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Murillo Azevedo busca equipe para seu primeiro longa

Murillo
Ao lado de Luiz Fernando Carvalho, Murillo integrou a equipe de projetos como “Hoje é dia de Maria”, “Capitu”, “A pedra do reino”, “Lavoura arcaica”, “Meu pedacinho de chão” e “Velho Chico” (Foto: Arquivo pessoal)
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Murillo Azevedo chega de uma longa experiência na televisão, a partir de sua fotografia. Neste período, ao seu lado, teve a presença de Luiz Fernando Carvalho, o diretor que levava para as novelas e minisséries da TV Globo um olhar cinematográfico e uma narrativa que, de certa forma, rompia com o que se via na grade, como em “Hoje é dia de Maria”, “Capitu”, “A pedra do reino”, “Lavoura arcaica”, “Meu pedacinho de chão” e “Velho Chico” – para citar alguns.

Foi acompanhando Luiz Fernando por mais de 25 anos, que Murillo conheceu, de forma mais profunda, o cinema. Ele era guiado de maneira a trabalhar a câmera de forma cinematográfica, e o diretor apresentava ao núcleo que se formou em sua volta os fundamentos, sobretudo prático, do audiovisual que aprendeu em sua ávida e autodidata formação, principalmente sendo, sobretudo, um espectador e experimentando em suas direções.

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É esse o contexto do gaúcho Murillo: o lugar de sua formação. E é com essa bagagem que ele se aventura em seu primeiro filme, “Primeira lei: desmedidas proporções”. E, para isso, faz o que, de certa forma, fizeram com ele nessa trajetória: uma oficina com o intuito de encontrar uma equipe para a produção do longa-metragem de estreia. “Que quadro é esse” vai acontecer quinta (22) e sexta-feira (23), no Centro Cultural Humberto Mauro, em Cataguases, das 19h30 às 21h30. A cidade será uma das locações do filme, junto com Nova Friburgo, onde a oficina já foi realizada. As inscrições podem ser feitas no link.

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A proposta da oficina, de acordo com Murillo, é abordar exatamente o que se espera da equipe que vai trabalhar no filme. O primeiro dia é mais expositivo. Além de falar sobre a história e apresentar um vídeo com as referências, o diretor vai comentar sobre o cenário do mercado do audiovisual. Já o segundo dia, como aponta, é mais didático: a partir de cenas específicas, vai falar sobre fotografia, cenário, produção, estética, figurino – o todo, realmente, do filme, além de conhecer melhor os oficineiros, sua futura equipe. A partir disso, a ideia é captar cinco candidatos para cada uma das seguintes áreas: fotografia, assistente de direção, cenografia e arte, caracterização, figurino e elenco.

Murillo como diretor

É realmente difícil falar de Murillo sem falar de Luiz Fernando porque são anos a fio, realizando juntos, desenvolvendo conceitos estéticos que perpassam a obra do diretor e, consequentemente, do fotógrafo. E foi trabalhando juntos que a ideia de se aventurar como diretor surgiu no gaúcho. Eles estavam fazendo um trabalho na Paraíba, na fazenda de Ariano Suassuna. Murillo levou uma série de livros para ler no período, mas, em um momento, se viu sem opção. Pegou, então, “Notas do subsolo”, de Fiódor Dostoiévski. “Esse livro ficou na minha cabeça”, afirma.

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De volta ao Rio de Janeiro, onde mora desde os anos 1980, decidiu que era mesmo hora de se tornar um diretor. “Eu decidi abrir essa porta para mim. Porque estava transbordando e eu precisava passar isso de forma autoral”. A primeira versão do roteiro era, ainda, um trabalho muito em cima do texto de Dostoiévski. Mas, nesse meio tempo, mais um trabalho surgiu na TV Globo, e ele foi deixando a ideia de lado, até, então, sair da indústria, depois de “Velho Chico”, e chegar a pandemia.

“Eu resolvi que era o momento de voltar no roteiro e atualizá-lo. E eu tive tempo para isso. Trabalhei em cima da adaptação, reduzi os custos”. A ideia se definiu, realmente, depois do seminário em Nova Friburgo – e o filme já era mesmo realidade. E, então, usar de mão de obra do local onde o longa vai ser gravado e capacitar a equipe foi um caminho possível e que agrada – e muito – Murillo. “O desejo sempre foi trabalhar conjuntamente com a cultura e a educação. O ineditismo da coisa é esse: os oficineiros serão os profissionais que irão atuar na produção do longa”. Além disso, a ideia é usar as próprias cidades como personagens. “A lente fica muito à vontade para captar a vida lá fora.”

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“O desejo sempre foi trabalhar conjuntamente com a cultura e a educação”, afirma Murillo sobre oficina em Cataguases (Foto: Divulgação)

O filme

“Primeira lei” conta a história de Ivan, que nasceu em São Peterburgo mas que, depois do suicídio de sua mãe e uma passagem pelo orfanato, muda-se para o Brasil, para a casa de um tio alcoólatra, em Nova Friburgo. O protagonista, com o tempo, torna-se um brilhante historiados e professor de uma universidade, sendo admirado por toda a academia.

“Mas ele, em determinado momento, sofre do que é muito comum: a grande crise de alto questionamento agudo, e isso vai acontecendo silenciosamente e ele começa a questionar coisas que naturalmente emergem da própria memória afetiva. E isso leva a despertar nele um distúrbio de narcisismo perverso, em que todos ao redor têm que estar sob o seu comando”. Esse cenário faz com que Ivan enfrente uma rejeição das pessoas e acabe caindo em um ostracismo e um niilismo.

Murillo decide, então, incluir na trama um clichê. “O por acaso muda tudo. A Sofia aparece na vida dele e bate na porta emocional do sujeito. Ela passa a ter um papel predominante, porque ela bota o dedo dentro da consciência dele e mostra o que ele tem feito. É um filme que a gente subiu a régua da redenção, para não ser um filme pesado. Ele tem a libertação dele próprio. Essa pessoa que passa pela vida dele é a responsável pela mudança que ocorrerá com o Ivan”, resume.

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Caminho da identidade

Assumir a direção de um longa pela primeira vez é, claro, trazer tudo o que foi visto e vivido ao longo desses anos que, além de fotografia, tem música, tem arquitetura, tem rádio e tem reportagem – tudo um pouco mas, sempre, um olhar poético. E dirigir é encontrar uma identidade que ao mesmo tempo que vai de encontro à bagagem, se anuncia própria. E, claro, Luiz Fernando está presente nisso tido.

“A trajetória longeva junto ao Luiz me acumulou um manancial que seria impossível não imprimir como estilo, muito embora, eu tenha critérios próprios que procuro atualizar conforme a realidade que o audiovisual passa no momento. Certos modelos de linguagens e narrativas devem ser revistas. O tempo cênico é um fator; o método contemplativo, em que o poético era predominante, já não deve ocupar o mesmo espaço. Creio que nós todos tivemos que redimensionar esse método, no timing cênico. Por isso procuro me distanciar um pouco dessa influência relacionada ao Luiz, mas a matriz poética como visão cinematográfica deve predominar sem que haja uma uma associação mimética”, afirma Murillo.

Mas, principalmente, tem sido a experiência-primeira de estar em um outro lado e usufruir das belezas (e os percalços) do processo. “Realmente é uma experiência que exige maturidade e sabedoria: lidar com o macro da coisa. Não é nada fácil. Se pensar que só teria de me preocupar com o artístico; mas não, toda cadeia de produção depende de mim. Assusta mas é muito gratificante na medida em que avança nas etapas”, finaliza.

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