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Juros subindo

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Em época de forte apelo ao consumo e incentivo às compras – em função da liberação do 13º salário e da proximidade das festas de final de ano -, o consumidor é convidado a gastar menos e poupar mais. A alta da taxa básica de juros, a Selic, para 11,25% ao ano, depois de seis meses de manutenção em 11%, surpreendeu economistas e já começa a encarecer o crédito, os financiamentos e as compras parceladas.

Para ajudar a entender como o aperto monetário afeta o juiz-forano, um grupo de especialistas analisa os impactos concretos da alta de juros na vida do consumidor, que vão desde pagar a mais pela compra parcelada no cartão de crédito ao menor crescimento da economia, com redução na geração de emprego e renda. E, se vale o alerta, este é considerado apenas o início de um novo ciclo de reajustes, que deve culminar em taxas próximas a 12% ao ano, maior percentual verificado nos últimos três anos.

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“Os efeitos das altas da Selic na economia são sempre muito perversos, porque levam um tempo para acontecer, não aparecem imediatamente no mês da alta”, alerta a coordenadora executiva do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Patrícia Pelatieri. Ela comenta que, hoje, os consumidores estão sentindo o impacto dos aumentos realizados no início do ano (ver quadro). Na época, avalia, a economia começava a dar sinais de leve recuperação. Em função das altas, porém, manteve-se praticamente estagnada nos últimos meses, afirma. “Se concretizar o novo ciclo de altas, o temor é que a economia, de fato, pare.” A projeção do mercado é de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) em 0,20% este ano. Em 2013, a alta foi de 2,3%, conforme o IBGE.

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A insegurança em relação ao mercado de trabalho e o risco de perda do emprego são algumas das consequências concretas já sentidas pela população. Conforme Patrícia, alguns setores produtivos mais sensíveis aos movimentos econômicos já começaram a lançar mão de férias coletivas, Programas de Demissão Voluntária (PDVs) e demissões propriamente ditas. “Em uma economia que não cresce e que apresenta muita desigualdade no mercado de trabalho, o trabalhador, em algum momento, começa a sentir os efeitos na forma de desemprego.”

Em setembro, a taxa de desocupação ficou em 4,9% no país, conforme o IBGE. O tempo médio para recolocação subiu de 5,4 meses em 2013 para 6,1 meses este ano, conforme pesquisa divulgada esta semana pela Catho. Em Juiz de Fora, o saldo de 348 empregos formais no acumulado do ano até outubro é, pelo menos, cinco vezes menor ante o do mesmo período do ano passado (1.949), atesta o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

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A coordenadora do Dieese critica o aumento da Selic como o único instrumento utilizado para controlar a inflação, que, no seu entender, não é de demanda (provocada pelo descompasso entre consumo e produção) e, por isso, não será ajustada com a tentativa de encarecer o crédito e frear o consumo. Para ela, há outros elementos, como alimentos, commodities e preços administrados (como combustível e energia elétrica), que pressionam a inflação e não respondem aos juros. “Comprime-se a inflação às custas da paralisação da economia e do desemprego.” Estudo desenvolvido pela LCA Consultores, a pedido do Broadcast, serviço de notícias da Agência Estado, aponta que o novo ciclo de alta de juros do Banco Central (BC), estimado em um ponto percentual, poderá desempregar cem mil pessoas ao longo de um ano e meio.

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Curva ascendente
O professor de Economia do Ibmec, em Belo Horizonte, Reinaldo Nogueira, discorda. Para ele, a inflação é de demanda. Na sua opinião, com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) alto – 6,6% nos últimos 12 meses contra o centro da meta de 4,5% e teto de 6,5% – a Selic é considerada a principal medida para contornar o cenário no curto prazo. A expectativa do mercado, comenta, é de que a taxa de juros continue subindo neste final de ano e primeiro semestre de 2015 até chegar a, aproximadamente, 12%. Na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para o início de dezembro, a sinalização é que a Selic chegue a 11,50%, conforme Relatório de Mercado Focus BC. “O objetivo é esfriar o consumo. Assim, as empresas não terão alternativa a não ser começar a reduzir preços.” Para o professor, no entanto, desestimular os gastos não basta, é preciso também fomentar a produção.
Estímulo à poupança e compras à vista
Se os impactos negativos já são tangíveis, os positivos só serão percebidos a médio prazo, quando a inflação começar a cair, avalia o economista Guilherme Ventura, professor do Centro de Ensino Superior (CES/JF) e coordenador do curso Executive MBA Gestão Empresarial. Por enquanto, diz, os juiz-foranos já começam a pagar mais juros em financiamentos e compras parceladas. “O aumento de juros também estimula as compras à vista e a poupança por parte das famílias, ampliando as aplicações financeiras.” Conforme o economista, os investimentos bancários vinculados à taxa tornam-se mais rentáveis, as dívidas bancárias pós-fixadas tendem a ficar mais oneradas, e os novos empréstimos passam a contar com taxas mais altas.

