A produção de cerveja especial tem aumentado de forma exponencial em Juiz de Fora. Atualmente, são fabricados 350 mil litros por mês, a mesma quantidade que foi produzida ao longo de todo o ano de 2013, quando o setor começou a ganhar destaque. De lá para cá, além da profissionalização dos cervejeiros, que passaram da produção feita em casa à realizada em fábricas – o que trouxe a diferença entre as nomenclaturas “artesanal” e “especial”-, houve também o surgimento de demandas específicas para atender uma nova cadeia produtiva que vem se fortalecendo. As necessidades variam desde o trabalho gráfico para a impressão de rótulos e estamparia de copos até a presença de profissionais qualificados que atuem no controle de qualidade do produto. Com a vocação cervejeira reconhecida, já que o setor é o primeiro a constituir um Arranjo Produtivo Local (APL) em Minas Gerais, a expectativa é de continuidade de crescimento da produção e das vendas.
De acordo com o presidente da União Cervejeira da Zona da Mata (UniCerva ZM) e sócio gestor do Bar São Bartolomeu, Alexandre Vicente Vaz, apenas parte das demandas é atendida na cidade. “Há oportunidades de negócio que ainda são inexistentes ou pouco exploradas, como é o caso da estamparia de copos de vidro que ninguém aqui faz, e nós precisamos buscar em outro estado. Seria interessante incentivar o mercado local atender o que for possível destas demandas.”
Além de produtos, há possibilidades para o segmento de serviços. “Precisamos de cursos de capacitação para sommelier, análise sensorial, treinamentos de garçom. Como polo cervejeiro, além de absorver os profissionais qualificados, podemos vender conhecimento.” Segundo ele, também seria importante o fomento à produção de eventos. “É outro segmento que está ligado ao nosso e podemos crescer juntos.”
Na avaliação do proprietário da Timboo, Mário Ângelo, o atendimento das demandas pelo mercado local pode contribuir para aumentar a produção das cervejas. “Compro garrafa e faço os rótulos em Belo Horizonte, estampo copos em São Paulo ou no Rio Grande do Sul, as caixas de papelão para embalagem de seis cervejas também são feitas fora. Tudo isso encarece o produto, e torna mais difícil expandir”, exemplifica. “Seria muito bom que as empresas da cidade se interessassem em atender o nosso setor, de forma a não só a suprir essas demandas já existentes, como também, oferecer inovações.” Ele também acredita que a área de conhecimento é promissora. “As faculdades poderiam inserir disciplinas relacionadas a cerveja para que os profissionais sejam capacitados nesta área”, opina. “As cervejarias precisam de pessoas que atuem no controle de processos e de qualidade do produto. A cidade carece de laboratórios de qualidade e profissionais que atuem nesta área.”
Cervejaria cria laboratório de qualidade
Aos 26 anos, Luana Gerhein pode se tornar precursora neste tipo de demanda verificada pelo setor. Estudante do décimo período da Faculdade de Farmácia e Bioquímica da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), ela faz estágio na cervejaria Antuérpia, onde tem ajudado na implantação de um laboratório de qualidade. “A graduação é direcionada para as áreas de medicamentos, análises clínicas e alimentos. Atuei com controle de qualidade dos alimentos e, posteriormente, como consumidora de cerveja especial, interessei em direcionar os meus estudos para este produto”, relata.
Luana explica que o objetivo do laboratório é garantir a padronização da bebida e a manutenção dos processos. “É um trabalho de qualidade que abrange matéria-prima, processos, embalagens até chegar na estabilidade do produto. Nem todas as cervejarias têm recursos para abrir um laboratório. É preciso uma estrutura e um porte específico, pois há a necessidade de produção de 15 mil barris por ano para justificar a análise de um controle básico de qualidade.”
Na avaliação de estudante, o setor cervejeiro pode oferecer oportunidades para profissionais que estudam áreas de biologia, microbiologia, físico-química, farmácia, bioquímica e afins. “Existe uma carência por profissionais especializados neste setor, que exige conhecimento técnico e científico. A cerveja especial requer qualidade e, para isso, é preciso manter um padrão.”
