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Aperte o play: Festival de Música Antiga exibe concertos diariamente no YouTube

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Pela primeira vez em sua história, o Festival Internacional de Música Colonial Brasileira e Música Antiga não contará com uma orquestra. Em sua 31ª edição, que começa neste sábado (21) e segue até o dia 30, o evento realizado pelo Centro Cultural Pró-Música/UFJF reunirá pequenas formações, a maioria delas com apenas cinco músicos, no concerto de encerramento. O formato das apresentações, diminuto, não representa uma perda para o longevo festival, garante o professor do departamento de música do Instituto de Artes e Design da UFJF Rodolfo Valverde. “Desde o princípio do festival, a ênfase está na música colonial brasileira e antiga. O que nós vimos é que com o passar dos anos a temática foi se ampliando e incluindo períodos mais recentes, sinfonias do período clássico e até do século XIX. Este ano, com a conjuntura, voltamos a enfatizar majoritariamente a música do período barroco”, explica.

Elise Dupon, João Rival, Beto Caserio e Alon Portal (em sentido horário) executam “Le Concert d’Apollon” desde a casa de Rival em Haia, na Holanda. (Fotos: Divulgação)

Segundo Valverde o retorno às raízes se liga à concisão cênica. O estudioso comenta cada concerto às 19h, no canal do YouTube do Centro Cultural Pró-Música, onde serão transmitidas as apresentações, sempre às 20h. “O que vamos ter agora é um repertório adequado às formações menores. Se olharmos para edições passadas do festival, basicamente nossos concertos são camerísticos. O repertório barroco, que é a tônica do evento, é voltado para grupos menores. É um gênero concebido para poucos instrumentistas”, explica ele. “A ideia de uma grande orquestra se dá a partir do século XVIII”, acrescenta. Em tempos pandêmicos, contrários às aglomerações, mesmo as gravações tiveram como imperativo as normas de prevenção contra a Covid-19, ressalta Marcus Medeiros, supervisor do Centro Cultural Pró-Música/UFJF e diretor do festival por mais uma edição.

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Realizado tradicionalmente no mês de julho, durante as férias escolares do meio do ano, o festival este ano encontrou como barreira para sua realização presencial um vírus ainda hoje incontrolável. A universidade, conta Medeiros, aguardou o desenrolar da crise e, ao perceber que a resolução não está tão próxima, optou por manter o evento em formato on-line, seguindo os passos de grandes e importantes festivais do gênero no mundo. A decisão permitiu, então, que a instituição contasse com concertos internacionais outrora muito caros para o enxuto orçamento do evento. Na edição deste ano, que também de maneira inédita não terá suas oficinas, a maioria dos músicos participantes é do exterior, oriundos de Portugal, Bélgica, Chile, Espanha, Holanda, Itália e Reino Unido. As apresentações foram gravadas, em sua maior parte, especialmente para o evento juiz-forano e serão transmitidas no horário marcado, mas permanecerão disponíveis na plataforma de vídeos.

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Programação

31º Festival Internacional de Música Colonial Brasileira e Música Antiga _ Edição Virtual

Concertos transmitidos pelo Canal do Centro Cultural Pró-Música no YouTube às 20h, precedidos por palestras diárias do professor de música da UFJF Rodolfo Valverde, às 19h.

Dia 21 – Le Concert d’Apolon (cravo, viola da gamba, oboé barroco e violino) “Les petits joyaux des Mrs François Couperin et Marais Marais”, com João Rival, Alon Portal, Beto Caserio e Elise Dupont (Holanda)
Dia 22 – Concerto de Fortepiano: “Um Fortepiano Vienense em Terra Papagalli”, com Edmundo Hora (Campinas/SP)
Dia 23 – Concerto de Cravo e Flauta Doce, com Cláudio Ribeiro e Inês d’Avena (Holanda)
Dia 24 – Recital de Órgão, com Giulio Mercati (ITA/CHE)
Dia 25 – Concerto de Canto e Cravo “Il Pianto della Madonna”, com Rosana Orsini (PRT/BR) e Marco Brescia (IT/PRT/BR)
Dia 26 – Concerto do Grupo GReCo com Duo de Flautas Doces, com Cesar Villavicencio e Paula Callegari (Uberlândia/MG) e participação especial de María Martínez Ayerza (Londres) e Guilherme dos Anjos (Belém – PA)
Dia 27 – Apresentação Didática de Danças Barrocas: Passos do Barroco, com Clara Couto, Maíra Alves, Osny Fonseca e Raquel Aranha (SP)
Dia 28 – Concerto de Teorba, Viola da Gamba e Oboé Barroco “Las Danzas Ocurrentes”, com Cristián Gutiérrez, Luciano Taulis e Antonia Sanchez (Chile)
Dia 29 – Concerto de Flauta Doce/Fagote e Teorba, com Isabel Favilla e Giulio Quirici (Bélgica)
Dia 30 – Recital de Órgão e Quarteto de Cordas, com Marco Brescia (ITA/PRT) & Cuarteto Alicerce (ESP)