Na avaliação do professor do Departamento de Economia da UFJF, Wilson Luiz Rotatori Corrêa, coordenador de Macroeconomia da Consultoria e Mercados Consultoria Jr (CMCjr), o encarecimento do crédito é a principal percepção do consumidor no dia a dia. Outro efeito direto é a maior dificuldade para tomar dinheiro emprestado, já que, com a perspectiva de alta, os bancos tornam-se mais seletivos na concessão. Se a contratação de crédito é inevitável, torna-se imprescindível comparar as condições oferecidas pelas instituições, em busca das menores taxas, e reduzir o nível de endividamento, poupando mais e comprando menos, orienta.

Para Ventura, enquanto a inflação não estiver na convergência para o centro da meta, é necessária uma política monetária “mais apertada” em busca da estabilização de preços. O economista considera, no entanto, que o final do ano é um período delicado, caracterizado pelo aumento do consumo e pela pressão inflacionária de itens, como reajuste de preços administrados (só a gasolina subiu 3% e o diesel, 5% na semana passada), expansão do crédito subsidiado e déficit público. No seu entendimento, a Selic é um instrumento “clássico” do qual o Banco Central não pode abrir mão no combate à inflação, mas outras estratégias também são importantes, como reequilíbrio das finanças públicas e do balanço de pagamentos do país. O economista acredita que as elevações da Selic podem, de fato, contribuir para trazer a inflação para o centro da meta. “Naturalmente, o resultado pode demorar ainda mais se as outras pressões continuarem a acontecer.”

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Apesar dos esforços de inserção da inflação na meta, ela já começa 2015 pressionada. Dentre os fatores que podem impulsioná-la no final de 2014 e início do próximo ano, Rotatori destaca o repasse das tarifas de energia e do aumento do petróleo para os preços de bens e serviços, previsto para acontecer ainda este ano. O professor também cita a recente pressão exercida pela desvalorização cambial, já que diversos produtos têm seus preços indexados aos do mercado externo. “A elevação da Selic pode ajudar a conter essa pressão, mas seria necessária a retomada da capacidade de poupança pelo Governo e uma política de oferta de crédito mais coerente com a necessidade de conter a alta dos preços.” Para ele, também é preciso retomar a confiança em relação ao BC e ao Regime de Metas de Inflação, para que o processo torne-se menos custoso, e o controle da inflação, mais veloz.

Juro médio para pessoa física deve chegar a 6,12%

Antes mesmo do aumento da Selic para 11,25%, as taxas de juros das operações de crédito voltaram a subir. O resultado de outubro, que não considera a alta anunciada no dia 29, aponta que das seis linhas de crédito pesquisadas, uma se manteve estável (cartão de crédito rotativo) e cinco tiveram as taxas elevadas: juros do comércio, cheque especial, CDC – financiamento de automóveis, empréstimo pessoal junto a bancos e financeiras. Os dados foram mapeados pela Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).

Conforme a Anefac, a taxa de juros média para pessoa física passou de 6,06% ao mês – 102,59% ao ano – em setembro para 6,08% – 103,05% ao ano – em outubro. Para a pessoa jurídica, o aumento foi de 3,43% ao mês – 49,89% ao ano – em setembro para 3,44% – 50,06% ao ano – no mês passado. Em ambos os casos, são as maiores taxas verificadas desde agosto.

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Pelas contas do coordenador da pesquisa e diretor executivo da Anefac, Miguel Ribeiro de Oliveira, o mais recente reajuste da Selic deve elevar para 6,10% a taxa de juros média para a pessoa física. Com o novo aumento esperado na reunião de dezembro do Copom, a aposta é que se feche o ano pagando juro médio de 6,12% ao mês. “É preciso que o consumidor seja cauteloso. Alguns centavos a mais em um financiamento não desmotivam a contratação, mas, se o conjunto de altas continuar, haverá peso principalmente nos financiamentos de longo prazo, como o de automóveis.” Para Miguel, o ideal, neste momento, é adiar esse tipo de operação financeira.

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