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Instituições de longa permanência para idosos triplicam em uma década em JF

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Em 2023, o Brasil registra que cerca de 15% da sua população tem idade igual ou maior que 60 anos – sendo que a expectativa de vida no país é de 74 anos. Essa mudança na composição etária da população fez com que a busca por qualidade de vida e bem-estar na terceira idade passasse a ser ainda maior, levando em conta também as transformações da sociedade e a forma de tratar os idosos na contemporaneidade. Diante desse cenário, o aumento da longevidade fez com que a procura por instituições de longa permanência crescesse entre as famílias brasileiras.

Esses espaços são caracterizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) como locais coletivos de moradia para pessoas com 60 anos ou mais, podendo ser governamentais ou não. No total, atualmente, são 3.548 instituições no território brasileiro, das quais 1.617 declararam serem filantrópicas e conveniadas. De acordo com dados do Conselho do Idoso e do Fórum das Instituições de Longa Permanência em Juiz de Fora, em 2009 eram 11 instituições que faziam parte do grupo, e hoje já passam de 30 – ainda considerando que há locais focados no cuidado dos idosos na cidade que não estão cadastrados nesse grupo.

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Buscar um local que possibilitasse os cuidados com seu pai foi justamente o que fez Erika Lawall procurar uma Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI). Durante o período da pandemia, ela foi vendo seu familiar apresentar uma piora no estado de saúde, e até cogitou que se tratava de um quadro depressivo. Devido à distância exigida pelo isolamento social, ela percebeu de repente no pai uma memória reduzida e uma dificuldade de andar e de fazer coisas sozinho que não tinha visto antes. Até que uma situação mais complexa ocorreu: “Minha irmã chegou na casa dele e ele estava caído e sozinho. Fui com ele para o hospital e ele fez vários exames”, conta. Nesse momento, o pai dela, Paulo Edgar Lopes, foi diagnosticado com um tipo de Parkinson mais agressivo, a doença de Levy. Durante cerca de um ano, ela tentou adaptar sua casa para os cuidados de que ele precisava, mas nunca era o bastante para suprir as necessidades que ele tinha, mesmo com cuidados 24 horas. “Meu pai chegou à clínica de cadeira de rodas, mas aí começou o atendimento de fisioterapia, acompanhamento nutricional com suplementos e a observação médica diária. Ele foi melhorando cada vez mais, e até voltou a andar”, relembra.

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Apesar de ter sido uma decisão muito difícil, Erika foi ficando cada vez mais segura de que tinha feito a coisa certa: “Como a gente tem que tomar essa decisão, parece um abandono, ou que estamos querendo empurrar. Mas quando vemos como eles melhoram e como ficam à vontade, essa concepção muda”. É o mesmo que aconteceu com Sandra Aparecida dos Reis, que escolheu institucionalizar seu pai, Sebastião Teixeira dos Reis, de 73 anos. Para ela, não se trata só de uma opção, já que em muitos casos a família se vê sem outra alternativa. No caso dela, o pai começou a ter crises de agressividade causadas pelo Alzheimer, o que tornou muito difícil mantê-lo em casa. “Fico feliz de colocado ele em um lugar que tem respeito pela história do pai, onde ele é acolhido pelas suas necessidades e tem realmente um lar. Não é fácil, a gente queria que ele estivesse conosco, mas temos bem mais tranquilidade assim”, conta. Desde que Sebastião foi para uma ILPI, passou a participar também de festas, atividades cognitivas, terapias e sessões com uma fonoaudióloga, além de receber visitas semanais da família.

