Entre janeiro de 2024 e janeiro de 2025, a Agência de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) de Juiz de Fora registrou 314 reclamações relacionadas a pacotes turísticos, excursões e agências de turismo na cidade. As queixas vão desde oferta não cumprida, atraso na devolução de valores pagos, cobrança por serviço não fornecido até falta de contrato e dificuldades para alterar ou cancelar o serviço. Para o advogado João Paulo Silva de Oliveira, especialista em direito do consumidor, o número acende um alerta para o que o consumidor deve fazer ou evitar na hora de fechar um pacote de viagem.
A quantidade de reclamações registradas contra empresas desse segmento em Juiz de Fora é elevada, na avaliação dele. “É um número muito alto. Levamos em conta essas pessoas lesadas, mas, além delas, há muitas outras que entraram direto na justiça ou não reclamaram”, diz o advogado, ao acenar para a possibilidade de que o número de consumidores prejudicados seja ainda maior.
Diante desse cenário, Tainah Marrazzo, superintendente do Procon, expõe as possibilidades que estão ao alcance do consumidor. Ela menciona que, quando uma agência de turismo não cumpre com as condições acordadas, existe a chance de solicitar reembolso total ou parcial do valor pago e indenização por eventuais prejuízos, além de firmar acordos para cumprimento do serviço.
Empresa de trilha com onze reclamações
Uma mulher, que preferiu não ser identificada, relata que foi ao Procon após uma empresa de trilhas mudar a data da viagem, exigir 20% em taxa de cancelamento e não realizar o reembolso. Quando chegou na agência, ela descobriu que o local já havia sido alvo de outras diversas denúncias. De acordo com o Procon, a empresa de trilha acumulou onze reclamações oficializadas junto ao órgão. A informação só foi descoberta pela consumidora após o problema.
Segundo conta, a empresa havia vendido uma viagem à Paraty, no Rio de Janeiro, com partida durante a madrugada de sábado, 18 de janeiro deste ano. Doze horas antes, a contratada informou que, por decisão majoritária, o percurso teria a data postergada para um novo dia ainda a definir, pois na praia havia previsão de chuva. Fazia sete dias que a mulher havia feito a compra do serviço e, diante do adiamento, resolveu cancelar o negócio.
Logo ela foi informada que teria que pagar taxa de 20% sobre o valor do pacote devido ao cancelamento. A demora até o reembolso, segundo ela, fez com que o questionamento fosse levado às redes sociais da empresa – momento em que foi bloqueada. Por meio de seu perfil nas redes sociais, a mulher compartilhou o que havia acontecido. Foi quando levou o caso até a imprensa e ao Procon. Dias depois, ela relatou que havia resolvido o problema. Ao ser questionada pela reportagem, a empresa informou que “todos os processos do Procon estão sendo devidamente tratados individualmente, com cada cliente. A grande maioria já foi resolvida com os devidos acertos e reembolsos realizados. Estamos trabalhando para solucionar as dificuldades relacionadas às remarcações e reforçamos que todos os clientes estão em contato direto conosco para garantir um atendimento rápido e eficiente”, finalizou a nota.
A empresa relatou, ainda, que adotou medidas para evitar novas reclamações. Desta forma, revisaram a política de cancelamento e remarcação de modo a abarcar também situações adversas – como as condições climáticas dos destinos. “Anteriormente, em casos de mau tempo, os eventos eram remarcados sem a possibilidade de reembolso, já que tínhamos custos fixos com fornecedores — como, por exemplo, reservas de balão, que não eram reembolsáveis para nós. Esse modelo funcionou bem por cerca de cinco anos, mas, recentemente, notamos um aumento nas insatisfações”, disse a empresa de trilha. Agora, em caso de adiamento, eles informaram que dão ao cliente a escolha entre remarcar a data ou receber o reembolso.
Sob a perspectiva da superintendente do Procon, Tainah Marrazzo, “quando uma agência de turismo não cumpre com as condições acordadas, o consumidor tem o direito de exigir a reparação dos danos”. As reclamações, quando formalizadas, passam a ser monitoradas e encaminhadas para o Departamento de Apuração de Práticas Infrativas para apuração. “Em caso de irregularidades comprovadas, o Procon pode aplicar sanções”, explica.
O que o Código do Consumidor diz sobre prazos
De acordo com o Procon, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) não prevê prazo específico para cancelamento ou adiamento de viagens, mas deve ser informado com antecedência e ter o consentimento do consumidor. Ou seja, desde que a empresa aja de boa-fé e não prejudique o usuário é permitido remarcar, contudo, é considerada prática abusiva a taxa de cancelamento quando se dá por iniciativa do fornecedor.
Já o cliente tem o direito de desistir do contrato no prazo de sete dias – a contar do ato da assinatura. Nesse prazo, a pessoa pode exercer o “direito de arrependimento”, previsto no CDC. “Os valores eventualmente pagos serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados e sem aplicação de multa, em casos de compras feitas fora de estabelecimentos comerciais, como pela internet. Agora, se a compra for feita presencialmente, em uma agência de viagens, por exemplo, esse direito não se aplica. Nesses casos, a política de cancelamento da empresa será aplicada”, destrincha o Procon.
Reclamações nas redes sociais: sempre uma questão de bom senso
É no espaço virtual que algumas manifestações têm ganhado forma. No caso da consumidora citada acima, ela usou também as redes sociais durante a busca para resolver sua situação. Sobre isso, o advogado observa a importância de plataformas como ferramenta e cita o “Reclame Aqui”, para o consumidor consultar o feedback de outros consumidores. Há, ainda, o Cadastur, do Ministério do Turismo, que auxilia na checagem do registro da empresa, o que tende a diminuir a probabilidade de fraudes e irregularidades.
Oliveira, advogado, comenta que essa medida já adotada por algumas pessoas precisa ser amparada pelo “bom senso”. “É muito importante que essas manifestações sejam feita nas redes sociais e nos sites adequados”, acena. Ele ressalta a diferença entre os crimes de calúnia e difamação e uma legítima manifestação enquanto consumidor. “É importante que o consumidor sempre utilize o bom senso, respeitando a liberdade de expressão, mas também o direito das empresas, da marca. O bom senso sempre é muito importante a ser utilizado, em uma manifestação, crítica e reclamação”, indica o advogado.
Além disso, ele destaca a existência de sites especializados para reclamações e a importância de procurar o local adequado para manifestar a indignação com um prestador de serviço. “É importante entrar em contato com o SAC da empresa ou diretamente com o agente e depois procurar os órgãos administrativos, como “consumidor.gov”, Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (CDECOM) e Procon. Se, infelizmente, não resolver, deve-se também procurar um advogado de sua confiança ou a justiça.”
O Procon também orienta os consumidores que tiverem dúvidas ou que se sentirem prejudicados na relação com as agências de turismo a entrarem em contato pelos telefones (32) 3690-7610, 3690-7611, WhastApp (32) 98432687.