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Volátil, dólar preocupa

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Depois da alta acumulada de 12,78% no ano, o dólar iniciou 2015 com movimentos de baixa, sem sinalizar inversão da curva ascendente verificada nos últimos meses. No ano passado, ultrapassou a barreira dos R$ 2,70, atingindo o maior patamar (R$ 2,735) em dezembro. Este ano, o mercado aposta que a moeda norte-americana vai bater a casa dos R$ 2,80. Se o movimento cambial traz ganhos, como o estímulo às exportações, por outro lado provoca reflexos em cadeia, que vão desde o encarecimento dos produtos importados à maior pressão inflacionária, turbinada pela desvalorização do real, que pode resultar em mais juros ao consumidor se não houver reversão do quadro.

Na avaliação do doutor em Economia e professor do Ibmec/MG, Reginaldo Nogueira, a escalada do dólar é motivada por fatores objetivos, como o crescente déficit externo do país (cerca de US$ 80 bilhões), a queda do preço das commodities que afetam as exportações e a iminência de uma reversão na política monetária norte-americana, que levaria a uma forte saída de capital nos países emergentes em função do esperado aumento de juros. Há, ainda, um componente político, já que agentes podem procurar a moeda estrangeira para se proteger dos riscos da condução considerada equivocada da política econômica nacional. “Os fatores objetivos continuam pressionando o câmbio para cima, sendo que o mercado está apostando em uma taxa de R$ 2,80 ao final do ano.”

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O coordenador de Macroeconomia da Conjuntura e Mercados Consultoria Júnior (CMC jr) e professor da Faculdade de Economia da UFJF, Wilson Rotatori, acrescenta que, com a inflação, o real perdeu poder de compra ante outras moedas. A falta de perspectiva de crescimento da economia brasileira reduziu o ritmo de investimento no país, resultando em menor entrada de dólares. O fluxo cambial aponta que a saída de dólares superou a entrada em cerca de US$ 9,3 bilhões em 2014. O professor também destaca o fraco desempenho das exportações brasileiras, uma fonte de moeda estrangeira já que os dólares são trocados por reais na concretização dos negócios. Em 2014, a balança comercial apresentou déficit de US$ 3,9 bilhões, o primeiro desde 2000.

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Segundo Nogueira, o dólar mais caro barateia os produtos brasileiros no exterior, ajudando os exportadores. “Isso é relevante nesse momento, quando temos um déficit em conta corrente muito alto.” Por outro lado, a valorização da moeda estrangeira gera inflação. Além do repasse para produtos importados e nacionais que possuem componentes importados, há o risco de desabastecimento do mercado doméstico em função da venda de produtos no exterior. “Como nossa inflação está em 6,41% ao ano, o impacto inflacionário da desvalorização do real pode ser significativo e provocar mais aumentos nas taxas de juros, a Selic, por parte do Banco Central (BC).”

Na lista dos impactos negativos, Rotatori cita também o prejuízo à atualização tecnológica do parque produtivo nacional, via importações, diminuindo a capacidade de competição da indústria, assim como o encarecimento das matéria-primas importadas, podendo elevar os custos de produção. O maior risco em investimentos e o encarecimento das viagens internacionais são outros reflexos percebidos para investidores e consumidores, respectivamente. Na avaliação de Nogueira, os brasileiros que estão viajando para o exterior nessas férias foram os primeiros a notar os efeitos do dólar mais caro. Já os consumidores em geral começam a sentir os efeitos inflacionários da desvalorização ao longo do primeiro trimestre deste ano, considera.

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Controle

O fotógrafo Braz Porfírio Júnior, 37 anos, voltou esta semana dos Estados Unidos, onde permaneceu por cerca de dois meses. Durante o planejamento da viagem, pensou em comprar dólar com seis meses de antecedência, mas resolveu esperar o comportamento do câmbio, torcendo pela estabilidade da moeda. Ao perceber, porém, que a tendência era de alta, acabou adquirindo a moeda com valor aproximado a R$ 2,45, cifra bem inferior à verificada hoje. O fotógrafo comenta que, por ter ido com dólar no bolso, a escalada da moeda nos últimos meses não comprometeu a viagem, mas serviu para controlar os gastos durante a estada em terras americanas. “Quando ia comprar alguma coisa no cartão, pensava duas vezes. Deixei de adquirir algumas coisas que compraria normalmente se o dólar não estivesse tão alto.” Entre as preocupações com o uso do cartão estão a conversão da dívida para a cotação atual e a incidência de 6% de IOF. Apesar do autocontrole, Braz não deixou de trazer na bagagem a lente fotográfica adquirida por US$ 700 e vendida no Brasil por mais de R$ 3.500. Apesar de ter adorado a experiência, ele avalia que, “se tivesse que fazer a viagem hoje, não programaria para os Estados Unidos”, unicamente em função dos custos.

