Entre 2019 e 2020, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registrou que, no país, mais de 400 mil pessoas com 50 anos ou mais enfrentavam a triste realidade do desemprego, o equivalente a 7% da população brasileira à época. Ainda de acordo com o levantamento do mesmo instituto em 2022, a população idosa cresceu 57,4% em 12 anos. O visível envelhecimento da população traz impactos para a vida em sociedade, e uma delas tem reflexo direto no mercado de trabalho. Com o aumento do número de pessoas que chegam a essa etapa da vida ativas e com saúde, há a necessidade de permanecerem empregadas, inseridas nos diferentes postos de trabalho. No entanto, o atual mercado também apresenta mudanças acentuadas em relação ao momento em que muitos desses profissionais começaram suas carreiras e parece privilegiar pessoas mais jovens no momento de contratação. Diante desse cenário, são muitos os desafios para se conseguir uma contratação nesta fase da vida.
Com 61 anos, Rosana Lima, que mora em Juiz de Fora, fazia parte da estatística de pessoas desempregadas. “Estava com muita dificuldade de arrumar emprego devido à minha idade”, conta. Ela tinha experiências anteriores em escritórios de cobrança e contabilidade, mas explica que, mesmo assim, demorou a ser chamada para alguma das vagas as quais concorria. Apesar de ter procurado diversas oportunidades e ter recorrido a processos seletivos variados, foi em um mutirão de empregos, voltado especialmente para este público, que conseguiu a sua recolocação, agora como operadora de caixa. “As pessoas mais velhas têm mais responsabilidade com o horário, com o trabalho e com o que estão fazendo. A experiência traz isso”, defende.
Levando em conta que os avanços médicos e tecnológicos apontam que o envelhecimento da população tende a aumentar, ainda mais, nos próximos anos, a psicóloga Gleice Vellozo destaca que é preciso alocar essas pessoas em vagas de trabalho, até mesmo para que não fiquem excluídas da vida em sociedade. Um dos entraves para se conseguir isso, no entanto, é o etarismo – conceito que diz respeito ao preconceito contra pessoas devido à sua idade. “O mercado de trabalho é desigual, não oferece as mesmas oportunidades. O preconceito etário, em todos os processos seletivos, ainda existe. Temos mais pessoas mais velhas no mercado de trabalho, o que muda esse panorama, mas, no geral, a desinformação e o preconceito são muito grandes”, afirma. Apesar de existir a percepção, na sociedade, de que a idade está associada a experiência e sabedoria, na prática, as pessoas acima de 50 anos são tratadas de forma diferente, reconhece. “A pessoa mais velha é sinônimo de frágil e sem autonomia. Essa é uma realidade que vivemos em relação ao preconceito social do etarismo. Apesar de ser muito presente no cotidiano, não afeta só o financeiro, há também um impacto emocional”, revela.
Sobre a dificuldade de colocação no mercado, a economista e professora de Master in Business Administration da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Carla Beni, afirma que se trata de uma realidade que exige preparo. “É um país que já inverteu a sua pirâmide populacional, e nós não observamos políticas públicas para essa população, que hoje, com 60 anos, continua ativa. Dos 50 pra frente, as pessoas ainda são muito ativas, mas começam a ter dificuldades sérias de continuarem empregadas e de se recolocarem no mercado de trabalho”, destaca. Os impactos são ainda maiores quando afetam a possibilidade de contribuição para a aposentadoria ou mesmo quando não há planejamento financeiro para este momento da vida.
Para Carla Beni, é importante notar, como Rosana também destaca, que há vantagens na contratação dessa população, principalmente quando os empregadores mesclam uma equipe com pessoas de diferentes idades para somar qualidades de cada tempo de vida. Nesse sentido, destaca inclusive que, para as mulheres, que tradicionalmente são preteridas no mercado de trabalho e até enfrentam problemas para equidade salarial, esse período pode ser vantajoso. “Acima dos 50, as mulheres já têm estabilidade. Elas já tiveram ou não seus filhos, já determinaram seu núcleo familiar. Elas já têm sua definição de estrutura familiar. Então, nesse ponto, elas representam uma vantagem para o empregador”, diz.
Reflexos na saúde mental
O desemprego pode provocar sérias consequências na saúde mental. “A gente já tem uma sociedade que tenta ao máximo excluir a pessoa idosa, e quando ela não consegue se manter neste âmbito social e no mercado de trabalho, isso é grave”, explica a psicóloga Gleice. Ela destaca que a falta de trabalho pode gerar nessa população impactos emocionais importantes, como o rebaixamento da autoestima, o desânimo, o mau humor, a insegurança e até mesmo a depressão. “Não é só do emprego que ocorre a exclusão, mas do cotidiano da família e da comunidade. A partir do momento em que a pessoa não tem mais aquela relação laborativa, muita coisa se perde. Isso faz com que o idoso fique isolado, o que gera um grande sentimento de solidão”, diz.
Necessidade de atualização
Nos últimos 20 anos, é notável como as rotinas de trabalho foram afetadas pela chegada de novas tecnologias. Por isso, também existe a necessidade de os indivíduos desempregados, nessa faixa etária, atualizarem seus conhecimentos, como destaca Carla. “O mais importante é a busca constante por aperfeiçoamento.” Nesse sentido, ela destaca o conceito de educação continuada, que “consiste em fazer cursos e atualizações” dentro da área de mercado. “Existem vários cursos que são gratuitos e on-line. Além disso, Prefeituras e entidades oferecem cursos gratuitos também, assim como palestras e webnar”, indica.
Novas possibilidades
Esse momento da vida também pode levar, como Carla destaca, a novas possibilidades dentro do mercado de trabalho. “Essas pessoas fazem realmente um balanço da vida. Podem decidir se desejam começar algo novo, por exemplo. É importante entender que a vida de fato pode começar depois dos 50”, diz. Além de procurar possibilidades dentro da própria área de atuação, a especialista entende que esse também é o momento em que se pode considerar começar um negócio novo, empreender ou estudar algo diferente. “Dessa forma, é possível recuperar algum sonho que tenha deixado pra trás.”
Para se preparar para isso, Gleice indica que é importante tentar constantemente se atualizar, avaliar a situação sem ideias excessivamente negativas sobre ela, tentar ser o mais realista possível e pensar nos pontos positivos desse momento. “Além disso, valorizar as suas qualidades individuais e não deixar sentimentos ruins tomarem conta neste momento. As dificuldades fazem parte de todo processo, ninguém pode supor que é o único a passar por isso. O mais importante é ficar perto das pessoas que fazem bem e não se isolar”, diz.
Município prevê mutirão para esse público
A Tribuna solicitou informações da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) sobre a empregabilidade de pessoas acima de 50 anos. Em relação às possibilidades oferecidas nos mutirões, o posicionamento é que as ações realizadas pela Prefeitura são abertas a toda a população de Juiz de Fora e que os candidatos têm a oportunidade de entregar seus currículos diretamente aos responsáveis pelo setor de Recursos Humanos das empresas, sem intermediação ou reserva de vagas.
Ainda segundo o Município, todo o processo de seleção desses candidatos é realizado pelas empresas participantes. Além disso, também foi destacado que, desde o ano passado, a PJF tem realizado edições de mutirões para públicos específicos, como mulheres e pessoas com deficiência, além de travestis, pessoas transgêneras binárias e não binárias. “Outros mutirões temáticos, inclusive para o público com mais de 60 anos, estão no planejamento para 2024”, afirmou, por nota.