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Hupokhondría completa 15 anos em plena atividade e explorando diversas frentes

HUPOKHONDRIA 2
Gustavo (à esquerda) e Táscia (à direita em pé) reunidos com grupo para o projeto ‘Pôquer a seis” (Foto: Arquivo Pessoal)
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Um projeto narrativo. A preocupação é com os textos: suas formas, seus complementos e mais o que vier disso. Em 15 anos de Hupokhondría, essa ideia-primeira foi ganhando novas dimensões, outras ideias. Mas sem perder de vista o escrever. Afinal, é desse ato que surgem novos textos e, deles, nascem livros, curtas-metragens, peças e mais o que vier à cabeça. A pretensão dessa história toda? “Criar mesmo”, Táscia Souza responde. “A gente quer é dominar o mundo, mas, como falei, é tudo devagar”, brinca Gustavo Burla. “Só na próxima noite”, completa Táscia. Os dois, os fundadores, são a grande certeza disso tudo: da continuidade às novas ideias. Mas, com eles, mais um tanto de gente faz e dá forma ao Hupokhondría e suas narrativas. Esses 15 anos, completos neste mês, brindam o desejo de criar, de escrever, de colocar no mundo as inquietações que afligem a todos – mesmo.

O começo se deu despretensiosamente, como quase tudo. Táscia ainda trabalhava na Tribuna, e Gustavo em uma agência, antes de se tornar professor na UniAcademia. Ambos jornalistas, queriam escrever mais: menos os factuais do ofício, mais os factuais das vidas. “A gente ficava nisso: ‘Tem que escrever, tem que escrever’. E depois: ‘Um dia a gente escreve, um dia a gente escreve’, diz Gustavo. “Um dia a Táscia me mandou um e-mail falando: ‘Criei aqui um blog. Vou postar hoje (era uma segunda-feira) e na próxima semana é você. A gente fica revezando’.” O veredicto estava dado: em um e-mail, nasce o Hupokhondría.

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O primeiro texto, publicado pela Táscia, chama-se “Câncer”. O segundo, “Problema de coração”. A temática da doença já estava ali, nesse embrião. “Eu pensei: ‘Vou criar um blog chamado hipocondria para a gente escrever contos sobre essa temática’. A princípio pensei: ‘Será que eu crio uma blog sozinha e tal?’ Depois vi que não e chamei o Gustavo para a gente escrever juntos e ir alternando. Algumas semanas depois, a gente chamou o Zé Eduardo (José Eduardo Brum) e passamos a ser nós três: cada semana a gente escrevia e cada semana era um que escrevia. E extrapolou essa coisa da doença física. Sempre existe um ponto de inquietação nos textos, uma enfermidade, mas não necessariamente física. Pode ser social, emocional etc.” Por um problema técnico, o blog precisou mudar de plataforma e, na nova, o nome “hipocondria” já existia, não tinha como repetir. Eles foram na etimologia da palavra e decidiram colocar “Hupokhondría”.

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Esse formato de texto, de toda segunda-feira ter uma publicação de autoria de um deles, existe, há 15 anos, de maneira ininterrupta. José Eduardo se manteve no ciclo por tempos, mas saiu, e, vez ou outra, dá as caras. Mas Táscia e Gustavo se mantêm revezando. Outras pessoas são convidadas a escrever e postar. Sempre na segunda-feira. (Uma pausa: “Aliás, você me mandou texto hoje?”, Táscia pergunta. “Tenho que revisar”, responde Gustavo. A entrevista foi feita na segunda: e essa dinâmica persiste, há 15 anos, “sem perdão”, admite Gustavo.)

Em cena

Além dos textos, o Hupokhondría foi incorporando outros formatos e projetos. A primeira foi o teatro. Esse grupo de pessoas ligadas ao projeto, de certa forma, já estava ligado a outros grupos. Principalmente o teatro foi o grande ponto de encontro que uniu todo mundo. A vontade de lançar uma peça do Hupokhondría foi natural. “Foram quatro anos de blog, só blog, mais nada”, pontua Gustavo. Até que em 2012, no Festival de Cenas Curtas de Juiz de Fora, eles estreavam o “Rolhas”. Naquele ano, Táscia e Gustavo passaram a integrar também o T.O.C.: uma companhia de teatro que, na verdade, não tem nada a ver com o Hupokhondría, apesar de ter, sim. Em 2013, ambos montaram um espetáculo junto com a nova companhia. No ano seguinte, como o T.O.C não tinha nada para apresentar, apesar de ter uma data reservada no Espaço Mascarenhas, Táscia e Gustavo, então, aproveitaram a oportunidade para estrear, pelo Hupokhondría, o “Alguma coisa você tem”, que reúne cinco cenas curtas, nascendo o primeiro espetáculo do projeto.

