “Como no passado a demora da Cemig impactou na entrega de um de nossos prédios, desta vez, fizemos o pedido junto à concessionária com muita antecedência”, revela.

De acordo com a assessoria de imprensa da Cemig, em relação a Avem Empreendimentos Ltda (Rossi), o atraso na conclusão das obras ocorreu em função da necessidade de aquisição de dois transformadores de 500kVA _ classe 25kV, transformador específico para a rede de Juiz de Fora. Dessa forma, foi necessária licitação específica para compra pela Cemig. “A remessa de transformadores de 500kVA _ classe 25kV, no entanto, apresentou problemas, pois algumas unidades foram reprovadas nos testes de recepção dos equipamentos e devolvidas ao fabricante, o que atrasou a conclusão das obras”, afirmou a concessionária.

Já a Aneel informou que para acessantes cujo o montante de uso do sistema de distribuição seja igual ou superior a três megawatts, a solicitação de acesso deve ser formalizada com antecedência mínima de 12 meses da data de entrada em operação do empreendimento.

Demora leva à rescisão de contrato de aluguel

O empresário Álvaro Tavares Schiavon é um dos afetados pelo problema. No final do ano passado, ele alugou o estacionamento com 197 vagas no novo shopping de rua do Bairro Paineiras. Investiu mais de R$ 200 mil entre a compra de cancelas eletrônicas, pintura do espaço, cabeamento, fiação e mão de obra, mas ainda não conseguiu, até hoje, operar o negócio, que continua sem luz, embora o prazo da distribuidora tenha vencido no mês passado. “O pior é que não há definição de quando a situação será resolvida”, comenta Álvaro, que se viu obrigado a levar para casa as duas cancelas de entrada e saída que comprou para o estacionamento.

Lázaro da Silva Miranda, 34, que havia alugado uma das lojas do shopping para expandir um pequeno negócio de material de construção iniciado há dez anos no Bairro Grama, também soma prejuízos. Todo o capital que ele e o pai conseguiram juntar na última década foi investido em material para a abertura do novo endereço. Como não houve energia, ele realizou o distrato do aluguel e agora não sabe o que fazer com todo o estoque adquirido.

A fisioterapeuta Priscila Dutra das Neves perdeu parte do dinheiro que economizou para a abertura de um espaço de beleza no shopping. Em setembro do ano passado, ela contratou arquiteta, comprou móveis e aparelhos para a área. Hoje, no entanto, um ano depois, reforma um novo lugar, já que o local anterior continua sem luz. “Não tive verba para pagar novamente por um arquiteto para o meu novo espaço. Jamais imaginei que aconteceria isso. Me mudei no final do ano passado de Barra do Piraí para cá na expectativa de começar meu negócio. Agora estou lutando para concluir a reforma do Espaço Mandala”, diz.

Por pouco, a incerteza quanto ao fornecimento de energia no novo shopping não inviabilizou também o funcionamento do supermercado de 900 metros quadrados que conta com cerca de 70 funcionários. Segundo Leandro Pereira, que trabalha no supermercado na função de comprador, foi necessário alugar dois geradores industriais por 60 dias, para garantir o funcionamento dos 24 freezers da loja e de todo o negócio. “Se não tivéssemos inaugurado com o gerador, estaríamos fechados até hoje”, comenta. Somente no final de semana passado é que a Cemig conseguiu instalar um padrão provisório para o supermercado, que vinha sendo alvo de várias reclamações da comunidade por conta do barulho causado pelos geradores.

Cemig quer zerar déficit até 2017

Desde o ano passado, a Cemig GT, subsidiária da Cemig, se viu às voltas com a Justiça para garantir, através de mandado de segurança, o controle temporário de sua principal usina, a São Simão, cuja concessão expirou em janeiro de 2015, segundo informações do próprio site da companhia. Em junho deste ano, o Superior Tribunal de Justiça indeferiu o pedido, aumentando as especulações no mercado sobre uma provável perda da capacidade da Cemig de produzir energia e, consequentemente, o risco de encolhimento na geração de receita. No dia 15 de setembro, porém, o Ministério de Minas e Energia autorizou a Cemig Geração e Transmissão S.A a continuar operando a hidrelétrica de São Simão.

Situada na divisa de Minas Gerais com Goiás, a hidrelétrica é considerada a maior usina da concessionária. Apesar disso, o órgão ministerial informou à Tribuna que o leilão de 29 concessões de geração, organizadas em cinco lotes, tem 14 concessões que eram de titularidade da Cemig, entre elas Carmargos, Marmelos e Três Marias. Segundo a companhia, não há impacto na capacidade de atendimento dos clientes da Cemig Distribuição, uma vez que a energia fornecida é adquirida nos leilões realizados pela Aneel.

Ainda este mês, a revista “Época Negócios” noticiou que o valor de mercado da estatal mineira atingiu o mais baixo patamar desde 2005. A companhia, que valia mais de R$ 30 bilhões três anos atrás, hoje está avaliada em menos de R$ 10 bilhões, em função das pressões causadas pela possibilidade de perder o controle de algumas de suas principais usinas hidrelétricas. “O viés político que passou a contaminar a trajetória das ações desde antes das eleições do ano passado e a ainda delicada situação do setor elétrico nacional também contribuíram para a avaliação menos favorável da companhia”, informou o periódico.

A Cemig informou que investiu R$ 575 milhões na expansão e melhoria das redes de distribuição de energia elétrica de Minas Gerais só no primeiro semestre deste ano. O valor, segundo a companhia, corresponde a 46% do total previsto de R$ 1,24 bilhão para o atendimento aos oito milhões de consumidores.

Obras pendentes

Na última quinta-feira, a concessionária admitiu ter acumuladas cerca de 33 mil obras com prazos de execução vencidos, o que representa 65% do total de obras solicitadas até o final de 2014. Entre os projetos não executados, cerca de 32 mil envolvem a realização de serviços em áreas rurais do estado – 1.500 somente no Alto Jequitinhonha. Segundo o presidente da concessionária, Mauro Borges Lemos, o número não é exorbitante em se tratando de uma empresa do porte da Cemig com mais de oito milhões de consumidores, mas merece atenção. “Precisamos executar com prioridade, por exemplo, as ligações de energia elétrica de unidades de abastecimento de água, expansões de hospitais e postos de saúde, além das ligações de instituições de ensino.” Borges reafirmou o compromisso com a conclusão do total de obras solicitadas e não executadas até o ano passado e disse que serão feitos todos os esforços para zerar o déficit de obras atrasadas na área de concessão da empresa até o final de 2017.

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