O plenário da Câmara Municipal ficou pequeno para tantos trabalhadores da Mercedes-Benz, que cruzaram os braços nesta segunda-feira (15) para acompanhar os debates acerca do futuro da montadora em Juiz de Fora. Os funcionários ocuparam todo o segundo andar da Casa e assim permaneceram durante as mais de três horas de audiência pública realizada pela Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). A solicitação partiu dos deputados Celinho Sintrocel (PCdoB), que preside a comissão, Betão (PT) e Coronel Henrique (PSL). Os dois últimos marcaram presença na cidade. A preocupação unânime é com a manutenção dos empregos, após a já anunciada transferência da montagem do caminhão Actros para São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, e a possível migração do processo de nacionalização das sprinters que chegam da Argentina via Porto Seco para o Porto de Vitória, no Espírito Santo.
Betão presidiu os trabalhos e explicou que, após conversa com o Sindicato dos Metalúrgicos, ficou preocupado com a possibilidade de demissão em massa, caso o Actros realmente seja direcionado a São Paulo. Pelas contas da entidade de classe, a fábrica reúne cerca de 1.150 trabalhadores diretos e outros 600 indiretos. O deputado lembrou que, no ano passado, a montadora se manteve na liderança na venda de caminhões, citou números referentes à performance da empresa e questionou o futuro da mão de obra, caso as medidas previstas sejam, de fato, concretizadas.
“Houve um investimento grande do Estado e da própria Prefeitura, desde a implantação da Mercedes, para que ela garanta os empregos. É isso que estamos esperando.” Betão disse que levará a discussão da audiência à ALMG e ao governador. O deputado Coronel Henrique comentou que “Juiz de Fora tem pressa para entender o futuro da Mercedes” e que as relações da empresa com estados limítrofes podem representar uma ameaça à permanência do negócio em Minas. “Não podemos sofrer essa ameaça.”
O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Juiz de Fora, João César da Silva, agradeceu a adesão dos trabalhadores à paralisação e a presença maciça à audiência, afirmando que “só com unidade é possível alcançar objetivos”. O sindicalista fez um retrospecto desde o anúncio da chegada da montadora, em 1996, a efetivação em 1999 e a atração de outras empresas do setor de autopeças, as mudanças de perfil na produção ao longo dos anos (de automóveis a caminhões), a transferência do modelo Accelo para São Bernardo do Campo em 2014 e a perspectiva de que o Actros também vá para São Paulo em julho de 2020. Caso as medidas se concretizem, a planta juiz-forana concentrará apenas os serviços de montagem de cabinas e pinturas dos veículos da marca.
“Nesses 20 anos, estamos sofrendo com a possibilidade de o projeto ser interrompido.”
Por várias vezes, João reiterou que a categoria não teme a saída da empresa da cidade, mas o esvaziamento da planta e as possíveis demissões. “Em que condições a empresa vai permanecer em Juiz de Fora? Para produzir cabines não será preciso esse número de trabalhadores. Vão sobrar muitos. O que vão fazer com esses trabalhadores?” Pelas suas contas, se a atuação ficar restrita às cabines, o número de postos diretos poderia cair de 1.150 para algo em torno de 300 trabalhadores, já que o procedimento é, em sua maioria, automatizado. Já o operação com as sprinters envolveria cerca de 250 pessoas. Entre as bandeiras levantadas pelo sindicato estão a celebração de um acordo para manutenção dos postos por 24 meses e o direcionamento de um novo produto para a cidade.
“Acreditamos que, com mobilização, é possível reverter a situação.” Novas paralisações como a desta segunda não são descartadas. O presidente da Federação Estadual dos Metalúrgicos, Marco Antônio de Jesus, convocou o Governo mineiro a negociar com a montadora, para evitar demissões. Para o presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos, Paulo Cayres, eficiência, na prática, significa manutenção de postos de trabalho.
Prefeito se solidarizou aos trabalhadores
Também presente à audiência, o prefeito Antônio Almas (PSDB) destacou a importância da montadora para a cidade e a região, a preocupação com a arrecadação de impostos oriunda da empresa e a manutenção dos postos de trabalho, especialmente em tempos de crise. “Não podemos perder os empregos conquistados na área industrial.” Ele se solidarizou aos trabalhadores e afirmou que não faltará apoio institucional no sentido de resguardar as oportunidades de trabalho existentes. O prefeito comentou que o protocolo de intenções, firmado junto à PJF, findou em 2014, mas acrescentou que o Poder Público está sempre disposto a conversar. Durante a instalação, entre os benefícios concedidos à empresa, houve doação do terreno (uma parceria entre PJF e Estado), incentivo fiscal no valor de R$ 600 mil e isenção do IPTU por dez anos.
Segundo o subsecretário de Assuntos Parlamentares da Secretaria de Governo, Ricardo Miranda, a presença do Governo em Juiz de Fora era para ouvir, tomar conhecimento, acompanhar e intervir na questão. Ele reforçou a preocupação do Governo mineiro em gerar emprego e renda e afirmou que o governador “não medirá esforços” para atingir esses objetivos. Miranda destacou a importância da montadora para a cidade e para o estado, a qualidade dos empregos gerados aqui e a necessidade de manutenção dos postos. Também presente à audiência, o diretor da Agência de Promoção e Investimento e Comércio Exterior de Minas Gerais (Indi), Ronaldo Barquette, lembrou as dificuldades financeiras enfrentadas pelo Estado e a necessidade de manter os postos de trabalho existentes. Segundo ele, têm sido feitas várias reuniões com a empresa para discutir inclusive a logística disponível, considerada um ponto crucial hoje.
Logística é entrave para a Mercedes
O diretor de Relações Institucionais e Comunicação Corporativa da Mercedes-Benz do Brasil, Luiz Carlos Moraes, citou os investimentos de R$ 450 milhões, realizados entre 2011 e 2012, e de R$ 230 milhões, em 2014, para que a planta se tornasse a melhor fábrica de cabines no setor de caminhões da América Latina. O executivo destacou, ainda, a “perfeita sinergia” com a planta localizada em São Bernardo do Campo. Segundo Moraes, apesar da crise financeira verificada no país e de uma ociosidade que chega a 60% na indústria brasileira, a montadora continua trabalhando e apostando na fábrica de Juiz de Fora, mas busca eficiência, ponderou. Ele confirmou a decisão de transferência do Actros para São Bernardo e a especialização da unidade local para montagem de cabines. O executivo destacou, ainda, os investimentos e a valorização da mão de obra local. Com o esperado crescimento do mercado de caminhões, ele entende que, após a saída do Actros, será possível absorver, transferir e treinar os trabalhadores da planta local para novas funções na própria fábrica.
Moraes criticou a logística para desembaraçar veículos em Juiz de Fora, afirmando que o processo, da forma atual, não é eficiente. Além da distância, a demora para faturar um veículo, que pode chegar a 20 dias, são considerados entraves. “Quanto a essa questão da logística, precisamos, juntos, buscar uma melhor saída para que Juiz de Fora e Minas Gerais se tornem mais atrativos e produtivos.” O executivo afirmou, ainda, que a transferência do desembaraço das sprinters para o Espírito Santo está em fase de testes, exatamente por conta dos problemas relatados. “Se a eficiência for implementada e voltar a ser competitiva, a gente pode discutir, mas hoje não é.” O diretor afirmou, ainda, que a montadora não conta com nenhum benefício no momento e não está pleiteando incentivo. “Estamos discutindo a eficiência da logística.”