Lembro-me bem da primeira vez que entrevistei Rafa Castro. Deve ter sido pelos idos de 2014, pois o projeto “Teias”, parceria com o pianista, compositor e arranjador Túlio Mourão, ainda nem havia sido lançado oficialmente. A Redação da Tribuna ainda ficava às margens do Paraibuna, eu tinha longos cabelos que hoje mal chegam aos ombros, e Rafa tinha, em mãos, para que eu ouvisse, o disco que unia quatro mãos, dois pianos, e que foi um grande marco na carreira do jovem músico, de apenas 30 anos (25, na época). “Foi um momento muito importante, porque foi quando decidi que a música tem papel fundamental na minha vida. E foi meu encontro com Túlio, desde sempre uma referência enorme no piano, e que, além de se tornar um tutor importantíssimo, me mostrou a vida, chancelou minha história, me deu aval para seguir como pianista e compositor. E a partir daí minha carreira foi se construindo”, diz Rafa, que lança “Fronteira” (2017), seu último álbum, no Museu de Arte Murilo Mendes (Mamm), nesta quinta (27), como parte do projeto Musicamamm.
O disco é um trabalho de reencontros. Com Minas, a peculiaridade do interior (como de sua São João Nepomuceno de nascença), com Juiz de Fora e com o canto. “Comecei na música com uns 13, 14 anos, com o canto, depois com o violão para acompanhar. Mas quando conheci o piano foi tão arrebatador que me debrucei completamente sobre ele. Quando voltei a compor, o canto voltou também. Meu processo criativo é muito ligado à minha posição vocal, e fui redescobrindo minha voz, meu cantar, me vendo como ‘cantautor’. Desde então, venho sentindo uma completude em meu trabalho, um movimento de retorno a minha história mesmo”, conta o músico.
Segundo ele, que vive em São Paulo há três anos e também teve uma trajetória significativa como compositor de trilhas originais (para teatro e cinema, mas sobretudo o último), “Fronteira” é um retrato honesto de seu momento pessoal e profissional. “Não consigo desvincular minha carreira artística da minha vida, então esse disco é muito fiel ao que eu estava vivendo, ao que estava apostando quando me mudei para São Paulo. Ele fala de fato da fronteira, esse terreno em que as separações não são muito claras, onde as coisas se misturam. Então há ricas influências de diversos lugares e momentos, há Minas e São Paulo, há música instrumental e canção, em linhas fronteiriças muito tênues”.
Para Rafa, a ida para São Paulo após anos vivendo em Juiz de Fora teve um impacto decisivo em sua trajetória. “É uma cidade megalomaníaca, tudo é muito grande. É uma mãe que ao mesmo tempo que me cobra me oferece muitas coisas. Então, foi muito influenciado, claro, pela produção fértil e diversa da música popular e do jazz, e por músicos multifacetados, por esse turbilhão de informações. Mas também fui sentindo a necessidade de me reconectar com meus princípios, minhas raízes, o que havia dentro de mim. Até para poder saber como absorver toda essa riqueza”, avalia Rafa, para quem o retorno a Juiz de Fora para o lançamento de “Fronteira” é muito simbólico. “Parte desse repertório nasceu em Juiz de Fora, apesar de ter sido acabado e costurado em São Paulo. O disco tem algumas parcerias com artistas daqui (JF), então este retorno é como ver um ciclo acontecendo. Gosto de ver a vida às vezes como ciclo, às vezes como uma linha contínua. Seja como for este trajeto, ele diz muito sobre a completude deste disco”.
“Fronteira”
Lançamento do álbum de Rafa Castro, nesta quinta (27), às 20h, no Museu de Arte Murilo Mendes (Rua Benjamin Constant 790)