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Importados sobem até 25%

Depois de acompanhar reajuste médio entre 10% e 15% nos itens importados consumidos entre o Natal e o Ano-Novo, o consumidor deve amargar aumento entre 20% e 25% na aquisição de produtos vindos do exterior neste início de ano. Este é o cálculo da Associação Brasileira dos Exportadores e Importadores de Alimentos e Bebidas (Abba), tendo por base a valorização do dólar a partir de outubro, caso não exista reversão do cenário. Conforme a presidente da Abba, Raquel Salgado, o impacto de a moeda, em 2014, ter chegado ao maior valor desde 2005, começa a ser sentido pelo consumidor no final de janeiro. “Será uma pancada.” Pelos cálculos da entidade, no final do ano passado, o setor já havia amargado queda entre 5% e 7% na procura.

Depois de enfrentar um ano ruim para as agências em função da Copa do Mundo, o presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens de Minas Gerais (Abav-MG), Antonio da Matta, considera 2015 um ano de desafios para o setor. Em função das incertezas da economia e da escalada do dólar, diz, as agências são convidadas a encarar, “com otimismo e criatividade” o desafio de driblar o momento desfavorável, inclusive priorizando a venda do circuito nacional.

Segundo o presidente, enquanto a classe A não deixa de viajar em função da variação cambial, a B deve reduzir a média de três viagens anuais enquanto os demais passageiros devem priorizar os destinos nacionais. Na sua avaliação, o viajante deve ficar atento, já que, em função da valorização da moeda norte-americana, as companhias aéreas devem oferecer tarifas promocionais, acompanhadas por promoções pelas agências. Pesquisa divulgada pela Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata), esta semana, aponta que a demanda mundial por viagens aéreas internacionais avançou 5,4% em novembro, contra alta de 5,7% em outubro, os dados mais recentes do órgão.

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Investimento

Para quem acha que a valorização do dólar representa, por tabela, uma boa opção de investimento, economistas não consideram essa relação tão direta. De olho na premissa que o dólar deve chegar a um patamar de até R$ 3,20 – não neste ano – o professor Reginaldo Gonçalves, coordenador do Curso de Ciências Contábeis da Faculdade Santa Marcelina, identifica que investir em dólar pode ser um bom negócio, desde que seja em pequeno valor. “A melhor alternativa é efetuar um portfólio de investimentos para minimizar as perdas.” Já o professor Wilson Rotatori considera que, devido à volatilidade da moeda, este é um investimento de alto risco. “Pode ser uma alternativa de investimento, mas uma nova escalada do dólar como a que aconteceu no segundo semestre de 2014, de R$ 2,20 para algo próximo de R$ 2,70 (alta de 22%) não parece provável a não ser que a situação econômica e política no Brasil se deteriore sensivelmente.” Se o investimento for para uma viagem ao exterior, a compra contínua da moeda por um período mais longo pode diminuir os efeitos da volatilidade do câmbio, explica.

Exportações caem em JF

Segundo a analista de Comércio Exterior da Fiemg Regional Zona da Mata, Maria Fernanda Quirino, a subida brusca do dólar segue em linha com a tendência global, mas a expectativa dela é que, a partir de agora, não existam quedas nem altas bruscas. Apesar do encarecimento das importações, Maria Fernanda não atribui a valorização do dólar à queda de quase 20% nas importações, destacando a desvalorização de produtos e o déficit como característica da balança juiz-forana.

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A analista, no entanto, cobra políticas econômicas voltadas às exportações. Maria Fernanda pondera que, apesar de o momento ser vantajoso às vendas no exterior, vive-se um cenário de queda do consumo mundial. “Não adianta o real estar desvalorizado, com preço competitivo, se não há quem compre.”

Para a analista, o câmbio é importante, mas “não é tudo”. Ela defende a necessidade de equilíbrio entre exportar sem desabastecer o mercado interno, o que não prejudicaria o consumidor.

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