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Joãozinho da Percussão: ‘O rei da percussão’

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(Foto: Felipe Couri)
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Eu te chamo de você ou senhor? “De Joãozinho mesmo.” Na verdade, seu nome virou Joãozinho da Percussão de Juiz de Fora, né? Era assim que os músicos te apresentavam nos shows. “Pois é. Eu fazia questão disso. Eu achava legal. Gostava e pedia. Era uma marca.” Com 84 anos, João Baptista Pereira ainda é da percussão e de Juiz de Fora. Alguns problemas de saúde, hoje, o fazem se distanciar dos instrumentos. Mas, ao pegar no pandeiro, o seu preferido, dentre tantos, o reconhece logo como extensão de sua mão. Aos poucos, o gingado toma conta de seu braço, e ele toca, com o ritmo de sempre. “Isso (o ritmo) eu não perco”, diz, assumindo que ficou um bom tempo sem tocar. E promete: “Vou voltar, porque eu gosto”.

Ele vai voltar porque precisa disso, da música. “A música é tudo. Sem ela a gente não vive.” A arte já fazia parte de sua família e ele tinha a oportunidade de ver seu tio ensaiando em casa, quando ainda era menino. “Ele armava os instrumentos, ia tomar banho. E eu sentava e ficava brincando, como se soubesse tocar. Eu devia ter uns cinco anos.” Mas ele só se tornou músico porque decidiu percorrer um outro caminho na rotina do seu dia. “Eu estava andando na rua e uma menina me olhou. Eu dei bola. Fui atrás dela. Ela entrou em um lugar e eu fui entrando. Eu cheguei e, quando olhei, era o meu tio que estava tocando. Eu nem vi a menina mais. Fiquei perto do meu tio e fui tocando. Assim começou. Nunca mais parei.”

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Para seguir esse caminho, no entanto, foi preciso o que ele chama de “jogada”: “Eu trabalhava em uma loja, fazendo entrega de brinquedo. Quando eu comecei a tocar, comecei a abandonar a loja. Para não ter que ficar preso em loja, eu comecei a viajar. Tocar. Eu sabia que tinha que ser músico. Não tinha como ser outra coisa, não”. Joãozinho começou atuando em Juiz de Fora, tocando principalmente em bandas de baile. Em uma dessas noites, ele conta que chegou um músico que gostou da forma como ele tocava. “Ele falou que era de Belo Horizonte e que ia falar com o Célio Balona (pianista, acordeonista e compositor mineiro) para eu tocar com ele. E eu realmente fui. Comecei em Belo Horizonte e segui carreira.” A partir de Balona, outros músicos conheceram Joãozinho, e, nesse caminho, ele tocou com Jorge Ben Jor, Pepeu Gomes, Baby Consuelo, Chico Buarque, Joyce, entre tantos outros. Em Juiz de Fora, depois de já ter rodado mundo, ainda participou da primeira formação do Lúdica Música.

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“Sempre dei sorte, graças a Deus, porque sempre fui chamado.” Sorte e técnica, tão sua que é assinatura. Esse modo de tocar tem até uma explicação. Quando pequeno, havia pessoas que Joãozinho admirava tocando. Seu tio, por exemplo. Mas quando é perguntado se ele se inspirava em alguém, logo responde: “Eu não tocava por causa de outra pessoa. Eu tocava porque eu nasci para isso, eu acho”. Apesar de levar no nome a percussão, ele prefere dizer que é ritmista. “Porque percussionista tem que tocar piano, contrabaixo, um tanto de coisa que o ritmista não tem. Ritmista tem que tocar pandeiro, tamborim, bongô, uma série de coisas. Muito instrumento. Percussão é outra coisa. E música é prática, né? O pior instrumento para tocar é o pandeiro, o mais difícil, eu acho.” Até então, era o pandeiro que estava sobre suas pernas. Mas ele pega o tamborim, menor, e toca. O mesmo ritmo, e repete: “É. Ritmo eu tenho. Isso não perco”, apesar da mão que já é mais fraca.

“Eu até gosto de conversar. Mas sou tímido.” O que não parece, por exemplo, quando se vê a sua desenvoltura no palco, o sorriso de um lado a outro no rosto. “Mas no palco não sou tímido de jeito nenhum. Meu negócio sempre foi tocar em show”, admite. Seus 80 anos foram comemorados no Cine-Theatro Central, em 2019, do jeito que gosta: com música. Foi, também, o último show que fez. “Eu tenho saudade de tocar. E vou voltar.” Para a volta, ele já tem ideias. “A Ana Terra e a Nani Neto fizeram uma música que se chama ‘O rei da percussão’. Já tem um tempo. Eu, na hora, não aceitei, porque nunca gostei desse negócio de rei. Mas, de uns tempos para cá, achei legal. Agora, eu já aceitei esse termo. Porque eu já estou com 80 e tantos anos. De repente eu posso ser um deles (um dos reis).” Joãozinho quer fazer um show com esse nome, e já tem até os nomes para compor a banda. Ele deseja isso, ainda mais, como forma de voltar a praticar: estar, mais uma vez, íntimo da música.

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Na sala de sua casa, no Bairro Paineiras, onde mora desde os 10 anos, depois de se mudar do São Mateus, um tanto de quadros ocupa a parede. Entre fotos e desenhos, várias moções de aplauso e reconhecimento. “É legal ser inspiração para outras pessoas. Porque é uma gratificação a gente saber que tem uma pessoa tocando por minha causa. Isso é muito bom. Graças a Deus eu já recebi essa quantidade de placa que tem aí. Tem muita coisa aqui em casa, guardada.” Joãozinho ainda conta que um de seus netos, agora, passa a seguir seus passos. “Ele tem 11 anos. Ritmo ele tem. Ele me puxou. Ele gosta é de sambar. Eu gostava também”, ri. Mas o que te trouxe até aqui, Joãozinho? “Vontade. É. Foi vontade mesmo.” Não tem do que reclamar, né, dessa vida? “De jeito nenhum. Tenho nada para reclamar.”

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