Além da convivência, empreendimentos como o Flora Residencial Sênior preocupam-se em criar diferenciais no mercado de ILPIs, oferecendo a seus idosos o apoio de uma equipe multidisciplinar, com fisioterapeutas, psicólogos, musicoterapeutas e recreadores (Foto: Felipe Couri)

Sobrevida e bem-estar

Essa rotina de cuidados também foi presente na vida de Rita de Cássia Pereira, que precisou colocar sua mãe em uma instituição após tentar cuidar dela sozinha em casa. Durante o período, ela teve uma depressão forte e chegou a perder muito peso pela sobrecarga que sentia. “Por ela ter Parkinson e ser cadeirante, dependia totalmente de cuidados. Éramos eu e mais duas cuidadoras, e mesmo assim a gente não dava conta”, relata. Foi nesse momento, então, que ela passou a considerar a possibilidade de uma ILPI, ainda que tivesse receios. Quando conheceram o espaço em que a mãe ficou, no entanto, essa realidade mudou: “Quando chega a esse ponto, se puder e tiver condições de colocar o familiar em um lugar confiável, é a melhor escolha. Minha mãe foi pra um lar com 78 anos e ficou até quase 90. Foi a melhor decisão. Eu e meus irmãos nunca nos arrependemos, porque se ela não estivesse lá, não ficaria viva e bem durante tanto tempo”, acredita.

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Mudança na estrutura familiar e cuidados intensivos

O papel das ILPIs vem mudando ao longo dos anos devido ao grande crescimento da população idosa, mas também, como explica Gleice Vellozo, psicóloga e proprietária do Grupo Regapi, por conta de uma mudança sociocultural dos arranjos familiares. “Antes, tínhamos mulheres que eram cuidadoras dos mais novos e dos mais velhos. Hoje, elas trabalham fora e têm uma vida social também mais ativa e atribulada. As antigas cuidadoras não estão mais disponíveis na sociedade moderna, e isso faz com que, tendo mais idosos e mais longevos, seja preciso ter pessoas para cuidar deles”, explica. Nesse sentido, para ela, as ILPIs surgem como alternativas de espaços de cuidados específicos para essa parcela da população, que tende a ser mais dependente e mais frágil, e que gera uma grande sobrecarga para o cuidador.

Da mesma forma, Hugo Franzone, da Flora Residencial Sênior, percebe que há algumas décadas as famílias eram maiores e tinham vários filhos, e geralmente um deles abria mão da vida laboral para cuidar de um dos familiares em processo de envelhecimento. “Com famílias menores e com mais necessidade de todos trabalharem, as instituições permitem às famílias terem a segurança de deixar os idosos em um lugar no qual eles vão ser cuidados. Sozinhos, os riscos são variados”, argumenta.

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Desde que começou a trabalhar nessa área na cidade, ainda em 2006, Gleice percebe um aumento das instituições de longa permanência e ainda uma mudança no perfil dessas instituições. “Se tínhamos lá atrás instituições que ofereciam só cuidados a nível de atividades diárias e de hotelaria, hoje temos instituições especializadas em promover qualidade de vida para a pessoa idosa. São planos de trabalho completos para estimular os idosos em todas as suas áreas, sejam cognitivas ou de socialização”, explica.

Conforme percebe no mercado, o objetivo não é só acolher, mas trabalhar para que o idoso tenha uma qualidade de vida, com estimulação e cuidados 24 horas por dia, todos os dias da semana, com uma equipe multidisciplinar. Hugo percebe essa mesma tendência, e por isso explica que oferece na instituição fisioterapia, serviços de psicologia, de fonoaudiologia, musicoterapia e recreação. “São vários atrativos e muito entretenimento para ocupar o idoso e fazer com que ele tenha bem-estar.”

Aumento da qualidade de vida

Por conta do aumento da longevidade, hoje em dia podemos identificar diferentes tipos de idosos em diferentes etapas do envelhecimento. Conforme explicam os especialistas, um idoso com 60 anos é diferente daquele de 70, 80 ou 90. No caso do espaço de Hugo, o perfil que mais procura a institucionalização é daquele idoso por volta dos 60/70 anos, que percebe que não é adequado mais morar sozinho, mas ainda busca autonomia e liberdade. “Essas pessoas utilizam o espaço como casa, mantendo a autonomia de entrar e sair sozinhos. Esses idosos veem os atrativos e a qualidade de vida que estar em um lar bem cuidado e com atividades traz”, conta.