Palco em Haia e plateia no mundo
No último dia de outubro, 31, os Países Baixos viveram seu pico em número de casos de contaminação por coronavírus, contabilizando naquele dia 10.719 novas infecções. Em Haia, a terceira maior cidade da nação, a população vive em estado de alerta, sob fortes restrições, numa igualmente assustadora segunda onda da pandemia. Carioca vivendo em Haia há mais de uma década, João Rival abre sua residência para o concerto de abertura do festival. A sala de sua casa será o palco do evento em seu primeiro dia. Rival (cravista), o também brasileiro Beto Caserio (oboé), o israelense Alon Portal (viola da gamba) e a holandesa Elise Dupont (violino) executarão o “Concert d’Apollon” com três peças do compositor Marin Marais: “Pièces en trio”, de 1692, “Pièces de viole du livre III”, de 1711, e outra “Pièces en trio”, de 1962. Também inclui o programa quatro peças de François Couperin: “Troisième Concert Royaux”, de 1722, “Pièces de Clavecin, Cinquième Ordre”, de 1713, outra “Troisième Concert Royaux”, de 1722, e “Les nations”, de 1726.

“Achamos bem interessante tocar um concerto dentro de casa. Uma experiência inédita. Ao mesmo tempo que a pandemia nos distancia, permite esse contato mais íntimo e direto com a plateia. Um concerto gravado em casa proporciona também uma experiência única para o público, que poderá, mesmo que à distância, participar da atmosfera de um ensaio, e dividir com os músicos a experiência do distanciamento”, pontua Rival, que teve todos os seus concertos cancelados, mas mantém-se em atividade lecionando e estudando, tudo no ambiente virtual. Na apresentação gravada em sua casa, Rival e seus colegas retratam o gosto musical francês durante o reinado de Luís XIV. “É neste período que a música francesa se diferencia das demais nações europeias”, observa, para logo acrescentar: “A elegância e a imponência da corte francesa é retratada na música, ao mesmo tempo em que a simplicidade campestre e bucólica vira moda entre a aristocracia francesa.”

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“Ao mesmo tempo que a pandemia nos distancia, permite esse contato mais íntimo e direto com a plateia”, diz o cravista João Rival. (Foto: Divulgação)

De acordo com o professor e crítico Rodolfo Valverde, os dois compositores são importantes expoentes do barroco francês. “Couperine tem uma ênfase no cravo, e o Marais, em corda, viola da gamba. Para o público em geral eles são menos conhecidos, mas para os conhecedores da música do século XVII, são muito famosos”, afirma, citando o filme “Todas as manhãs do mundo”, com Gérard Depardieu, que interpreta o protagonista Marais. Como os compositores, nomes exponenciais em seus instrumentos, o concerto traz intérpretes também exponenciais na atualidade, como o brasileiro Rival. No dia seguinte, no domingo (22), o festival dá um salto com o concerto “Um Fortepiano Vienense em Terra Papagalli”, com o músico de Campinas Edmundo Hora. Diferente da abertura, a segunda apresentação traz um instrumento do período clássico, o fortepiano, antecessor do piano contemporâneo e uma espécie de sucessor do cravo. “Ele vai executar num fortepiano que é uma cópia de um instrumento de 1790, como o que os compositores realizaram quando compuseram as peças”, ressalta Valverde, sobre o programa que reúne brasileiros como Nunes Garcia.

A história se volta para o presente
Uma das mais prestigiadas características do Festival Internacional de Música Colonial Brasileira e Música Antiga é a execução da música antiga segundo critérios historicamente informados, ou seja, com instrumentos ou réplicas de instrumentos utilizados quando as músicas foram compostas. “O que ouvimos é o mais próximo possível do que o da época em que foi elaborado”, pontua Rodolfo Valverde. O professor e crítico também organiza, ao lado da professora Mayra Pereira, o XIII Encontro de Musicologia Histórica, que acontece em paralelo ao festival, entre os dias 21 e 23 de novembro, também em formato virtual. Diferentemente dos anos anteriores, o evento bienal este ano volta-se para o presente, preocupado com o futuro. Enquanto a primeira mesa discute a área da musicologia na pandemia, a segunda debate o cravo no século passado, e a terceira e última, a cibercultura.

