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Di Melo e Silva Soul se apresentam juntos na Festa da Cerveja

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Ele atende o telefone e não há dúvidas. Aquela voz rouca, grave, imponente, que soa quase como quando se canta, com os “erres” bem marcados, só pode ser de Di Melo. “É, minha voz é um marco. É interessante”, assume. O artista que atiça a curiosidade. “Que assim seja – curioso”, diz. Gosta dos mistérios. Vive deles porque acredita que se tem que viver entendendo, o tempo todo, que a vida é uma, ou una, como diz, e logo solta um texto que parece decorado, mas tão natural: “Costumo dizer que a vida é una. Se nela você não faz aquilo que tenha lhe prazerado, se você está aqui e não sabe até quando irá ficar, nem há como considerar o que possa vir a ser ou se chamar. Viva. Ninguém jamais conseguirá viver suas emoções. Pessoas sensíveis sempre emocionam e fascinam”. Ele emociona e fascina, é verdade.

Os jovens de todas as idades, como brinca, bebem de Di Melo com sede. E o poço não seca. “É um baú fantástico. Uma fonte de criatividade e inventividade infinda. Pura iluminação. Coisa de Deus.” Aos 74 anos, acredita que está vivendo sua melhor fase, porque faz o que dá vontade. Ele teve vontade de repetir o encontro com a banda juiz-forana Silva Soul. “Adoro eles. São bem legais. Tem uma vibe sonora muito a ver com a minha história, minha ideia. Eu acho que eles fazem um som muito futurista, independente de qualquer interdependência, e eu gosto muito do embalo, do balanço. Adora criatividade e inventividade. É por aí: esse caminho, senão fica tudo estagnado. Tudo parecendo igual.”

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A junção de Silva Soul e Di Melo aconteceu quando o artista recifense lançou uma reedição de seu clássico, o disco de 1975, que leva seu nome. A parceria perdurou e passou por algumas cidades. Agora, a banda, que está ainda nos embalos de comemoração de seus 20 anos, tem a oportunidade de reviver esse encontro na Festa da Cerveja, organizada pela Unicerva, que começa nesta sexta-feira (26) e segue até domingo (28), no Parque Halfeld. O show é no sábado (27). No mesmo dia, as bandas Ingoma e Roça Nova também se apresentam, e os trabalhos, regados a cerveja, começam às 11h.

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A junção de Silva Soul e Di Melo aconteceu quando o artista recifense lançou uma reedição de seu clássico, o disco de 1975, que leva seu nome (Foto: Divulgação)

Se existe desespero é contra a calma

A vida de Di Melo é curiosa porque envolve fazer suas próprias vontades, o que dá na telha mesmo. Ele ficou tempos e mais tempos sem lançar um trabalho novo por decepção com o mercado musical. Assim que lançou seu disco em 1975, gravado pela EMI-Odeon, ele já rodou. Suas músicas não saíam da rádio. Ao mesmo tempo, gravou outras canções com nomes também em alta, como Wando e Jair Rodrigues. Ou seja: sucesso puro. Mas quando foi receber o direito autoral: “Só tinham 11 cruzeiros. Surrupiaram minha grana. E aí começa uma decepção. Não que você trabalhe para ganhar dinheiro, mas que bom que você consiga trabalhar e sustentar sua vida com seu trabalho”. 

Foi forte a queda do seu império

Um trauma e, por isso, ele decidiu dar um tempo nas gravações, mas não na produção. “Pedi rescisão da gravadora e fui para os mares da vida. Fazia shows na praia. Nunca parei de cantar, de compor. Mas eu ‘destesonifiquei’. Se eu tivesse a ideia que tenho hoje, a cabeça que tenho hoje, eu ia contratar um advogado, ia brigar e resolver. Eu era jovem e, quando você é jovem, acha que é eterno. Parece que o tempo não passa. Então eu decidi me eximir. Porque desde que você faz um trabalho e ele se sobressai começa muita dor de cotovelo, muita inveja. E sempre houve um olho grande em cima do meu trabalho, da minha função em si, em suma. E isso fez com que eu me ‘destesonificasse’. É por aí.” 

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Eu vi chover em minha horta

Apesar disso, seu primeiro disco continuou circulando, e muito. “Porque ele é clássico, show, palco. Tem pegadas, tem levadas, as músicas foram previamente escolhidas a dedo. São muito bem arranjadas. E é um disco atemporal. Ele vem a décadas se colocando no mercado. Quando eu saí de cena, houve uma bronca, e o pessoal entrou naquela história de que deveria entrar no esquecimento. Ledo engano. Os Djs de fora assimilaram o disco e começaram mesmo a produzir, a tocar e jogar os grooves em cima. Esse disco apareceu no clipe do Black Eyed Peas. Porque perguntaram para eles que som do Brasil eles gostavam, e falaram Jorge Ben e Di Melo. Pirou geral. Foi incrível.” Seu trabalho chegou e foi reconhecido no exterior. 

Vendo, sabendo, sentindo

Aos 74 anos, Di Melo acredita que está vivendo sua melhor fase, porque faz o que der vontade (Foto: Divulgação)

Em uma viagem à Holanda, por exemplo, ele conta que andava e ouvia suas músicas, como “Kilariô” e “A vida em seus métodos diz calma”, na gringa. Em uma loja de vinis, encontrou seu disco custando 700 euros; outro, detonado, por 380. “Quando eu falei que era o Di Melo, os caras não sabiam se riam, se choravam, ou se me matava para o disco valer mais”, ri. E, realmente, um boato por tempos circulou de que Di Melo havia morrido. Não à toa, ainda mais depois de um acidente grave em 1990, ele ganhou o nome de “Imorrível”. Com esse nome, lança-se um documentário sobre ele, que venceu vários prêmios, a partir do seu retorno aos palcos e, então, um disco, em 2016. Recentemente, ele lançou o “Atemporal”, com o grupo francês Cotonete, que cai no jazz. “A coisa vai se assimilando. Realmente, o público jovem de todas as idades está aderindo ao som. As pistas lotadas.” 

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Ou então vou aceitar tudo do jeito que está

Mais recentemente, vários músicos brasileiros da nova geração gravaram o “Podível e impodível”, interpretando as canções do disco de 1975. Ele ainda regravou a música “Minha estrela”. “Eu costumo dizer que nada é impodível para o imorrível. O impoderável. A mim me surpreendeu que eles tivessem essa sensibilidade. É muito interessante. Muita gente boa fazendo virar e acontecer.” Di Melo cita uma série de nomes da nova geração que admira, ao mesmo tempo que teme que a música tenha ficado igual: acha que as vozes e os estilos são sempre o mesmo. Mas há salvação? “Diz que a moda de viola muda no modo de se escutar. Não se muda o violeiro no seu canto modular, que a moda já é modelo que a vida tem para mudar. Acho que tudo que está em cima agora pode ir para baixo, e o que está em baixo, vai para cima. É a rotatividade. Não para. É como a vida: quem fica parado é poste.”

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