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Para Gleice, um empecilho para conseguir essa qualidade de vida é a dificuldade de compreensão da importância da participação da família ativamente nesse momento de institucionalização. “Ainda existem pessoas que pensam que institucionalizar um idoso é abandoná-lo ou que eles vivem em más condições. Isso acontece ainda pela falta de informação sobre essa modalidade de serviço e sobre a falta de informação sobre o processo de envelhecimento no geral, levando em conta o que é bom pro idoso e o que não é, e os tipos de envelhecimento. Não dá para pensar na ILPI a nível de preconceito e estigmas, mas também não dá para romantizar o processo de institucionalização dos idosos”, diz. Para ela, ainda é preciso entender que cada ILPI pode responder a uma demanda, e por isso há instituições com perfis diferentes, que atendem por exemplo idosos mais independentes ou aqueles que têm uma patologia mais severa.

Cadeia econômica impulsiona cursos de cuidadores

É fundamental que uma equipe que atue em uma ILPI 24 horas, sete dias por semana, tenha uma qualificação específica para isso. De acordo com Lidiane Charbel, assistente social e gerontóloga que oferece esse tipo de curso de formação, essa é uma das problemáticas atuais envolvendo as instituições. Ser cuidador é uma das exigências da Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) número 502 – regulamentação técnica da Anvisa que regulariza esses espaços e que diz respeito à formação na área de gerontologia – com relação aos profissionais que atuam nas ILPIs. “Um cuidador não pode achar que a velhice é ‘tudo igual’, ele tem que ter um olhar diferenciado. Uma equipe qualificada é capaz de mudar uma vida, agregar valor à função que executa, porque ali estabelece uma relação com vínculos e conexões”, explica.

Devido ao crescimento do número de instituições, ela percebe que também ocorreu um aumento na procura de cursos de cuidadores e também na oferta desses cursos. “Não basta ter um ‘dom’, tem que ter a técnica e os estudos. Há uma procura tanto de pessoas para fazer cursos e atuar dentro das instituições quanto da oferta desses cursos, justamente pelo crescimento da população idosa e pelo número de instituições”, explica. Em seu caso, ela já ministrou cursos para algo em torno de cem a 150 pessoas. A grade curricular, no entanto, varia de acordo com o curso e as necessidades da empresa. Mas, de acordo com o relato de Lidiane, é preciso sempre partir do pressuposto de que mesmo coisas óbvias devem ser ditas. “É preciso ter uma noção do que é o processo de envelhecimento, o que é ser velho hoje na sociedade e construir a formação em outras áreas”, diz.

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Necessidade de cumprimento das exigências legais

Como explica Lidiane, que é integrante do Conselho dos Idosos, a análise do cenário é complexa. “Temos um município que já passa a média nacional. O Brasil envelheceu, e Juiz de Fora está envelhecendo ainda mais. Nós não vemos ILPIs de caráter público ou filantrópico crescendo, mas vemos um alto número de instituições privadas com fins lucrativos crescendo”, afirma.

De acordo com Gleice Vellozo, que também faz parte do Conselho dos Idosos, há mais que o dobro de instituições se levarmos em conta aquelas que ainda não estão totalmente regularizadas e não estão no Conselho Municipal dos Idosos. “Percebemos, de modo geral, que esse aumento veio acompanhado de muitas instituições que estão se especializando nessa prestação de serviços, com profissionais capacitados e com uma gestão de qualidade. Mas também existe um aumento desgovernado de instituições que não têm conhecimento nenhum de gerontologia ou da legislação relacionada às ILPIs e acham que é apenas abrir uma casa e colocar idosos lá”, afirma.

De acordo com a sua experiência, a fiscalização na cidade é ativa e intervém em muitos casos, para mostrar a necessidade de profissionalizar a prestação de serviços. Ela recomenda, ainda, que no caso de necessidade desses serviços, as famílias busquem instituições com alguns critérios. “As famílias devem procurar aquelas que têm boas indicações, que já conhecem alguém que já ficou lá e principalmente aquelas que estão regulares. Isso significa ter alvará de vigilância sanitária, alvará de localização e principalmente que tenham passado por fiscalizações constantes e cumpram todas as exigências legais dos órgãos fiscalizadores”, recomenda.

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