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Instalação reúne câmeras para denunciar vigilância 24 horas

Rafael-Ski-Yuri Resende
Instalação de Rafael Ski captura a imagem do espectador e a exibe num telão sem o rosto (Foto: Yuri Resende/Divulgação)
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“Câmeras mostram homem sendo morto após briga”, “Câmeras mostram ataque a tiros que deixou três mortos”, “Câmeras registram cantor agredindo a ex”, “Câmeras flagram morte de presidente da torcida”, “Câmeras gravaram queda de viaduto italiano”, “Câmeras flagram meteoro 40 vezes mais brilhante que a Lua”. Protagonistas de tantas e diárias notícias, as onipresentes ferramentas de vigilância da vida estão em “Faceless people”, instalação de Rafael Ski que segue para seus últimos dias de exposição n’O Andar de Baixo, problematizando a exposição da vida moderna. Num emaranhado de fios e câmeras, o trabalho que disseca a brutalidade da ameaça contemporânea à privacidade também se volta para a despersonalização a que todos estão sujeitos. Todos são vistos. Ninguém é percebido. As câmeras que sequestram a imagem do espectador, retiram-lhes o rosto, subtraindo-lhes a identidade.

“Tudo é lido, tudo é visto, para que te vendam alguma coisa. Tudo acaba reduzido a uma cartela de consumo. E para isso usam o termo personalizado, customizado. Já nas redes sociais, incentivam que coloquemos tudo, e acabamos ultrapassando o limite da individualidade, assumindo um padrão, um personagem. Há uma contradição: está todo mundo se expondo, mas sem expor nada. Continuamos fechados numa bolha, sem mostrar quem somos. Ninguém está sendo vulnerável de verdade, como exigem as relações entre as pessoas, porque é preciso estar vulnerável para estar com o outro, exige coragem”, comenta o artista visual Rafael Ski. “O que move as redes hoje é algo superficial”, acrescenta ele, que há tempos carrega consigo o projeto, um dos mais arrojados da carreira. “Eu tinha o incômodo de me sentir vigiado o tempo todo. Lembro de, um dia, ter descoberto que meus e-mails eram lidos pelo servidor quando falei que enviaria um anexo, mas não anexei. Recebi uma mensagem dizendo que eu havia falado de mandar o anexado mas não havia anexo. Que bizarro isso!”

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Anterior à hiperexposição dos dias atuais, que nem mais precisam indicar “Sorria, você está sendo filmado!” para a horda de sorridentes, “Faceless people”, que conta com financiamento da Lei Murilo Mendes, levou três anos para se tornar viável. “Comecei como um corredor com câmeras, mas fui sentindo a necessidade de amarrar o pensamento. Foi aí que veio a imagem de um espelho que retira a identidade presente no rosto. Hoje vivemos isso, porque somos hipervigiados, nossos e-mails são lidos, nossas ligações são gravadas, mas o que dizemos e o que pensamos é irrelevante, porque o indivíduo parece não existir”, pontua Ski, que ao longo do tempo foi concretizando a engenharia e o conceito do trabalho genuinamente filosófico. “Meu discurso e meu pensamento são muito diretos e literais. Transmito literalmente a ideia que tenho para o meu trabalho. Apesar da loucura em que ele resulta – o ‘Palimpsestos’ com aquele mundo de portas e janelas, e o ‘Faceless’ com aquele um milhão de fios e câmeras -, a premissa é muito direta. Tento elaborar esteticamente para ter muitos detalhes e fazer o espectador imergir numa experiência que o leve à reflexão”, diz.

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Artista, sim, senhor!

Terceira exposição de arte interativa que Rafael Ski apresenta a Juiz de Fora, “Faceless people” retrata um percurso que pouco a pouco foi retirando do protagonismo o caráter estético para sofisticar a reflexão, essa sim, agora, protagonista absoluta. “Há uns oito ou dez anos, tive as primeiras experiências com a arte interativa. E comecei a ter mil ideias do que fazer com aquilo. Não tinha recursos, nem conhecimento, nem outras condições para fazer o que desejava. E fui pondo na gaveta. Em 2010, me inscrevi em um edital para fazer cinco instalações. Não tinha ideia do trabalho que dava. No meio delas, estava ‘Faceless’. E quando dei por mim, decidi fazer um caminho que começasse mais acessível ao público e às curadorias. Só assim eu iria começando um caminho. E se a primeira coisa que eu fizesse fosse ‘Faceless’, ninguém acreditaria que eu conseguiria, porque é superdifícil. E talvez eu não conseguisse. Então comecei por ‘Palimpsesto’, que tem uma valorização da memória, da cidade, e cabia melhor no início da trajetória. Depois fui para ‘O quarto do artista em Arles’, porque era grande e visualmente muito impactante. Foi então que fui buscando questões mais refinadas. Não sei para onde vou, mas espero continuar no caminho”, observa o artista.

Foto: Yuri Resende/Divulgação

Ainda que reconheça a naturalidade com que o título da mostra foi criado, Ski persegue a coerência mesmo nos acidentes. “Hoje não colocaria. Quando dei esse nome, pensava num design estético da linguagem, por ser algo que funciona, dizendo muita coisa em poucas palavras. Um amigo achou que eu havia colocado esse nome pensando num público estrangeiro, mas não foi esse o objetivo”, pontua o artista, que na escolha demonstra o lugar estrangeiro onde reside as ideias de invasão à privacidade rapidamente acolhidas pela sociedade brasileira, bem como os termos e expressões inglesas. A organicidade com que Ski compõe uma arte ao mesmo tempo tão complexa e tão acessível denuncia seu amadurecimento artístico. Graduado em artes e design pela UFJF, já tendo exposto numa das mais importantes galerias iranianas, a Mohsen Gallery, no Tehran, e integrado residências artísticas na Espanha e na Inglaterra, o juiz-forano pacificou um ofício que antes parecia inominável para alguém que cria atrás de uma tela de computador: “Sou artista visual e tento viver disso. O que me falta, mas buscando e acho que estou chegando, é a confiança de bater no peito e dizer que é isso que sou e faço. Ainda fico inseguro ao dizer, mas não tenho outra opção a não ser dizer que sou artista visual.”

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Faceless people
Visitação de quinta a domingo, das 19h às 22h, n’O Andar de Baixo (Rua Floriano Peixoto 37, 2º andar – Centro). Até domingo, 26 de agosto.

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