Além dos tradicionais concertos da noite, o 22º Festival Internacional de Música Colonial Brasileira e Música Antiga investe em atrações paralelas, como exposição e apresentações no Calçadão da Halfeld e em outras cidades. Porém, uma das novidades da edição não está escrita, literalmente, em nenhuma partitura. A partir de hoje, o auditório do Colégio dos Jesuítas será o ponto alto da programação da manhã, com palestras temáticas ministradas por importantes nomes ligados ao evento a partir das 10h.
Enquanto que, para alguns, a arte dispensa "legenda", para outros, uma manifestação artística pode ser melhor apreciada se entendido o seu discurso. O crítico musical e colunista do "Jornal do Brasil" Rodolfo Valverde, responsável pelos debates antes das apresentações principais, abre a bateria de bate-papo, hoje, com "A ópera: do nascimento aristocrático ao estilo veneziano". "A música, como qualquer manifestação artística, realmente, não precisa de explicação, mas nosso objetivo é situar o espectador quanto ao estilo e à circunstância de composição apresentados nos concertos", justifica. "Quando se tem o conhecimento histórico, fica mais fácil participar. Muitos podem até dizer que não gostam, mas, sem dúvidas, entender é ouvir com outros ouvidos", assinala.
Valverde destaca, entre outros pontos, o fato de sua estreia – ele ainda será o palestrante desta quinta e sexta – chamar a atenção da ópera, gênero musical que marcou o período barroco. "Como este é um festival de música antiga – tudo o que foi produzido até o século XVIII -, é preciso esclarecer como outros segmentos como as artes plásticas e cênicas e a literatura, por exemplo, foram sendo incorporados", adianta. "Depois de 150 anos de o barroco ter nascido entre a aristocracia italiana – e esse é um estilo essencialmente italiano -, percorreu a Europa até alcançar a França, onde passou a desenvolver características próprias, diferentemente da ópera que, em lugares como Áustria e Inglaterra, manteve o estilo italiano", detalha Valverde, dissecando ainda um trecho da história da chegada da ópera ao território francês. "Na época, o Rei Luis XIV era apaixonado por balé, daí os números operísticos (por lá) terem adquirido performances dançantes. O interessante é que o pai da ópera francesa é um italiano, Lully, um compositor e maestro (não havia distinção entre as duas categorias até o início do século XIX) que se mudou para a França ainda jovem", conta.
Para o diretor artístico do festival, Luís Otávio Santos, estas palestras expõem a música como um sujeito especulativo ou prático. "Na Idade Média, houve uma cisão entre a música prática e antiga, enquanto que no período barroco estas duas vertentes se uniram", diz. "O objetivo destes encontros é contribuir com essa fundamentação teórica, cujo tema é sempre ligado à aplicação prática do que será apresentado no concerto."
Na próxima segunda, Luís Otávio falará sobre "Retórica e música: o artesanato musical do barroco", ressaltando a ornamentação da flauta doce durante o século XVII como fonte de pesquisa. "Trata-se de retórica e música no período barroco, quando a música passou a ser uma arte falada, comunicação. Antes, porém, pertencia às ciências exatas, enquadrada num discurso especulativo", resume.
Outros sentidos
Em cartaz na Galeria Renato de Almeida, no Pró-Música, a exposição "A arte plástica sobreposta à música do período colonial" reúne 17 obras, entre desenhos, pinturas, fotografias, objetos e impressões digitais. Um dos organizadores da mostra, Paulo Alvarez assegura que os trabalhos foram escolhidos com base em sua contemporaneidade. "É tudo ligado à música. Contei com a parceria de Gustavo Machado (que, assim como Alvarez, também trabalha no setor de expografia do Museu de Arte Murilo Mendes) para juntar uma turma nova de artistas, alguns até inscritos no edital do ‘Carne fresca’ (projeto da Galeria Hiato com novos artistas plásticos), outros veteranos que já tinham trabalhos voltados para a relação entre as artes plásticas e a música, como Eduardo Borges e Sandra Satto.
Música nas Vertentes
Além dos teatros e das igrejas locais, as cidadezinhas de Tiradentes e Prados sediarão uma perna da programação de concertos do festival. "É uma política de envolver outros municípios. E partiu deles este ano. Durante muito tempo, nós estimulávamos esta participação, mas com o evento se tornando cada vez mais conhecido, o interesse passou a ser deles", esclarece o diretor geral Júlio César Santos. Amanhã, Tiradentes receberá o Spalla Quarteto Pró-Música no Centro Cultural Yves Alves às 20h. Na próxima terça, será a vez de a Igreja Nossa Senhora da Conceição, de Prados, abrigar a Camerata Pró-Música, também às 20h.
Hoje, porém, a mesma camerata tem um encontro marcado com o público em frente ao Cine-Theatro Central. Dando sequência às apresentações diárias no Calçadão da Halfeld a partir das 17h30 (no sábado será às 11h30), o grupo de 25 músicos, com idades entre 12 e 17 anos, é a aposta da organização para atrair a atenção de quem desconhece o festival. "Muda muito o modo de se apresentar numa igreja ou num teatro e na rua, onde o público não é específico, principalmente com relação ao microfone, que deve ser amplificado", dispara Guilherme Oliveira, maestro da trupe. "Escalei um repertório mais popular, sem deixar de lembrar algumas peças clássicas, porém conhecidas, como ‘O trenzinho do caipira’", informa o maestro, citando ainda outras mais eruditas, como danças húngaras de Johannes Brams e obras de Ernani Aguiar.
Júlio César Santos concorda, apoiado na ideia de esta ser uma das principais ferramentas de divulgação. "Além de não deixarmos de abraçar a produção local, quem transita e vê o show mais cedo, muitas vezes, se interessa pelos concertos."Acesse a programação completa em www.promusica.org.br