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Edmundo Hora, de Campinas, apresenta neste domingo (22), o concerto “Um Fortepiano Vienense em Terra Papagalli”. (Foto: Divulgação)

“Vamos ampliar nosso espectro de pesquisa para compreender como a área enfrenta o momento diante de um universo que se abre. Quando poderíamos imaginar que estaríamos reclusos e conectados com o mundo inteiro?”, indaga Valverde. Para Marcus Medeiros, diretor do festival e coordenador do encontro, a conexão amplia o alcance dos debates. “Possibilitamos a participação de pessoas do Brasil e do exterior não só nas mesas, mas também na audiência. Muitos poderão participar on-line”, comemora, apontando para a urgência e pertinência dos assuntos numa área tão afetada pela pandemia. “As realidades são muito diversas”, diz. “Temos músicos do Brasil, muitos deles professores universitários, que não tiveram um impacto econômico tão grande. Mas o que tem gerado um abalo muito grande é o distanciamento dos palcos e da plateia. O momento de troca é muito diferente quando há a troca de energia com o público presente.”

Durante a produção do festival, os organizadores tiveram contato também com as distintas etapas que o coronavírus impõem para diferentes áreas do globo. “Na Europa, os músicos também sofreram com os cancelamentos dos concertos, mas o sistema de auxílio desses países é mais efetivo que o nosso e houve um atendimento mais rápido. Agora eles começavam a retomar suas atividades, com um número controlado de pessoas, quando chegou a segunda onda”, lamenta Medeiros, certo de que a música ainda viverá, por algum tempo, a formatação possível para o festival juiz-forano. “Pequenos grupos conseguem contornar e manter as atividades. Já as grandes orquestras e coros são bem difíceis de se manter.”

Programação

XIII Encontro de Musicologia Histórica

Às 15h, em transmissões ao vivo pelo no Canal do Centro Cultural Pró-Música no YouTube

Dia 21 – Mesa redonda 1 – Musicologia no cenário da Pandemia, com os professores Diósnio Machado Neto (USP) e Javier Marín Lopez (Universidad de Jaen, Espanha), sob mediação do professor Paulo Castagna (UNESP)

Dia 22 – Mesa redonda 2 – O cravo no Rio de Janeiro do século XX, com os professores Marcelo Fagerlande (UFRJ), Mayra Pereira (UFJF) e Maria Aida Barroso (UFPE), sob mediação do professir Rodolfo Valverde (UFJF)

Dia 23 – Mesa redonda 3 – Musicologia e Cibercultura, com os professores Heloisa Valente (UNIP) e André Malhado (Universidade Nova de Lisboa), sob mediação da professora Paula Gomes Ribeiro (Universidade Nova de Lisboa)

De mãos dadas com o mundo
As diferentes fases da pandemia também estarão retratadas no festival, que apresentará três concertos gravados no consagrado Festival Internacional de Órgão de Vila Nova de Famalicão e Santo Tirso, ao Norte de Portugal. O evento aconteceu em setembro e seguiu as restrições impostas no momento no país, que à época vivia o relaxamento hoje já abandonado por ocasião da segunda onda. “Essa possibilidade de parceria é interessante porque o órgão é um instrumento impossível de transportar. Agora nosso público tem a oportunidade de conhecer a sonoridade dos órgãos portugueses. Esse é um ganho para a edição deste ano”, celebra Marcus Medeiros, ressaltando o espaço de uma das apresentações, uma igreja com mais de 800 anos. As demais gravações do festival juiz-forano, no entanto, são diferentes entre si. Algumas gravadas com os músicos reunidos, outras com cada um em seu espaço. A sincronização ficou por conta da UFJF. “Cada artista fez uma gravação de tipos diferentes. Alguns grupos enviaram a captação de imagem, separada da captação de áudio. Outros gravaram o concerto inteiro sem interrupção. Outros, música por música. Há diferentes tipos de formatação”, explica o diretor, pontuando que os próprios músicos acompanharam o trabalho de edição. Para Rodolfo Valverde, a experiência tem muito a ensinar e mostra que, mesmo quando o foco está no antigo, é possível falar em inovação: “Quem sabe as próximas edições não poderão ser presenciais e gravadas para ficar disponíveis para o mundo inteiro?”.

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