Era tarde de uma quinta-feira, em 5 de novembro de 2015. E de fato, já era tarde. Uma barragem de rejeitos se rompe e uma onda de lama mortal arrasta vidas, sonhos, amores por onde passa, deixando manchas que perdurariam para sempre. O Brasil estava diante de seu maior desastre ambiental.
Passados quase oito anos do crime ocorrido em Mariana (MG), a Galeria de Arte do Forum da Cultura da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) recebe a mostra “Há lama, há caos”, um conjunto de fotografias da cientista social e fotógrafa Jessica Mazzini Mendes, que registra parte da devastação causada pelo rompimento da barragem de Fundão.
Ao todo são 12 fotografias inéditas que mostram cenários marcados pela destruição e, ao mesmo tempo, também leva o público a imaginar em quais possíveis contextos tais registros estariam inseridos, destaca a organização da mostra: Qual a última refeição preparada naquele fogão? Que espaço aquele cômodo abrigava? Quem dormiu e sonhou naquele colchão? Quando ecoaram as finais conversas de portão e as risadas das crianças naquelas ruas? Nunca saberemos ao certo. Onde antes, tudo era vida, sobrou o barro letárgico, destacam.
Diante do trágico contexto, o título da mostra, inspirado no álbum Da lama ao caos (1994), de Chico Science e Nação Zumbi, conforme texto de divulgação divulgado pelo espaço, busca evocar não a passagem de um estado a outro, mas a permanência: com o rompimento da barragem de Fundão, a lama dos rejeitos de minério de ferro destruiu e encobriu a paisagem com tons ferruginosos, coloração característica dos resíduos, e perdura no tempo, assim como o caos, que se instalou na vida daqueles que foram brutalmente atingidos.
A exposição tem origem no trabalho de campo realizado por Jéssica Mazzini ao longo de seu mestrado em Ciências Sociais, entre os anos de 2017 e 2019. Ela percorreu os distritos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, em Mariana e o distrito de Gesteira, em Barra Longa, fotografando os lugares por onde passava como uma forma de registro para auxiliá-la em sua investigação sociológica. “Eu buscava compreender o processo de reassentamento de Bento Rodrigues, primeira comunidade impactada com o rompimento da barragem, e o que norteou a minha pesquisa foi a observação de um desejo que estava sempre presente nas falas dos moradores quando eles falavam sobre essa questão. Eles sempre comentavam que gostariam de fazer o reassentamento, construir tudo novamente, da ‘forma que era antes”, relatou.
Ainda de acordo com a pesquisadora, “o momento de campo foi algo muito difícil, porque era ver aquele crime ambiental, aquele evento crítico, acontecendo para além de 2015. Era acompanhar de perto o desastre no cotidiano das pessoas, um desastre continuado, que todo dia estava sendo reavivado em função da impunidade e do descaso com que tudo era tratado”.
“Há lama, há caos” carrega em seu cerne, aspectos artísticos e documentais que levam ao público a possibilidade de reflexões importantes sobre o ocorrido em Mariana. A exposição segue em cartaz até o dia 28 de julho, com visitações de segunda a sexta-feira, das 10h às 19h.