A proposta de isenção no Imposto de Renda (IR) para quem recebe até R$ 5 mil por mês foi um dos pontos que mais chamou atenção no anúncio feito pelo Governo federal na última semana. O novo pacote de gastos ainda precisa ser discutido pelo Congresso e deve ser votado em 2025 para, caso aprovado, entrar em vigor em 2026.
Conforme a Associação Nacional de Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco), se o projeto tiver andamento, cerca de 36 milhões de contribuintes podem ser beneficiados. Isso terá um impacto fiscal estimado em R$ 45 bilhões por ano.
Isenção atual
Conforme explica a contadora e consultora especializada em Planejamento Tributário e Financeiro, Mariana Castro, atualmente são isentos do IR pessoas que recebem até R$ 2.259,20. Acima desse valor, os contribuintes começam a pagar imposto, mas de forma escalonada, podendo chegar a 27,5%. Nessa tabela há também uma parcela de dedução.
Veja tabela:
O que diz a proposta do Governo
Se a proposta do aumento da isenção apresentada pelo Governo federal for aprovada, a tabela de cálculo do IR vai mudar. De acordo com Mariana, as parcelas de dedução, assim como a alíquota de incidência do IR, passarão a valer para quem ganha de R$ 5 mil a R$ 6.980.
No entanto, o Governo não apresentou essa nova tabela progressiva e, por isso, ainda há dúvidas se haverá alguma mudança nas alíquotas. Em coletiva, o Governo sinalizou que, na faixa logo acima dos R$ 5 mil, seria inserida alguma redução na tributação, para não haver uma grande diferença em relação a quem tem isenção.
O salário líquido vai aumentar?
Para os celetistas, ou seja, quem tem carteira de trabalho assinada, geralmente o IR é retido na fonte, ou seja, todo mês ocorre um desconto na folha de pagamento. Esse desconto é somado ao percentual recolhido para a Previdência, o INSS. Se a isenção para quem recebe até R$ 5 mil for aprovada, a parcela da população que ganha até esse valor por mês não terá mais o desconto referente ao Imposto de Renda.
Segundo explica o professor da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis (Faac), Luís Carlos Barbosa, isso pode representar uma economia de, aproximadamente, R$ 340 por mês. “Valor que poderá ser investido em um negócio pessoal do empregado, ou no próprio bairro em que ele mora, em um mercado, gerando um ganho de modo macro para a economia da cidade.”
Formas de compensação
O novo pacote de gastos apresentado pelo Governo federal, cujas mudanças no Imposto de Renda foram incluídas, também prevê formas de compensar a arrecadação. Uma delas é propor ao Congresso uma alíquota efetiva de 10% para quem ganha mais de R$ 50 mil por mês.
Para Mariana Castro, essa medida vai prejudicar o empresário, que terá que pagar imposto sobre os lucros ou dividendos. Atualmente isso não acontece. Ela explica que um empresário com renda de R$ 50 mil, proveniente de um negócio, declara como se tivesse recebido um salário mínimo, no valor de R$ 1.412. Isso se chama pró-labore, que é a remuneração paga aos sócios que trabalham em uma empresa. O pró-labore é diferente do salário, pois não é obrigatório pagar 13º salário, férias e FGTS, entre outros benefícios trabalhistas.
Com o valor de R$ 1.412, o empresário fica isento do Imposto de Renda e tem o desconto apenas do INSS. “O restante, que seria o lucro, atualmente é isento do Imposto de Renda. Se o Governo começar a tributar o lucro, o empresário vai elevar a carga tributária dele. Vai começar a pagar imposto sobre um valor que era isento”, explica Mariana. Para ela, a nova formatação será benéfica apenas para quem é celetista, e vai prejudicar empresários e autônomos. “A medida vai beneficiar a maior parte da população, vai? Mas vai prejudicar uma parte menor, que é a parte da população que gera renda para a maior parte, que são os empresários.”
Ela ainda aponta que o ideal seria alterar o desconto do INSS, que é o principal custo tributário do trabalhador. “Esse imposto não está em questão para ser modificado. Na minha opinião, essa não vai ser a maior nem a melhor redução para o contribuinte.”
Quase 80% da população será beneficiada
O professor da UFJF Luís Carlos explica que cerca de 80% dos trabalhadores estão na faixa que recebe até R$ 5 mil de salário e devem ser beneficiados caso a medida entre em vigor. “O que o Governo propõe é uma transferência de tributação, daquele que ganha menos para o que ganha mais. A classe do empresário vai ter o seu poder aquisitivo diminuído, mas se a gente for pensar que a população de menor renda é a que fomenta o comércio, as empresas, isso acaba voltando para o empresariado depois. A isenção representa um aumento de quase 7% no poder aquisitivo de uma pessoa, que poderá ser investido em gastos.”
O contador José Ricardo Cordeiro exemplifica em números essa transferência de tributação que, de acordo com ele, é uma forma de deixar a arrecadação mais justa no país. “Eu tenho clientes que recebem R$ 1,2 milhão em lucro por ano e não pagam Imposto de Renda porque a retirada pró-labore é mínima. Já outros que recebem R$ 6 mil de salário, pagam R$ 4.099,44 de IR por ano. Na minha visão, essa mudança representa uma adequação de distribuição de renda, já que, no Brasil, só paga imposto quem recebe salário, e os empresários acabam se esquivando dele”.