Ícone do site Tribuna de Minas

Para manter a memória viva

companhia mineira de eletricidade

companhia-mineira-de-eletricidade

PUBLICIDADE

Companhia Mineira de Eletricidade

Companhia Mineira de Eletricidade

PUBLICIDADE

Usina de Marmelos, a primeira da América do Sul

Nascido no ano de 1847 na pequena Paraopeba (MG), o empresário e industrial Bernardo Mascarenhas conseguiu deixar marcado seu nome em Juiz de Fora mesmo tendo morado na cidade por pouco mais de uma década. Mudando-se para cá em 1885, foi um dos responsáveis por conferir ao município o título de “Manchester mineira”, graças às suas iniciativas que ajudaram no desenvolvimento industrial e econômico, como a instalação da Companhia Têxtil Bernardo Mascarenhas, a criação da Companhia Mineira de Eletricidade e a construção da Usina Hidrelétrica de Marmelos, a primeira da América do Sul e que permitiu que Juiz de Fora fosse a primeira cidade sul-americana a contar com o serviço público de energia, ainda em 1889. Sua história, assim como tantas que sofrem com a passagem do tempo e o avanço das gerações, sempre corre o risco de se perder. Para evitar que isso aconteça, o CCBM – instalado no prédio da antiga Companhia Têxtil – vem realizando um trabalho de pesquisa e aquisição de documentos, fotos e demais objetos da época de Bernardo com o objetivo de voltar com o memorial que foi criado para homenagear o empresário em 2008 e tirado de exibição por volta de 2011, segundo informou o superintendente da Funalfa, Toninho Dutra.

Ainda de acordo com Toninho, o memorial havia sido montado em um local inadequado (o hall de entrada do CCBM) e por isso foi realocado para outra área. “Ele precisava de algumas revisões, correções a serem feitas, e por isso foi retirado por volta de 2011”, explica, destacando que a Funalfa tem dado todo apoio para a volta do memorial, mas que é preciso encarar o momento econômico difícil pelo qual a prefeitura e o país vêm passando.

PUBLICIDADE

O diretor do CCBM, Alexandre Guttierrez, ressalta que um dos problemas que fizeram a exibição do memorial ser suspensa foi o problema com os painéis que contavam a história de Mascarenhas, feitos em plotagem e que começaram a se descolar. Atualmente, eles estão encobertos por tapumes onde está sendo realizada uma das exposições do centro cultural. “O restante do material que ficava em exposição (documentos, peças da época da construção do Museu de Crédito Real) estão guardados. A ideia é fazer um novo memorial, cujo projeto está em andamento e não tem data para ser implantado devido a toda pesquisa que vem sendo feita”, diz, acrescentando que a intenção é que ele fique no andar superior, no hall em frente à sala de vídeo. “Queremos que seja um memorial ampliado, por isso estamos pesquisando e procurando todo o material sobre o Bernardo Mascarenhas que possa fazer parte do memorial.”

Alexandre diz que os descendentes de Bernardo já foram procurados para ajudar a incrementar o acervo da instituição e que o tem contado com o apoio de diversas pessoas da cidade, incluindo fotógrafos, o historiador Roberto Dilly (também diretor do Museu de Crédito Real) e o cineasta Wilton Araújo para encontrar fotografias e documentos antigos, assim como peças do maquinário da antiga fábrica.

PUBLICIDADE

Antes do memorial permanente, a direção do CCBM trabalha com a possibilidade de uma exposição de fotografias no segundo semestre, dependendo de questões burocráticas – tais como a necessidade ou não de fazer licitação para imprimir reproduções das fotografias. “É importante voltar com o memorial, pois o Bernardo Mascarenhas é uma figura marcante na história da cidade. Sempre há visitantes que questionam sobre a vida dele”, destaca Toninho.

O superintendente ressalta que a exposição do memorial, quando ficar pronta, não será restrita às paredes do CCBM. “A memória do Bernardo como um grande cidadão de Juiz de Fora não interessa apenas ao CCBM. Ela deve ser itinerante e frequentar outros locais, como a Usina de Marmelos, a UFJF e escolas do município.”

