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Peça ‘Pormenor de ausência’, sobre últimos anos de vida de Guimarães Rosa, chega a JF

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Giuseppe Oristanio em cena. (Foto: Alberto Maurício)
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A peça “Pormenor de ausência” chega a Juiz de Fora nesta sexta-feira (20) para apresentação única, às 20h, no Teatro Solar. Com Giuseppe Oristanio no monólogo, direção de Ernesto Piccolo e texto resultado de uma pesquisa feita pela autora Lívia Baião, o espetáculo se volta para os últimos anos de vida do grande escritor mineiro Guimarães Rosa.

O autor de “Grande sertão veredas”, “Tutaméia” e “A hora e vez de Augusto Matraga” se manteve ativo até o fim, com desejos fortes para sua vida e se correspondendo com diversas pessoas – e, por isso, a peça escolhe esse momento para que o público entenda mais sobre essa importante figura. Mais que o lado do escritor que marcou a literatura brasileira ou o importante diplomata, a apresentação se volta para o que há de mais humano em sua trajetória, com seus medos e dilemas.

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O espetáculo já passou por diversas cidades brasileiras, com três temporadas no Rio de Janeiro e a presença de Fernanda Montenegro na primeira fileira de uma das apresentações. A edição faz parte do Festival Teatro em Movimento em Juiz de Fora, que tem curadoria e coordenação geral de Tatyana Rubim e o patrocínio de Cemig e CSN, por meio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais. Os ingressos na cidade estão sendo vendidos por R$20 a meia entrada e R$40 a inteira.

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Essa é a primeira produção que Giuseppe Oristanio faz em monólogo, o que dá vazão a uma vontade que já tinha antes. Foi em uma conversa com o diretor e amigo, Ernesto Piccolo, que teve contato com o texto que se transformaria na peça pela primeira vez, um potencial que ele logo captou porque percebeu que existia algo ali de bem diferente. “O espetáculo me agrada muito porque estamos falando de um grande personagem brasileiro e sob a ótica da vida dele. (…) Embora a gente cite as obras, a gente fala, principalmente, do homem que ele foi, uma pessoa grandiosa, poliglota, diplomata, embaixador da Academia Brasileira de Letras (ABL), mas que também era um homem como qualquer outro, com suas manias, suas coisinhas e seus medos, inclusive”, conta.

O texto foi um resultado da pesquisa feita por Livia Baião, e usou em sua maior parte palavras do próprio autor, que foram preservadas em cartas e manuscritos, para deixar que o público entrasse em contato com mais essa sua face.

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O interesse do ator pelo escritor já era antigo, mas o texto também o impressionou por ser algo bem diferente do que as pessoas já estavam acostumadas a ver em relação a Guimarães Rosa. “Acho que todo mundo que gosta de literatura tem esse interesse por Guimarães Rosa. Ele só não é um dos maiores autores mundiais porque escreveu em português, e um português com palavras que ele inventou. Mas se tivesse escrito na língua inglesa assim, seria um dos maiores autores do mundo”, diz Giuseppe. Para ele, é também essa genialidade que faz com que o espetáculo seja difícil de produzir. “Tive o desafio prático de conseguir dizer esse texto. (…) Ele é curioso na maneira de escrever, não é nada usual. E portanto também é difícil de falar: eu tive que treinar muito pra conseguir compreender bem, porque só compreendendo bem o público compreenderia também”, conta.

Trabalho incessante e roseano

Para que a peça conseguisse tocar o público da mesma forma, Giuseppe destaca que foi um trabalho incessante e em conjunto com a equipe. “Não tenho dúvida de que a peça revela faces do Guimarães Rosa que as pessoas não conheciam. Até mesmo quem gosta da obra dele porque, às vezes, não conhece sobre a vida dele, e foi isso que me interessou”, destaca.

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Na sua primeira vez sozinho nos palcos, ele imaginou que poderia até se sentir sozinho – mas não foi o que aconteceu. “Quando estamos sozinhos, as falhas são bem mais difíceis de serem contornadas. É preciso que a gente entre em um processo de concentração, que não tem milagre nenhum envolvido. (…) Mas o retorno do público foi muito significativo. Eles me mostram um interesse incrível, riem e se emocionam com a história dele. Essa peça me traz muitas recompensas enquanto ator”, conta.

Esse nível de dedicação ao trabalho e o objetivo de fazer com que chegue ao melhor resultado possível, para ele, está também na vontade de fazer com que mais pessoas possam conhecer a trajetória do escritor. Essas faces vão até camadas mais profundas. “O Guimarães Rosa mostra uma humanidade incrível nesse espetáculo, e que não aparece só nas virtudes. Ele tinha manias um tanto egocêntricas, tinha muita certeza da sua qualidade, embora também admirasse a qualidade de muita gente. Quando falamos de sentimentos humanos, a gente sempre se conecta e se envolve com isso”, acrescenta Giuseppe.

Para quem já ama ou quem ainda vai amar

Um dos aspectos que a peça explora é a vontade de Guimarães Rosa entrar na Academia Brasileira de Letras e, em seguida, o medo de assumir e morrer em seguida. Considerando quem conhece sua obra e até o conheceu em vida, foi possível apresentá-lo de forma fidedigna em relação ao que o autor de fato foi. “Os próprios netos dele, que foram pequenininhos até na posse dele na ABL na época, assistiram à peça e ficaram espantados, pois acharam que o avô é aquilo mesmo que a gente mostra lá”, relembra.

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Apesar da peça se aprofundar bastante na história do autor e contar com uma pesquisa tão extensa, Giuseppe destaca que a ideia é de que ela seja acessível para todos. “Nem precisa conhecer Guimarães Rosa para gostar da história, na verdade. Porque estamos contando a história de um homem. Não é imprescindível conhecer a obra dele para entender”, diz.

E isso porque, em sua perspectiva, se trata de uma história que é, na verdade, atemporal. “Desde que o mundo é mundo, a gente busca conexão com os nossos sentimentos. São eles que nos movem, no final das contas. A gente faz tudo para extravasar. Essa peça foi escrita agora, falando de um homem que morreu na década de 60, mas que vai continuar sendo atual daqui a 100 anos”, diz. O que ele quis, assim como a equipe envolvida, era justamente ampliar esse efeito e fazer com que mais pessoas fossem tocadas, dessa vez em um outro formato. “Foi uma conjunção muito legal de fatores que fizeram com que o espetáculo resultasse em uma coisa tão simples, mas tão intensa para aquele que assiste e aquele que faz. A gente entra em um processo de comunhão que só o teatro proporciona”, conta.

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