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‘O stand-up veio para ficar’

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"No humor vale tudo", dispara o comediante Marcelo Bonfante. O "politicamente correto", censura travestida de "humor inteligente", não é definitivamente a tônica da comédia. Na arte de provocar o riso, pouco há que se limitar. "Existe público para todos os gostos", afirma.

O humorista ministra na cidade, a partir do próximo sábado, na Casa de Cultura Estação Palco, o curso "Teoria e prática da comédia de improviso". Formado na Casa das Artes de Laranjeiras (CAL), o improvisador propõe aulas embasadas em um curso de Fernando Caruso, na qual as técnicas do gênero voltam sua atenção aos jogos de improviso, bastante famosos no cenário atual.

De acordo com Bonfante, que trabalhou com grandes nomes do humor nacional – como o próprio Caruso e Chico Anysio – para fazer humor não é preciso, necessariamente, ter experiência teatral ou ser o engraçado da turma. "Isso ajuda, mas a teoria é a base da comédia". Se o improviso é a alma do negócio? "Totalmente. E a técnica dá a base para você fazer um improviso benfeito, ainda que este vá de cada um, do seu dia a dia, das coisas que você absorve da sociedade."

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Há dois anos, Bonfante encena, ao lado de Rafael Titonelly, o show "Engraçado é você", dedicando-se paralelamente a outros projetos, no Rio de Janeiro. Na cidade, o humorista também participa do "Quintal da comédia", onde divide a cena com atores locais. "Tenho uma ligação muito boa com o pessoal do TQ, do Putz!. Quase todo mundo do meio é amigo."

O humorista compartilhou com a Tribuna suas opiniões sobre as linhas seguidas pela comédia na atualidade e sobre os humoristas que vêm se destacando. "A tendência de transformar a sua realidade em comédia é a novidade, e isso tem muito tempo pela frente", avalia. "Acho que o stand-up não vai se esgotar. O que esgotou é essa onda de amadores que começaram a tentar fazer humor e viram que não é tão fácil quanto parece, que não basta contar qualquer fato da sua vida para o pessoal achar graça."

Tribuna – Dá para aprender a fazer comédia? Ou o comediante já precisa ser dotado de um dom natural?

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Marcelo Bonfante – Todo mundo consegue identificar na família aquele cara que é o mais engraçado, e isso ajuda muito. Mas existe também a parte técnica, assim como em toda profissão. Você às vezes faz uma piada com um amigo, mas não sabe muito bem que humor é aquele, o que provocou o riso. Por isso é preciso trabalhar a teoria, a predisposição ao desconhecido, a inversão de expectativa, o timing (tempo da comédia), o papel do escada. Cito, por exemplo, "Os caras de pau", com Leandro Hassum e Marcius Melhem, que é o clássico "O gordo e o magro". Nesse formato, sempre um faz o papel de escada para o outro poder ser mais engraçado.

 

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– Você trabalhou com importantes nomes da comédia do país. Quais te marcaram mais?

– Cito muito o Fernando Caruso, que é um cara fora de série. Existem outros improvisadores muito bons, como o Marcelo Adnet, que é muito prático, tem uma versatilidade grande, um timing muito bom. O Caruso já é mais teórico. Antigamente era muito famoso explorar o personagem, como fazia o Chico Anysio, como faz o Nerso da Capitinga. Hoje, a realidade é mais engraçada. O improviso não é novidade, acredito que o teatro tenha começado com o improviso. A novidade é a realidade no humor. Essa possibilidade traz novos humoristas para o meio artístico. Trabalhei com muita gente boa mesmo, o Gregório Duvivier, o Fábio Porchat. Muita gente boa que começou no teatro, na CAL, no Tablado, e foi crescendo, estudando. Se você não tiver uma bagagem não chega ao sucesso.

 

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– Que comediantes você destaca na atualidade?

– Um comediante que eu gosto muito, um dos melhores na atualidade, é o Fabio Porchat, um cara autêntico, que tem shows excelentes. Aqui em Juiz de Fora existem vários nomes que vêm se destacando no cenário nacional. Mas há que se ter cuidado, porque muita gente acha que já chegou lá no topo e que vai ser assim para sempre. Tem que ter o pé no chão e, às vezes, voltar um pouco atrás também. Rafinha Bastos está voltando forte com o show dele, o Danilo Gentili é sarcástico e muito bom. Claro que para alguns deles o foco hoje é outro, como o do Gentili, que já tem o próprio talk show. Mas o stand-up veio para ficar.

 

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– Sobre os formatos de comédia que atualmente circulam nos palcos e na TV do país, quais você acha que estão desgastados e quais conseguem atingir o público?

– Na comédia, como em tantos outros setores, existem momentos e momentos. Certamente os melhores vão continuar nas suas áreas, tanto no stand-up, quanto no improviso, quanto na área dos personagens. O pessoal cita com frequência o "Zorra total", "A praça é nossa", como programas muito clichês. O "Zorra" não é engraçado para mim, que sou jovem, mas é engraçado para a senhorinha que está em casa no sábado.

 

– Muitos comediantes que se destacaram no teatro, ou em canais de TV de menor audiência, foram extremamente criticados por ir para emissoras como a Globo ou a Band. Como vê tais críticas?

– O exemplo clássico é o Adnet, né? Acho que tudo na sua carreira é fase. Chega um momento em que as coisas se esgotam. Há uns dois anos estive conversando com o Adnet sobre isso. Na ocasião, ele me falou que nunca iria para a Globo. Só que depois não conversei mais com ele sobre isso, para saber porque ele foi para a emissora. A fase dele na MTV se esgotou. A MTV ficou muito tempo no ar em função dele e das outras pessoas que estavam com ele, Dani Calabresa (hoje no "CQC", da Band), Tatá Werneck, que também está na Globo. As emissoras têm as suas restrições. O próprio Nerso da Capitinga, de Pedro Bismarck, é excepcional. Quem conhece os trabalhos dele sabe que é impressionante a qualidade de texto e de personagem que ele tem. E, realmente, na Globo ele fica um pouco apagado. Não sei por qual motivo, mas existem essas "podas", o que acaba limitando.

 

– Vale tudo no humor? O que acha desses rótulo de "humor apelativo" ou "humor inteligente"?

– Acho que vale tudo sim. Hoje se fala muito em censura do humor, de limite do humor. "Os Trapalhões" era um programa altamente preconceituoso, se você for analisar. Falava-se de "macaco" o tempo inteiro. A "Escolinha do Professor Raimundo" tinha muito palavrão. O próprio Pedro Bismarck tem um show cheio de palavrões, mas que, dentro da comédia, são muito válidos. Quando a pessoa vai ao teatro, ela se propõe a escutar o que a pessoa vai passar para ela. Na comédia, tem uma verdade que às vezes é camuflada: existe público para todos os gostos.

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