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Taxa Selic: entenda como juros afeta crédito no Brasil

juros Selic
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Após meses no mesmo patamar, o Banco Central (Bacen) anunciou nesta semana a queda de 0,5% na taxa básica de juros (Selic), que agora passa a valer 13,25% ao ano. Tida como “preço” do dinheiro, o índice reflete nas demais taxas no Brasil. Quando está alto, o crédito encarece e afeta toda a cadeia de serviços e produtos, contribuindo, inclusive, para a inadimplência. Considerada “tímida” por especialistas ouvidos pela Tribuna, a redução da Selic não deve causar efeitos imediatos para o consumidor, mas indica uma sinalização de queda dos juros no país.

A Selic estava a 13,75% ao ano desde agosto de 2022, sendo também o maior patamar alcançado desde janeiro de 2017. A taxa é usada para controlar a inflação no país, porém, ao se manter elevada por muito tempo, contrai a liquidez e, por consequência, a economia, de acordo com a economista e professora de MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Carla Beni. O índice é referência para as demais taxas, ou seja, é o “preço” do dinheiro.

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“O Tesouro paga esta taxa para remunerar os títulos públicos, sendo a referência para os empréstimos. Quanto maior for a Selic, ou a taxa de juros do país, pior é para todas as pessoas que precisam de empréstimos, até para quem acha que não está pagando juros”, explica a especialista. “Por exemplo, quando uma pessoa compra um objeto, como uma geladeira ou uma televisão, e parcela em oito ou dez vezes, existem juros embutidos nessa operação. O efeito da Selic alta é que ela encarece o crédito, e o Brasil é um país de renda média baixa. O parcelamento no varejo é fundamental.”

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Esses fatores acabam refletindo na inadimplência, alimentada pela taxa de juros que os bancos cobram, segundo Carla. Além disso, o Brasil possui o maior juro real do mundo, um entrave para quem pretende abrir novos negócios ou investir nas próprias empresas.

“Nós tivemos pandemia, queda de renda, processo inflacionário e queda de poder aquisitivo. Tudo isso vem vindo nestes últimos anos, tanto que nós estamos com 43,5% da população adulta negativada. Por isso a importância de um programa como o Desenrola, por exemplo”, diz. “O problema não está em elevar [a Selic], está no tempo que você tem de manutenção dessa elevação.”

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Sinalização de queda

A redução da Selic de 13,75% para 13,25% ao ano, anunciada nesta semana pelo Banco Central, demonstra uma sinalização importante para o início do ciclo de queda dos juros no Brasil, conforme a professora da FGV. Como lembrado pela especialista, no comunicado sobre a última reunião, o Bacen conjecturou queda de inflação não apenas em 2023, mas também para 2024 e 2025.

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“Para a vida prática de quem precisa de empréstimo, a redução ainda é uma alteração muito pequena. A taxa continua muito elevada, mas há toda uma mudança de perspectiva”, aponta. “No comunicado, [o Banco Central] afirma que passará a trabalhar com quedas de meio ponto percentual, caso o cenário se mantenha constante.”

Patamar alto reflete na cadeia de produtos e serviços

Ao considerar a Selic um instrumento de controle inflacionário, significa dizer que seu aumento é eficaz quando a economia está aquecida e há muito dinheiro em circulação, de acordo com a coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim. Na prática, quando há mais procura do que oferta, os preços sobem. Assim, o aumento da taxa básica acaba retirando certa liquidez da economia para acomodar os preços e fazer com que a inflação volte ao patamar da meta. Este, porém, não era o cenário observado no país.

“Essa inflação que nós vínhamos acompanhando nos últimos anos não era uma inflação de preços de livre mercado, mas uma inflação provocada por preços administrados, que é o preço da gasolina e o das commodities. Não é uma demanda do consumidor”, explica. “Nós tivemos uma realidade que foi pautada por preços administrados, só que o remédio [Selic] aplicado é para um momento em que você teria excesso de liquidez e consumo na economia, o que não vinha acontecendo porque havia um nível de desemprego e endividamento elevado.”

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Desta forma, a alta na Selic não estava mais se sustentando. De acordo com informações da Agência Brasil, as últimas Estatísticas Monetárias e de Crédito, divulgadas no final de julho pelo Banco Central, mostram que houve deflação no país em junho, ou seja, um recuo nos preços na comparação com maio. O IPCA ficou negativo em 0,08%, sendo que foi o quarto mês seguido em que a inflação perdeu força. No ano, o índice soma 2,87% e, nos últimos 12 meses, 3,16%, abaixo dos 3,94% observados nos 12 meses imediatamente anteriores e seguindo a tendência de queda apresentada desde junho de 2022, quando o índice estava em 11,89%.

Por influenciar a cadeia de juros, todas as modalidades de crédito são afetadas pela Selic. “Quando você tem um patamar muito alto dessa taxa básica de juros, isso quer dizer que a dívida interna do Governo cresce nessa mesma proporção. Um endividamento do Governo é endividamento também de toda a população, ainda que diluído de certa forma, e isso vai refletir em toda a cadeia de produtos e serviços”, diz Ione.

Alta na Selic afeta investimentos no comércio, aponta categoria

No lado dos comerciantes, a alta taxa de juros acaba impedindo novos investimentos, de acordo com o presidente do Sindicato do Comércio de Juiz de Fora (Sindicomércio-JF), Emerson Beloti. Para o representante da categoria, o cenário ideal seria um equilíbrio no mercado, sem a necessidade de “sacrificar” os investimentos para manter a empregabilidade. “A taxa Selic, ao mesmo tempo que cura, de certa forma, causa outra situação, que é justamente a falta dos investimentos. Sem investimento, não há entrega.”

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Conforme Beloti, a construção civil é o principal medidor da situação econômica, refletindo no comércio em geral. Se o capital não chega ao setor por conta dos juros, consequentemente, interfere nos demais. “Eu costumo dizer que o comércio está bom quando a construção civil está próspera, porque o comércio é consequência, não é causa”, diz. “Quando a construção civil está em baixa, o comércio já está um desastre.”

Para o presidente do Sindicomércio-JF, a redução da Selic foi muito discreta para resultar em grandes mudanças. Entretanto, a importância do segundo semestre para a categoria, com datas como o Natal e a Black Friday, traz boas expectativas, considerando que alguns estabelecimentos ainda buscam se recuperar dos efeitos da pandemia da Covid-19. “A recuperação de uma empresa não é logo em seguida, demora. Então muitas ainda estão se ajustando.”

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