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Táscia Souza e Marisa Loures no espetáculo ‘Educandário São Bernardo” (Foto: Divulgação)

T.O.C. e Hupokhondría conversam, mas são coisas diferentes. “Porque o Hupokhondría sempre foi um projeto narrativo”, afirma Gustavo. “Existia como escrita. E o T.O.C era nosso grupo de teatro quando a gente decidiu voltar a fazer teatro”, completa Táscia. “A gente não tinha a menor pretensão de fazer teatro com o Hupokhondría”, afirma Gustavo. E Táscia finaliza o pensamento: “E acho que a gente continua não tendo. O objetivo do Hupokhondría no teatro continua sendo contar histórias. É diferente da relação que a gente tem com o teatro no T.O.C.. Lá éramos um grupo de teatro encenando um espetáculo. No Hupokhondría, o ponto primordial é o texto. Mas ambos conversam sim em razão de nossa origem em comum. É tudo junto mesmo”.

No teatro, além do espetáculo de estreia, eles fizeram também o “A linha 2” e “Educandário São Bernardo”, que rodaram muitos festivais mineiros. “Saiu de um texto por semana para outras coisas além. A grande distinção é que, quando se pensa em teatro de grupo, por mais que se tenha uma liderança, na hora de agir todo mundo agia. No Hupokhondría, a gente centraliza isso. Não dá para fazer a produção em grupo porque a proposta não é essa”, enfatiza Gustavo, lembrando dos anos em que fazia parte do Grupo Divulgação. “Não é um coletivo. A gente chama de projeto narrativo. Ainda assim, a gente vem de outras experiências de coletivo, de grupo. E acaba trazendo essas pessoas para dentro do projeto”, afirma Táscia.

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Estudos e mais textos

Depois, então, vieram os livros. O primeiro deles é o “99 receitas”: uma coletânea com 99 contos. 33 escritos por Táscia; 33 por Gustavo e 33 por José Eduardo. Todos colocados na ordem que foram publicados no blog. “E deixamos a assinatura para o final, para quem ler não saber de cara de quem é o texto”, explica Táscia. Depois, então, veio o “Pôquer a seis”, que, no dia da entrevista, completou exatos cinco anos de lançamento. Ele é resultado de um outra “perna” do Hupokhondría, o Estudos Matemáticos. A proposta desses estudos é promover reuniões para estudar a escrita, as formas de narrativa. “A gente tinha um amparo teórico, textos que a gente trazia para a discussão, e a gente fazia um exercício de escrita no final”, diz Táscia. Um dos exercícios foi o de escrever roteiros para o cinema. Cada um escrevia uma sinopse e o outro continuava e, assim, ia rodando, parte por parte, até fechar o roteiro. Mas o grupo queria esquematizar uma forma de não repetir as sequência. “A gente tentou fazer uma análise combinatória, calculando mesmo, para dividir os textos. O que deu errado. Foram duas horas fazendo isso. Estudos Matemáticos, esse nome, é uma grande ironia porque a gente não sabe matemática. No mesmo dia a gente mudou o nome do grupo.”

O grupo de estudos segue até hoje, atualmente com quatro pessoas: Táscia e Gustavo, Mariana Virgílio e Elena Duarte. Sempre foram seis pessoas, que é o que cabe na mesa da casa de Táscia e Gustavo. Mas desde a pandemia o grupo ficou em quatro. Desse grupo surgiu também o “Literalmente”: uma outra experiência literária que está disponível no site do Hupokhondría. Atualmente, eles estudam a literatura infanto-juvenil e, já já, partem para estudar a literatura policial.

Também nas telas e nos ouvidos

É tanta coisa que eles quase se esqueceram: tem os projetos audiovisuais e os podcasts. Esse último, que tem o nome de “Phármakon”, nasceu na pandemia. A ideia era, simplesmente, ler os textos que eles já tinham escrito. “O podcast veio a calhar em um momento que a gente não encontrava as pessoas. Era uma forma de estar juntos, continuar convidando pessoas”, afirma Táscia. Ele teve três episódios. Já os projetos audiovisuais também partem dos textos escritos por eles e estão disponíveis no YouTube em curtas de diversas temáticas. Ou seja: sempre foi pela escrita.

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Do blog, eles passaram a existir, também, nas redes sociais, sobretudo no Instagram. “Porque acho que todo mundo que tem blog, ou já teve, sabe que os acessos caíram. E, aí, teve essa migração para as redes sociais. A gente passou a postar direto no Instagram. Mas ainda posta e tem no blog, mesmo que os acessos e as leituras sejam por outros caminhos”, justifica Táscia. “O blog fica como arquivo. Tem tudo lá”, diz Gustavo.

Sobre o que virá, eles afirmam que tem muita coisa esperando o momento certo para sair da gaveta: outra coletânea de contos publicados no blog; uma peça; mil ideias. Além das duas peças que, quem sabe, podem voltar a circular.

 

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