a manhã
por Renata de Aragão Lopes
quando, depois de tantas noites,
o sol me convidar à rua,
talvez, por hábito, eu ainda me cubra,
talvez, por ímpeto, eu saia nua,
mas o mais provável
é que eu chore
por largar minha casa,
que me cuidou sob asas,
por voltar ao passeio
: meu chão.
andarei pela cidade
não como quem passa.
serei estrangeira
com motivos para ficar.
irei a igrejas, museus e feiras.
visitarei minha praça preferida
como se fosse outro lugar.
e verei amarelo o ipê
antes das flores
: a cor dentro do olhar.
e, ao me aproximar de você,
sei que o sol estará sob nuvens,
para que fiquemos a sós.
conhecerei você finalmente,
mesmo que já conheça
sua história, rosto e voz.
e amarei você novamente,
toda vez pela primeira vez.
tudo antes terá sido sonho
: deixarei o sono de mais de um mês.
2 de abril de 2020