Primeira cervejaria escola abre as portas
Inaugurada no dia 15 de julho desse ano, a Cervejaria Escola Mirante é a primeira em Juiz de Fora a unir a comercialização de cerveja especial à capacitação de pessoas interessadas em ingressar ou se especializar no mercado. “Oferecemos cursos que atendem desde a pessoas leigas até quem já possui conhecimento e trabalha na produção artesanal”, conta o sócio-proprietário do local e presidente da Associação de Cervejeiros da Zona da Mata (ACZ), Fabrício Costa.
O espaço é dividido em diferentes ambientes que ilustram a cadeia produtiva da cerveja especial: área de produção, laboratório, bar e restaurante, salas de estudo para capacitação dos profissionais. “Nossa ideia é construir, ainda, uma área externa para vendermos insumos em pequena quantidade, destinada aos cervejeiros caseiros, e um outro espaço para vender brindes, como camisetas e chaveiros, para quem vem ao bar.”
Fabrício concorda que há muitas oportunidades de negócio que podem ser exploradas pela cidade. “Podemos fortalecer a parte gráfica e criar fornecedores de brindes, por exemplo. Parte da nossa demanda é atendida, mas com o mercado cervejeiro em ascensão sempre há mais espaço.” Ele também ressalta as chances no setor de serviços. “Delivery, beer truck, eventos e cursos para o setor são algumas possibilidades.”
Capacitação
Segundo ele, a procura por capacitação tem sido grande. A primeira turma para qualificação de beer sommelier começou há um mês com 20 alunos. “Já temos outros 20 numa lista de espera para iniciar a segunda turma.” O curso tem duração de seis meses, é ministrado por professores de Belo Horizonte e tem chancela da Associação Brasileira de Sommeliers (ABS). “O aluno sai pronto para ingressar no mercado de trabalho.”
Outras qualificações também são oferecidas. “A nossa ideia é fazer uma espécie de incubadora. Levar conhecimento para quem quer ingressar no setor ou quem já atua como cervejeiro caseiro e direcioná-lo ao mercado. O suporte é em todos os aspectos, inclusive tributário e de gestão. Também queremos dar a oportunidade de comercialização, transformando o nosso bar em um ponto de vendas multimarcas.”
Além dos cursos, a Cervejaria Escola Mirante abre as portas para cervejeiros ciganos que queiram utilizar o maquinário para a fabricação da própria receita. “Temos oito ciganos com a gente. No mercado de cerveja especial não há concorrência, estamos todos crescendo juntos. Nós temos ganhado espaço na comparação com as cervejas mainstream, que também não se importam com nosso crescimento, pois detêm uma fatia muito grande do mercado.”
JF mira mercado internacional
A continuidade da expansão do setor cervejeiro é dada como certa. De acordo com a Associação de Cervejeiros da Zona da Mata (ACZ), três novas fábricas devem ser construídas ainda este ano na cidade, totalizando 14 cervejarias. “O consumidor está conhecendo e valorizando o produto, o que tem ampliado o nosso mercado”, relata o presidente da ACZ, Fabrício Costa. Até o momento, a bebida produzida em Juiz de Fora é comercializada na região da Zona da Mata, em Belo Horizonte e municípios dos estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo, São Paulo, Goiás e no Distrito Federal. O próximo passo é ganhar o mercado internacional ainda em 2017.
Segundo o diretor comercial da Antuérpia, Saulo Oliveira, a marca tem estudado planos de exportação. “Estamos em negociação para exportar para Nova Jersey, nos Estados Unidos, até o final do ano”, adianta. “Também queremos entrar no mercado de São Paulo capital, já que, por enquanto, atendemos apenas algumas cidades do interior paulista.” Segundo ele, a evolução e a maturação da produção contribuíram para a expansão e o fortalecimento vividos até agora. “O setor está muito aquecido. A aceitação do público tem sido grande, o que contribuiu para o aumento das vendas e a busca por novos mercados.”
O presidente da União Cervejeira da Zona da Mata (UniCerva ZM), Alexandre Vicente Vaz, diz que a exportação é vista como uma possibilidade futura para as marcas juiz-foranas. “O produto brasileiro desperta a curiosidade no público estrangeiro, acredito que teremos abertura para esse mercado, mas é um processo longo, árduo e que exige muita preparação.”