PUBLICIDADE

Mobilização e ideias

O cineasta Wilton Araújo tem se mobilizado para que o memorial volte a ser exibido. Natural de Barbacena, ele vive em Juiz de Fora desde 1974 mas só foi ter noção da importância de Mascarenhas quando precisou fazer, na década passada, um documentário para o curso de cinema. “Eu tinha como ideia fazer sobre o Rio Paraibuna, mas ao conhecer a Usina de Marmelos resolvi fazer o curta ‘Hulha-Branca’, sobre a hidrelétrica e o Bernardo Mascarenhas.” Desde então, ele chegou a organizar por três anos um concurso escolar que tinha o empresário como tema. Ao tomar conhecimento da existência do acervo para o material, Wilton diz ter procurado e prefeitura e o CCBM para mostrar seu interesse em que a exposição fosse retomada, inclusive repassando o material que tinha (fotografias, vídeos) para o centro cultural.

“Tenho conversado com a família Mascarenhas a fim de conseguir objetos para a exposição, e eles têm se mostrado interessados”, anima-se Wilton. Segundo o advogado Bernardo Nunes Mascarenhas, bisneto do fundador da indústria têxtil, a família tem ajudado Wilton em sua missão. “Temos o interesse de manter o legado dele, que é enorme. Infelizmente não temos instrumentos da Companhia Têxtil Bernardo Mascarenhas, mas vamos procurar documentos, fotos antigas, para ajudar no memorial”, assegura.

Apesar de não esmorecer em seus esforços, Wilton Araújo demonstra certa tristeza com a forma como o legado de Mascarenhas foi tratado. “O que lamento é a cidade estar com uma memória cada vez pior, esquecendo suas personalidades. Na Usina de Itaipu, por exemplo, você tem um memorial do Mascarenhas, visto por muitos como um dos responsáveis pela modernização do país. A cidade era conhecida como ‘Manchester mineira’, mas hoje temos quase nada a respeito (dessa época). Estive na Europa ano passado e vi muitos memoriais em homenagem a figuras importantes. Isso poderia ajudar a aumentar o turismo, trazer as pessoas para conhecer essas histórias”, acredita.

PUBLICIDADE
Prédio foi por décadas a sede da Companhia Têxtil Bernardo Mascarenhas (Foto: Ramon Brandão/Divulgação)

O imaterial tão importante quanto o material

O diretor do Museu do Crédito Real, o historiador Roberto Dilly foi o responsável – com a jornalista Rita Couto – pela reunião do material que resultou na implantação do memorial, em 2008, a pedido do ex-prefeito José Eduardo Araújo. “Eu sempre falava com ele sobre como Juiz de Fora tem algumas coisas curiosas. O CCBM, por exemplo, não tinha uma linha sobre o Bernardo Mascarenhas ou uma foto dele. Que homenagem era essa? Então fizemos quatro banners e também doei uma série de documentos. Encomendei um quadro do Bernardo, fizemos uma placa de bronze e montamos a exposição no hall de entrada”, lembra o historiador, que diz não ter sido procurado para ajudar na nova montagem, mas que estará à disposição caso isso aconteça.

Toda essa questão deveria servir para se discutir a memória histórica de Juiz de Fora. “Na verdade isso não deve ser feito só com a história do Bernardo, pois a cidade é pioneira em tantas coisas. Eu considero Juiz de Fora, hoje, sem identidade, sendo que já foi a ‘Manchester mineira’. Precisamos redescobrir essa identidade. Nós temos 20 museus abertos, e as pessoas não os conhecem. Sou diretor de um museu na esquina da Halfeld com a Getúlio Vargas, com um letreiro enorme, 52 anos de existência, perto de um ponto de ônibus, e se você chegar para as pessoas que estão todos os dias ali e perguntar onde fica o museu elas não vão responder. Temos muitos problemas financeiros, que prejudicam a possibilidade de divulgação”, reconhece. “Mas a pessoa passa pela placa, não lê, ela não se interessa. Há uma necessidade de se mudar a cultura”, acrescenta Roberto, que tem como sugestão a existência de uma lei que tornasse obrigatório o ensino nas escolas da história do município. “Já temos uma preocupação com o tombamento de imóveis, mas preservar o patrimônio imaterial é tão importante quanto.”

O superintendente da Funalfa, Toninho Dutra, ressalta outro ponto que pode ser discutido a partir da preocupação da preservação da memória das figuras públicas. “Nós não podemos nos preocupar apenas com a memória de uns poucos homens, mas de todas as figuras anônimas que fizeram a história da cidade e que pouco são lembradas também. Este é o caso, por exemplo, dos trabalhadores da fábrica do Bernardo Mascarenhas. Eles são tão importantes quanto Henrique Halfeld, Bernardo Mascarenhas, Baptista de Oliveira, mas são pessoas que ninguém reclama por elas.”

Sair da versão mobile